Módulo 3 | Módulo 3 | Manejo clínico: atenção especializada

COVID-19
Manejo da infecção causada pelo novo coronavírus

Aula 3

Investigação de imagem, laboratorial e diagnóstico diferencial da COVID-19

Esta é a Aula 3 do Módulo 3 do curso COVID-19 Fiocruz.

Nesta aula, vamos compartilhar o conhecimento científico atual na investigação de pacientes internados com suspeita ou diagnóstico confirmado de COVID-19.

Ao final, você será capaz de:

  • Rever os exames laboratoriais para a definição etiológica;
  • Conhecer os exames de admissão e monitoramento da evolução clínica de um paciente internado com a COVID-19;
  • Reconhecer os principais quadros clínicos que fazem parte do diagnóstico diferencial da COVID-19.

Os materiais básicos de referência são:

Exames de admissão

Os exames apontados no quadro são de admissão e devem ser igualmente utilizados para avaliar a evolução clínica dos pacientes.

EXAMES DE ADMISSÃO

Ressalte-se a importância da realização da oximetria de pulso ou, quando possível, da gasometria arterial (mais precisa, porém mais dolorosa) para a avaliação e o acompanhamento dos níveis de oxigenação do paciente, bem como para orientar as decisões relativas ao tipo de oxigenoterapia e à ventilação mecânica. Essa questão é abordada, em detalhe, na Aula 5.

A periodicidade das coletas dos exames citados poderá variar de acordo com as condições clínicas dos pacientes.

Abordagem laboratorial inicial

As anormalidades laboratoriais mais comuns em pacientes com doença grave são:

  • Leucopenia
  • Linfopenia
  • Leucocitose
  • Transaminases hepáticas elevadas

Outras anormalidades incluem: neutrofilia, trombocitopenia, elevação de creatinina sérica e elevação de lactato desidrogenase sérica e marcadores inflamatórios.

EXAMES DE ADMISSÃO
  • Gasometria arterial
  • Hemograma completo
  • Coagulograma (TAP e TTPa)
  • Fibrinogênio
  • Glicemia
  • Ureia e creatinina - avaliação da função renal)
  • Transaminases: ALT e AST - avaliação da função hepática
  • Bilirrubina total e frações - avaliação da função hepática
  • Troponina sérica - marcador de lesão cardíaca
  • Marcadores inflamatórios:
  • procalcitonina sérica e/ou
  • proteína C-reativa
  • D-dímero
  • Lactato desidrogenase sérica

A Dra. Denise Machado Medeiros, médica intensivista do Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas (INI/Fiocruz), fala sobre os exames e os marcadores laboratoriais.

Exames laboratoriais de definição etiológica da COVID-19

A decisão de fazer os exames de testes de biologia molecular para SARS-CoV 2 e Influenza deve ser baseada em fatores clínicos e epidemiológicos. A coleta e testes de amostras adequadas de pacientes que atendem à definição de casos suspeitos de COVID-19 é importante para a confirmação diagnóstica, o tratamento clínico e controle do surto.

Conforme indicação da Rede CoVida - Testes diagnósticos da COVID-19:

  • O RT-PCR deve ser solicitado preferencialmente entre 3 e 7 dias após contato com caso suspeito, podendo ser realizado no momento do início dos sintomas.
  • Para o RT-PCR, deve ser colhido o material de oro-faringe ou escarro (não usar sangue nem urina);
  • O teste para detecção de anticorpos (teste rápido ou ELISA) só deve ser solicitado após 7 dias do início dos sintomas.
  • Estão disponíveis dois tipos de testes rápidos, de antígeno e de anticorpo, por meio da metodologia de imunocromatografia. O teste rápido de antígeno detecta proteína do vírus em amostras coletadas de naso/orofaringe, e deve ser realizado na fase de infecção ativa (fase aguda) e o teste rápido de anticorpos que detecta IgM e IgG (fase convalescente) em amostras de sangue total, soro ou plasma. Confira no vídeo o Guia de coleta e utilização do teste rápido Covid Ag produzido pelo Instituto de Biologia Molecular do Paraná.

Confira no vídeo o Guia de coleta e utilização do teste rápido Covid Ag produzido pelo Instituto de Biologia Molecular do Paraná: https://www.ibmp.org.br/pt-br/teste-rapido-covid-ag/

A coleta de amostra respiratória para esses exames deve ser feita por “swab” nasal (narinas direita e esquerda) e “swab” de orofaringe.

