Princípios e diretrizes do SUS

O Sistema Único de Saúde (SUS) conforma o modelo público de ações e serviços de saúde no Brasil. Orientado por um conjunto de princípios e diretrizes válidos para todo o território nacional, nasce de experiências prévias de reformas e de um intenso debate envolvendo a participação de entidades da sociedade civil organizada. O marco desse processo foi a 8ª Conferência Nacional de Saúde, realizada em 1986, em torno dos temas da saúde como direito de cidadania, da reformulação do sistema nacional de saúde e do financiamento do setor, que alimentaram um intenso debate que culminaram na aprovação da Constituição de 1988.

8ª Conferência Nacional de Saúde

A origem das conferências de Saúde precede a publicação da Lei Orgânica da Saúde em 1990. Instituídas pela lei n. 378, de 13 de janeiro de 1937, elas tinham como principal objetivo propiciar a articulação do governo federal com os governos estaduais, dotando-o de informações para formulação de políticas, para a concessão de auxílios e subvenções financeiras.

Desde que foram instituídas, as conferências sofreram profundas mudanças, mas todas, com maior ou menor intensidade, interferiram nas políticas de saúde (Escorel & Bloch, 2005). Assim, a 8ª Conferência Nacional de Saúde é considerada um marco de transformação desses fóruns, sendo fundamental para o processo da reforma do sistema de saúde brasileiro desembocado na Constituição de 1988.

Convocada pelo presidente José Sarney, a 8ª Conferência reuniu mais de quatro mil pessoas e contou, pela primeira vez, com ampla participação das organizações da sociedade civil de todo o país como delegados eleitos, incluindo as representações sindicais, das associações de profissionais de saúde, de movimentos populares em saúde, do Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (Cebes), da Associação Brasileira de Pós-Graduação em Saúde Coletiva (Abrasco).

Os principais temas tratados desdobraram-se nas seguintes diretivas centrais, cujos requisitos continuam válidos ainda hoje:

  • 1) a busca da equidade;
  • 2) a garantia de acesso universal às ações e aos serviços de saúde;
  • 3) o aumento do financiamento público do setor saúde;
  • 4) a unificação e a integração das ações, do ponto de vista de seu conteúdo - preventivas, curativas e de reabilitação - e do ponto de vista de sua gestão, integração entre os entes federados (federal, estadual e municipal) e unicidade das estruturas gestoras em cada esfera de governo; e
  • 5) a atribuição de maiores poderes à população para participar ativamente na formulação, na implementação e no controle das ações de saúde.

Para saber mais sobre participação social na política de saúde, veja a aula Democracia, representação e participação nas Políticas Públicas - o caso SUS, no Módulo 2 desse curso.

• Um direito constitucional

Mesmo com divergências em relação ao conteúdo de algumas das propostas (Baptista, 2014), durante o processo constituinte foi possível instituir uma coalizão parlamentar capaz de introduzir no Título VIII - Da Ordem Social, um Capítulo (II) específico sobre a seguridade social (Brasil, Constituição Federal de 1988). O conteúdo ideológico desse capítulo demonstra a preocupação com o bem-estar, a igualdade e a justiça na sociedade, realizados pelo exercício dos direitos sociais.

A Constituição Federal conceitua e estabelece os princípios da Seguridade Social. Compete ao Poder Público organizá-la em uma lógica universalista e equitativa, financiada por fontes diversificadas de receitas de impostos e contribuições sociais, dos orçamentos da União, estados e municípios.

Fonte: Constituição Federal do Brasil (1988) - Título VIII, Capítulo II, Seção I

Nesse contexto, de tentativa de articulação e integração das políticas sociais, foram estabelecidos os fundamentos que, pela primeira vez em nossa história, orientaram a inscrição da saúde como direito de todos os cidadãos brasileiros e dever do Estado. Cabe destacar a concepção ampla da saúde adotada na Constituição de 1988, garantida mediante “políticas sociais e econômicas abrangentes que reduzam o risco de doenças e outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação” (Brasil, Constituição Federal de 1988).

Áudio
Íntegra do discurso do presidente da Assembleia Nacional Constituinte (1988):

No dia 5 de outubro de 1988, o presidente da Assembleia Nacional Constituinte, o deputado Ulysses Guimarães, promulgou a atual Constituição Brasileira, conhecida como a 'Constituição Cidadã'. Ouça a íntegra do discurso histórico.

Para dar materialidade à política de saúde, a Constituição institui o SUS. Sua definição foi dada pela Lei Orgânica da Saúde - Lei 8.080/1990:

Fonte: Ministério da Saúde - Lei 8.080/1990

Estão incluídas nesta definição:

  • atividades dirigidas às pessoas, individual ou coletivamente, voltadas para a promoção da saúde e prevenção, diagnóstico, tratamento e reabilitação de agravos e doenças;

  • serviços prestados no âmbito ambulatorial, hospitalar e nas unidades de apoio diagnóstico e terapêutico geridos pelos governos (quer seja pelo governo federal, estaduais ou municipais), bem como em outros espaços, especialmente no domiciliar;

  • ações de distintas complexidades e custos, que variam desde aplicação de vacinas e consultas médicas nas clínicas básicas (clínica médica, pediatria e ginecologia-obstetrícia) até cirurgias cardiovasculares e transplantes;

  • intervenções ambientais no seu sentido mais amplo, incluindo as condições sanitárias nos ambientes da vida e de trabalho, e na produção e circulação de bens e serviços, o controle de vetores e hospedeiros e a operação de sistemas de saneamento ambiental;

  • instituições públicas voltadas para o controle da qualidade, pesquisa e produção de insumos, medicamentos, sangue e hemoderivados e equipamentos para a saúde.

Explicita-se que, quando as suas disponibilidades forem insuficientes para garantir a cobertura assistencial à população de uma determinada área, o SUS poderá recorrer aos serviços prestados pela iniciativa privada. A participação complementar dos serviços privados deve ser realizada mediante o estabelecimento de contratos e convênios, sendo observadas as normas de direito público, os princípios éticos e a regulamentação expedida pelos órgãos de direção do SUS, quanto às condições para seu funcionamento, controle e fiscalização.

O SUS, portanto, não é composto somente por serviços públicos, mas integra serviços privados (com ou sem fins lucrativos), principalmente hospitais e unidades de diagnose e terapia, que são remunerados a partir dos recursos públicos destinados à saúde. O financiamento oriundo de receitas arrecadadas pelo Estado permite que as ações e serviços prestados no âmbito do SUS sejam oferecidos de forma gratuita no momento do atendimento, sem que os usuários tenham que comprovar qualquer forma de contribuição financeira prévia.

PARA IR MAIS LONGE:

Em que pese o caráter público do SUS, assegurado por seus princípios e pela origem estatal dos recursos para seu financiamento, a saúde é livre à iniciativa privada no Brasil. Isso permite a coexistência de vários segmentos de serviços, que se distinguem por vias de acesso e fontes de financiamento (planos e seguros de saúde, sistemas de “clientela fechada” e provedores privados autônomos), auferindo um caráter plural ao nosso sistema de saúde. Tal característica também diferencia a experiência brasileira de outros países que adotam modelos similares para organização de seus sistemas públicos de saúde, onde a presença do segmento privado não é um aspecto tão marcante.

Você vai aprofundar a discussão sobre as relações público- privadas no sistema de saúde brasileiro na aula O público e o privado no sistema de saúde brasileiro, do Módulo 2 do curso.

Os principais princípios e diretrizes do SUS estabelecidos na Lei Orgânica da Saúde (Lei 8.080/1990), complementada pela Lei n. 8.142/1990, são:

PARA IR MAIS LONGE:

O que é, de onde veio e para onde vai o SUS

Portal Scielo

Fonte: Nexo

Em matéria especial, o jornal NEXO contou a história do SUS e construiu sua linha do tempo, até o início da pandemia de COVID-19. O conteúdo está em acesso aberto, no site do jornal.