SWAB NASAL SWAB DE OROFARINGE
Técnica para “swab” de nasofaringe


Material necessário:

  • “Swab” com haste flexível (alumínio).

Técnica:

  1. Aplique as precauções padrão para contato e gotícula ou aerossol;
  2. Insira o “swab” em uma narina até a nasofaringe;
  3. Deixe o “swab” no local por alguns segundos;
  4. Em seguida, remova lentamente o “swab” enquanto o gira sobre a superfície da nasofaringe posterior;
  5. Retire o “swab” do local de coleta; insira-o no tubo de transporte ou em um recipiente com meio para transporte viral;
  6. Repita o procedimento com outro “swab” para a segunda narina a fim de fornecer uma amostra combinada ideal;
  7. Etiquete o recipiente da amostra;
  8. Após a coleta, transporte imediatamente a amostra para o laboratório para a realização do RT-PCR e detecção de antígeno viral. Se houver demora no transporte do material, coloque a amostra em gelo ou em refrigeração.

Em caso de “swab” nasofaríngeo em lactentes ou crianças jovens:

  • Use um “swab” de tamanho apropriado: meça a distância do nariz ao ouvido (filtrum ao tragus);
  • Insira o “swab” até a metade dessa distância, parando se encontrar resistência;
  • Insira o “swab” horizontalmente, abaixo da concha inferior, e não diago
Técnica para “swab” da faringe posterior ou “swab” da garganta

Material necessário:

  • Swab” com haste rígida (plástico);
  • Abaixador de língua.

Técnica:

  1. Aplique as precauções padrão para contato e gotícula ou aerossol;
  2. Peça a pessoa que abra a boca e diga "ah" para elevar a úvula;
  3. Pressione a língua com o abaixador de língua para afastá-la do caminho;
  4. Aplique o “swab” na faringe posterior evitando tocar nas tonsilas e não toque na língua com o “swab”;
  5. Inseri-o no tubo de transporte ou em um recipiente com meio para transporte viral. Quebre a ponta do aplicador para garantir o fechamento do frasco;
  6. Etiquete o recipiente da amostra;
  7. Após a coleta, transporte imediatamente a amostra para o laboratório para a realização do RT-PCR e detecção de antígeno viral. Se houver demora no transporte do material, coloque a amostra em gelo ou em refrigeração.

Fonte: Cuidados Clínicos de Infecções Respiratórias Agudas Graves Tool kit (Clinical care of severe acute respiratory infections – Tool kit - OMS)

É fundamental o uso de Equipamentos de Proteção Individual (EPI) adequados para as coletas (luvas, jalecos descartáveis, máscaras cirúrgicas ou respiradores com a N-95, óculos de proteção e protetores faciais). Para saber mais sobre procedimentos de proteção, veja a Aula 7 - Procedimentos de proteção e controle de infecção em ambiente hospitalar.

O teste molecular é realizado com maior frequência para detecção da presença do RNA do vírus SARS-Cov-2 é o RT-PCR. Vale ressaltar que esse teste, em geral, é positivo nos primeiros dias da infecção (até o 7o dia do início dos sintomas), sendo importante para identificação de casos na sua fase inicial e, eventualmente, para identificar os pacientes que permanecem capazes de transmitir o SARS-CoV-2 por tempo mais prolongado. O teste molecular pode dar negativo se realizado em uma fase posterior da doença, ou pode ser um “falso negativo”, não descartando totalmente a possibilidade de COVID-19.

Já o teste sorológico - sejam os testes rápidos imunocromatográficos ou os testes tradicionais de ELISA - visam identificar a presença de anticorpos contra o vírus, em geral detectáveis a partir do 8o dia e, principalmente, após o 14o dia . Também existe a possibilidade de resultado “falso negativo”, bem como não há garantia de que o resultado positivo assegure a imunidade contra a doença. Portanto, os testes sorológicos em geral não são úteis para o manejo clínico imediato, mas podem ser importantes em estudos epidemiológicos e em decisões relativas ao retorno de profissionais às atividades, entre outras possibilidades.