Dada a abrangência das ações e serviços previstos no SUS, as determinações legais relativas ao âmbito de atuação do Estado na saúde são também bastante amplas. Além da organização e prestação da atenção à saúde, compete ao Poder Público: a execução de ações de vigilância sanitária, epidemiológica, saúde do trabalhador; a ordenação de recursos humanos para a saúde; a fiscalização e produção de insumos para a saúde; e a participação em outras políticas relevantes, como a de saneamento básico, fiscalização de produtos e proteção ao meio ambiente. Ressalte-se que várias responsabilidades do Estado na área da saúde implicam em parceria com outros setores de governo, como o desenvolvimento científico e tecnológico, a formação de recursos humanos, a provisão e regulação de insumos para a saúde, a política industrial, de urbanização, saneamento e educação, entre outros.

Os dispositivos acima mencionados têm as seguintes implicações para a inserção do SUS como uma política de Estado:

  • a responsabilidade pela situação de saúde não é apenas setorial;

  • as políticas econômicas e sociais devem estar orientadas para a eliminação ou redução de riscos para a saúde;

  • é fundamental a integração das políticas de saúde com as demais políticas públicas, e;

  • é necessária a atuação integrada das três esferas de governo no âmbito do SUS.

Clique nos princípios e diretrizes do SUS e veja os direitos dos cidadãos e os deveres do Estado correspondentes.

Direitos dos cidadãos

Igualdade de todos às ações e serviços necessários para promoção, proteção e recuperação da saúde.

Deveres do Estado

Garantia das ações e serviços necessários à toda população, sem preconceitos ou privilégios de qualquer espécie, independente da natureza das ações envolvidas, da complexidade e custo do atendimento.

Direitos dos cidadãos

Participação na formulação, fiscalização e acompanhamento da implantação de políticas de saúde nas diferentes esferas de governo.

Deveres do Estado

Garantia de espaços que permitam a participação da sociedade no processo de formulação e implantação da política de saúde. Transparência no planejamento e prestação de contas das ações públicas desenvolvidas.

Direitos dos cidadãos

Acesso a um conjunto articulado e contínuo de ações e serviços resolutivos, preventivos e curativos, individuais e coletivos, de diferentes complexidades e custos, que reduzam o risco de doenças e agravos e proporcionem o cuidado à saúde.

Deveres do Estado

Garantia ao indivíduo e à coletividade, de condições de atendimento adequadas, de acordo com as necessidades de saúde, tendo em vista a integração das ações de promoção da saúde, prevenção de doenças e agravos, diagnóstico, tratamento e reabilitação. Articulação da política de saúde com outras políticas públicas, como forma de assegurar uma atuação intersetorial entre as diferentes áreas que tenham repercussão na saúde e qualidade de vida das pessoas.

Direitos dos cidadãos

Acesso a um conjunto de ações e serviços, localizados em seu município e próximos à sua residência ou trabalho, condizentes com as necessidades de saúde. Atendimento em unidades de saúde mais distantes, situados em outros municípios ou estados, caso isso seja necessário para o cuidado à saúde.

Deveres do Estado

Garantia de um conjunto de ações e serviços que supram as necessidades de saúde da população e apresentem elevada capacidade de resposta aos problemas apresentados, organizados e geridos pelos diversos municípios e estados brasileiros.

Articulação e integração de um conjunto de ações e serviços, de distintas naturezas, complexidades e custo, situados em diferentes territórios político-administrativos.

Fonte: Adaptado de Noronha, Lima e Machado (2012).

ATIVIDADE AUTODIRIGIDA
ATIVIDADE AUTODIRIGIDA:

Que outros princípios e diretrizes regem o SUS?

Pesquise na Lei Orgânica da Saúde (Lei 8.080/1990) e na Lei n. 8.142/1990 outros dispositivos legais não mencionados até aqui e que tenham implicações para organização do SUS e para atuação do Estado na saúde. Anote os resultados de sua pesquisa.

Em celebração aos trinta anos da promulgação da Lei Orgânica da Saúde (Lei 8.080/1990), o blog do Centro de Estudos Estratégicos da Fiocruz (CEE) ouviu os comentários de vários sanitaristas. Os depoimentos em áudio estão disponíveis na página do CEE.

Print do blog do Centro de Estudos Estratégicos da Fiocruz (CEE), no topo está o nome do blog, abaixo a notícia: “30 anos da lei 8.080/90: acesse podcasts com comentários sobre a lei que consolidou o SUS”, embaixo da notícia a foto de seis sanitaristas.

Configuração institucional do SUS: instâncias decisórias e estrutura de gestão

O modelo institucional proposto para o SUS é ousado no que concerne à tentativa de concretizar um arranjo federativo na área da saúde e fortalecer a participação e o controle social sobre as políticas, de forma coerente com os princípios e diretrizes do sistema.

O modelo pressupõe uma articulação estreita entre a atuação de:

  • gestores do sistema em cada esfera de governo;

  • instâncias de negociação e decisão envolvendo a participação dos gestores das diferentes esferas, a Comissão Intergestores Tripartite (no âmbito nacional) e as Comissões Intergestores Bipartites (uma por estado) e as Comissões Intergestores Regionais (instituídas nas regiões de saúde em número variável em função do desenho regional adotado em cada estado);

  • conselhos de representação dos secretários de saúde, estaduais e municipais, no âmbito nacional (respectivamente, Conselho Nacional de Secretários de Saúde e Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde) e dos secretários municipais de saúde, em âmbito estadual (Conselhos de Secretários Municipais de Saúde);

  • conselhos de saúde de caráter participativo no âmbito nacional, estadual e municipal.

Arcabouço institucional e decisório do SUS

Arranjo institucional do SUS, no organograma na primeira linha estão os títulos que nomeiam as quatro colunas: Colegiado, gestor, comissões intergestores e representações de gestores, na primeira coluna estão os títulos que nomeiam as três linhas: Nacional, estadual e municipal (regional). Na primeira linha, nacional: Conselho nacional - ministério da saúde – comissão tripartite que tem duas setas e se dividem em duas opções – Estados: CONASS e Municípios: CONASEMS. Na segunda linha, estadual: Conselho estadual – Secretarias estaduais – Comissão bipartite – Municípios: COSEMS. Na terceira linha, Municipal (Regional) – Conselho municipal, secretarias municipais e comissão regional.

Fonte: Adaptado de Noronha, Lima e Machado (2012)

O arranjo institucional do SUS, portanto, prevê uma série de estruturas de representação e espaços de negociação e formulação de políticas de saúde que envolvem diferentes esferas de governo e diversos segmentos da sociedade. Tal arranjo permite que vários atores, mesmo os não diretamente responsáveis pelo desempenho de funções típicas da gestão dos sistemas, participem do processo decisório sobre a política de saúde. Dessa forma, o exercício da gestão pública da saúde assume feição compartilhada por diversos entes governamentais e não-governamentais, exigindo a valorização e o funcionamento adequado dos espaços de representação e articulação dos interesses da sociedade.

Essa complexa estrutura institucional para a tomada de decisões no SUS contribui para a realização dos objetivos da política de saúde, e propicia a formulação de respostas aos desafios inerentes à sua implementação.

PARA IR MAIS LONGE:
Portal Scielo

Fonte: Portal Scielo

Conheça um pouco mais sobre os limites, potencialidades e desafios das Comissões Intergestores Bipartite do SUS em estudo realizado sobre o tema no texto Federalismo e política de saúde: comissões intergovernamentais no Brasil (Rev. Saúde Pública 2014, 48(4): 642-650)

Avanços, dificuldades e desafios do SUS

Implementar o SUS em sua concepção original significa romper com o modelo sobre o qual o sistema de saúde brasileiro se estruturou ao longo de várias décadas, em uma conjuntura político-econômica internacional e nacional bastante desfavorável à consolidação de políticas sociais abrangentes e solidárias. Se, por um lado, o contexto de crise econômica e democratização nos anos 1980 favoreceu o debate político na área da saúde que se refletiu nos avanços da Constituição de 1988 e em mudanças objetivas no sistema, a concretização dos princípios do SUS foi continuamente tensionada por diversos obstáculos estruturais e conjunturais. (MACHADO; LIMA; BAPTISTA, 2017).

Os obstáculos estruturais estão relacionados, para alguns autores, a dois grupos básicos de problemas que se apresentam para os países latino-americanos:

  • um primeiro grupo relacionado ao alto grau de exclusão e heterogeneidade (que não são plenamente resolvidos por programas sociais) e aos conflitos entre esforços financeiros, sociais e institucionais para implantar políticas abrangentes em confronto com as restrições impostas pela estrutura socioeconômica dessas sociedades;

  • um segundo grupo de ordem institucional e organizacional, representado pelas características predominantes dos sistemas de prestação de serviços nesses países - centralização excessiva, fragmentação institucional, frágil capacidade regulatória e fraca tradição participativa da sociedade (DRAIBE, 1997).