Os testes rápidos de antígeno da COVID-19 (Swab Nasofaríngeo) possuem a metodologia imunocromatográfica rápida para detecção qualitativa dos antígenos do SARS-COV-2, nas amostras coletadas com Swab nasofaríngeo de pacientes sintomáticos respiratórios com suspeita de infecção por SARS-COV-2 e são avaliados em conjunto com a apresentação clínica e os resultados de outros exames laboratoriais. Um antígeno geralmente é detectável nas amostras do trato respiratório superior durante a fase aguda da infecção. O teste rápido de detecção de antígeno tem maior probabilidade de ter um bom desempenho em pacientes com altas cargas virais, que geralmente aparecem na fase pré-sintomática e sintomática da doença (nos primeiros 05 a 07 dias da doença). Dessa forma, o teste rápido de detecção de antígeno oferece uma excelente oportunidade de diagnóstico precoce e a interrupção da transmissão por meio de isolamento direcionado dos casos infecciosos e seus contatos próximos. Pacientes que apresentam mais de 5 a 7 dias após o início dos sintomas são mais propensos a ter cargas virais mais baixas e a probabilidade de resultados falso-negativos é maior com os testes rápido de antígeno, por essa razão não são indicados para esses casos.

Vale destacar que o teste para diagnóstico diferencial ou identificação de infecção concomitante por influenza deve ser realizado precocemente, visto que existe terapia medicamentosa específica para essa doença (Oseltamivir) que deve ser iniciada, caso o resultado seja positivo ou caso haja suspeita de influenza e sinais de gravidade clínica. Para saber mais sobre Suporte Farmacológico, consulte a Aula 4.

Ressalte-se ainda que outros exames podem ser necessários para diagnóstico diferencial, caso haja suspeita de outras doenças de etiologia viral ou bacteriana.

Para mais informações sobre testagem para SARS-Cov-2, consulte:

Abordagem por exames de imagem

Radiografia de tórax

No Raio X de tórax, a doença evolui com infiltrados pulmonares unilaterais em 25% dos pacientes e com infiltrados pulmonares bilaterais em 75% dos pacientes.

Raio X do pulmão

Raio-X de tórax AP de paciente com COVID-19 em ventilação mecânica. Presença de opacificações bilaterais difusas em paciente com maior comprometimento pulmonar.

Fonte: Curso COVID-19: Manejo do paciente com distúrbios respiratórios - Unidade 1

Tomografia computadorizada de tórax

A tomografia computadorizada de tórax apresenta achados anormais, relatados em até 97% dos pacientes. Até o momento, os casos publicados apresentaram predomínio de alterações alveolares, como opacidades em vidro fosco, consolidações focais e opacidades mistas (incluindo opacidades com halo invertido), geralmente com acometimento bilateral e multifocal, distribuição periférica e predomínio nos campos pulmonares médios, inferiores e posteriores. Pequenas opacidades nodulares em vidro fosco são o achado mais comum em crianças.

Porém, vale assinalar que existem padrões variados de acometimento pulmonar, que podem gerar outros tipos de alterações na TC de tórax.

A velocidade e letalidade do coronavírus resultaram em mudanças rápidas e contínuas nas práticas para o tratamento da COVID-19. O aprendizado e as vacinas impactaram positivamente o combate a COVID-19. Diante disso, a iniciativa internacional Choosing Wisely reuniu abordagens práticas, baseadas em evidências científicas, orientadas para pacientes e profissionais de saúde que são de fácil execução. O uso racional de recursos está entre essas recomendações, Assim, não é indicado realizar exame de tomografia computadorizada de tórax rotineiramente como forma de orientar o tratamento, visto que não há dados que fundamentam esse uso.

Tomografia

Imagens de TCAR de tórax (cortes axiais) demonstrando opacidades em vidro fosco multifocais e bilaterais, com predomínio periférico e posterior, que são achados pulmonares típicos da infecção por COVID-19 (confirmada laboratorialmente por RT-PCR).

Fonte: Araújo-Filho et al.(2020)

A Dra. Claudia Costa, pneumologista, professora coordenadora da disciplina de pneumologia da Uerj e responsável pela instalação da área de pré-atendimento hospitalar na mesma Universidade, fala sobre o padrão tomográfico clássico da COVID-19.

A Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia promoveu uma série de debates sobre atendimento e procedimentos médicos no contexto da COVID-19. Você pode assistir ao debate completo aqui.

US como alternativa de imagem para diagnóstico de COVID-19

A Dra. Claudia Costa, pneumologista, professora coordenadora da disciplina de pneumologia da Uerj e responsável pela instalação da área de pré-atendimento hospitalar na mesma Universidade, explica como o ultrassom tem sido usado para o diagnóstico da doença.

Reconhecer os principais quadros clínicos que fazem parte do diagnóstico diferencial da COVID-19

É muito importante que alguns diagnósticos diferenciais sejam levados em conta durante o manejo inicial dos pacientes com suspeita da COVID-19.