No Brasil, os obstáculos estruturais se expressam nas profundas desigualdades socioeconômicas e culturais - inter-regionais, interestaduais, intermunicipais -, nas características do próprio federalismo brasileiro, na proteção social fragmentada e no modelo médico-assistencial privatista sobre o qual o sistema foi construído.

Um dos principais desafios para a consolidação do SUS, portanto, é superar as profundas desigualdades em saúde, compatibilizando a afirmação da saúde como direito de cidadania nacional com o respeito à diversidade regional e local. Isso implica uma mudança substantiva no papel do Estado nas três esferas de governo, o fortalecimento da gestão pública com finalidades diferenciadas nos âmbitos nacional, estadual e municipal, a divisão de competências e a articulação de princípios nacionais de política com decisões e parâmetros locais e regionais.

Na área da saúde, não é possível separar os espaços territoriais de atuação e influência política de cada esfera de governo. Em primeiro lugar, porque a perspectiva de construção de sistema é uma dimensão importante a ser considerada no próprio processo de descentralização. Dada a distribuição geográfica desigual dos serviços públicos e privados no SUS, a regionalização, hierarquização e integralidade demandam a formação e gestão de redes de atenção à saúde não diretamente relacionadas a uma mesma unidade político-administrativa, tais como as redes interestaduais de ações e serviços de saúde (que envolvem mais de um estado) e as redes intermunicipais (que envolvem mais de um município).

Em segundo lugar, porque, na maioria das vezes, os fatores que determinam os problemas de saúde e geram demandas para os serviços de saúde não respeitam limites político-administrativos dos entes governamentais. Além disso, a maior parte dos municípios brasileiros e muitos estados, quer seja por questões de escala ou pela diferenciação dos recursos disponíveis (financeiros, materiais e humanos), não possuem condições de prover todas as ações e serviços necessários à atenção integral à população. Essas características indicam a necessidade de se fortalecer as instâncias de planejamento e compartilhamento da gestão pública no SUS, em diferentes escalas territoriais e abrangências, que permitam o desenvolvimento de ações coordenadas.

DESIGUALDADES NO BRASIL

Precisamos falar sobre desigualdades no Brasil. Somos um dos países mais desiguais do mundo, com gigantesco abismo entre ricos e pobres, e esses níveis extremos de desigualdades são incompatíveis com uma sociedade democrática. Entenda essas desigualdades:

Transcrição

PARA IR MAIS LONGE:
A saúde-doença como processo social.

Leia mais sobre o assunto no e-book Como e por que as desigualdades fazem mal à saúde.

Um outro desafio para a superação de obstáculos estruturais está relacionado à articulação intersetorial para o desenvolvimento de políticas mais abrangentes. Pode-se dizer que além dos campos típicos da atenção à saúde (assistência, vigilância epidemiológica, vigilância sanitária), que compreendem as atividades mais diretamente voltadas para o atendimento das necessidades de saúde, outros campos de atuação do Estado são estratégicos em uma política pública voltada para a garantia da saúde como direito social de cidadania. As políticas voltadas para as áreas de desenvolvimento científico e tecnológico em saúde, produção industrial e provisão de insumos, formação de recursos humanos e regulação dos vários mercados em saúde, são exemplos que, em geral, extrapolam o âmbito da autoridade exclusiva da saúde. Particularmente, a atuação do Ministério da Saúde nessas políticas é importante para assegurar o atendimento das necessidades sociais de saúde, configurando, por sua vez, uma concepção ampliada sobre a política de saúde, em sua dimensão social, econômica e de poder.

Em relação aos obstáculos conjunturais, ressalta-se a repercussão no Brasil da onda conservadora de reformas em vários países, no plano político, econômico e social, a partir da década de 1980, com graves consequências e retrocessos históricos no processo de construção da cidadania social. Noronha e Soares (2001) chamam a atenção para o forte conteúdo político-ideológico e neoliberal das reformas implementadas, conduzidas por políticas de ajustes, que seguiram uma agenda elaborada pelos organismos multilaterais de financiamento.