Agentes virais
Vírus mais comuns
Vírus respiratório sincicial, parainfluenza, rinovírus, adenovírus, enterovírus (EVD68), metapneumovírus humano, bocavírus e influenza
Vírus menos comuns, exceto em situações de risco ou aumento de risco por conta de uma epidemia
Varicela-zoster, sarampo, coronavírus humanos, incluindo COVID-19, MERS e SARS e hantavírus
Em casos de imunossupressão (ex. HIV)
Citomegalovírus e herpes simples, além dos indicados acima
Agentes bacterianos
Bactérias mais comuns
Streptococcus pneumoniae, Hemophilus influenzae, Moraxella catarrhalis, Legionella pneumophila, non-pneumophila Legionella, Chlamydia pneumonia, Mycoplasma pneumoniae, Klebsiella pneumonia, Staphylococcus aureus.
Bactérias menos comuns, exceto em situações de risco ou em países com alta prevalência
Mycobacterium tuberculosis, Burkholderia pseudomallei, Rickettsial infections, Coxiella burnetti (Q fever), Leptospira spp, Chlamydia psittaci, Bortedella pertussis, Salmonella sp.
Agentes resistentes

Fatores de risco para agentes multirresistentes

Terapia antimicrobiana intravenosa a menos que 90 dias

Os agentes resistentes incluem

  • S. aureus resistente a meticilina (MRSA)
  • Agentes não fermentadores como a Pseudomonas aeruginosa e o Acinetobacter baumannii
  • Agentes produtores de beta-lactamase de espectro expandido (ESBL) como a E. coli, a Klebsiella e o Enterobacter
Outras infecções endêmicas
Malária, dengue, chikungunya, tuberculosis e HIV

Fonte: World Health Organization

Entretanto, em períodos epidêmicos como o atual, a infecção pelo SARS-CoV2 precisa sempre ser aventada em casos suspeitos, devendo ser confirmada por testes laboratoriais específicos.

O Brasil, de uma forma geral, possui várias doenças endêmicas que têm numerosos sinais e sintomas, que também estão relacionados à doença causada pela SARS-Cov2. O diagnóstico pode diferenciar de acordo, por exemplo, com as faixas etárias e as áreas geográficas. Assim, em crianças as etiologias virais comuns em meses mais frios são o vírus sincicial respiratório (em menores de 2 anos) e os vírus influenza (gripe), parainfluenza, rinovírus e adenovírus (resfriados comuns).

O quadro a seguir compara algumas doenças respiratórias frequentes, destacando seus sintomas e sinais mais comuns.

Fonte: Universidade Aberta do SUS (UNA-SUS).

Em um momento em que ainda há casos de sarampo sendo detectados no Brasil, é importante que essa doença viral entre no diagnóstico diferencial da COVID-19, mesmo entre adolescentes e adultos jovens.

Dengue, Zika e Chikungunya são patologias virais que também devem ser descartadas uma vez que podem cursar com sinais e sintomas iniciais semelhantes àqueles descritos para a COVID-19. Nesses casos, é muito importante o conhecimento sobre a distribuição de casos nas áreas geográficas, dados fornecidos pelos sistemas de vigilância em saúde dos municípios.

Doenças bacterianas respiratórias podem apresentar sintomatologias iniciais semelhantes, e o principal agente causador comunitário é o Streptococcus pneumoniae, sendo o Hemophilus influenzae e a Moraxella catarrhalis agentes secundários. É importante lembrar que as infecções pulmonares bacterianas podem aparecer também como complicações pulmonares secundárias à COVID-19.

Questão geográfica

Em áreas da região Amazônica, a malária deve ser sempre aventada como diagnóstico diferencial, principalmente em épocas de maior disseminação da doença - entre junho e setembro -, períodos de seca. Outro fator importante com relação à região é a diferença no que se refere à variação sazonal do vírus influenza. Segundo o Ministério da Saúde, sua circulação na região segue o período sazonal da doença, potencializado pelas chuvas e enchentes e consequente aglomeração de pessoas. Portanto, é nesse período que se observa uma maior circulação do vírus.

Chegamos ao fim da aula

Você terminou a Aula 3 do Módulo 3 do curso COVID-19 - Manejo da infecção causada pelo novo coronavírus.

Nesta aula, você revisou os exames laboratoriais para a definição etiológica, conheceu os exames de admissão e monitoramento da evolução clínica de um paciente internado com a COVID-19 e aprendeu a reconhecer os principais quadros clínicos que fazem parte do diagnóstico diferencial da doença.

Na próxima aula, vamos falar sobre suporte farmacológico a pacientes com covd-19.

Siga em frente!

Atividade