Essas tendências se expressam, desde os anos 1990 no país, por meio da adoção de políticas de abertura da economia e de ajuste estrutural, com ênfase nas medidas de:

  • estabilização da moeda;

  • privatização de empresas estatais;

  • adoção de reformas institucionais orientadas para a redução do tamanho do Estado e do quadro de funcionalismo público, incluindo a agenda de reforma da Previdência e a reforma administrativa;

  • mudanças nas relações de trabalho, com aumento do segmento informal, do desemprego estrutural e fragilização do movimento sindical;

  • desregulamentação dos mercados.

Tais mudanças tensionam as políticas sociais universais em países desenvolvidos e, no Brasil, onde o SUS ainda não foi consolidado, tiveram repercussões mais graves. Desta forma, pode-se dizer que os princípios e diretrizes da política de saúde foram construídos na contracorrente das tendências hegemônicas de reforma dos Estados e sua implementação tem sofrido influência dessas tendências.

Observam-se, nesse início dos anos 2020, tanto avanços como dificuldades nos diversos eixos estratégicos para a implantação do SUS. Confira:

EIXOS ESTRATÉGICOS PARA A IMPLANTAÇÃO DO SUS

Fonte: Atualizado e adaptado de Levcovitz, Lima e Machado (2001)

A complexidade desse quadro faz com que sejam possíveis diversos enfoques de análise sobre a política de saúde no Brasil. Assim, a produção de diferentes autores sobre o SUS no período recente é extremamente variada no que diz respeito ao marco teórico-conceitual adotado e elementos enfatizados, havendo pouco consenso sobre os desafios ainda existentes.

O fortalecimento institucional das três esferas de governo depende de mudanças mais amplas do Estado, que transcendam o espaço da política setorial, sendo a concretização do SUS influenciada por outros aspectos ainda não equacionados como o adequado aporte de recursos financeiros (incluindo os investimentos), a provisão e regulação adequada de insumos, o desenvolvimento científico e tecnológico, a superação dos padrões de iniquidade do sistema e a permeabilidade das instituições do setor saúde aos valores democráticos.

A consolidação do Sistema Único de Saúde, no contexto atual, envolve uma série de complexos desafios, exigindo mudanças estruturais profundas e estratégias de longo prazo. A luta pela garantia da saúde como direito de cidadania é hoje a luta por um novo modelo de desenvolvimento para o país e por um novo espaço para a proteção social e a política de saúde nesse modelo. Tal inflexão requer políticas estatais abrangentes e responsáveis e uma sólida base de apoio ao sistema público, tendo por base o fortalecimento dos laços de solidariedade social no Brasil.

Reflexão sobre o SUS no contexto pandêmico: perspectivas e desafios macroestruturais

O pesquisador José Gomes Temporão, ex-ministro da Saúde, em aula proferida em março de 2021, aborda as perspectivas e desafios macroestruturais do SUS, considerando reflexões sobre o contexto da pandemia de COVID-19, em aula ministrada no Instituto Nacional da Mulher, da Criança e do Adolescente Fernandes Figueira (IFF/Fiocruz)”.

Veja o vídeo da aula ministrada na Semana de Integração Residências IFF/FIOCRUZ. O vídeo está disponível no YouTube - Canal Coordenação de Educação IFF Fiocruz.

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Nesta aula você viu os seguintes tópicos:

  • CheckPrincípios e diretrizes do SUS
  • CheckInstâncias decisórias e estrutura de gestão
  • CheckAvanços, dificuldades e desafios do SUS

Vídeos complementares:

O vídeo conta a história da construção do SUS no Brasil, com ênfase na participação de Sergio Arouca neste processo.

O SUS do Brasil

Assista o filme no link: https://www.youtube.com/watch?v=Cb-cslNmGnE

Transcrição

O documentário “Saúde tem Cura”, dirigido por Silvio Tendler, realizado com o apoio da Fiocruz, aborda a potência e as fragilidades do Sistema Único de Saúde (SUS), um sistema público e universal de saúde que atende a mais de 200 milhões de pessoas gratuitamente. O filme mostra como era o Brasil antes do SUS, fala da luta para a sua criação, traça um panorama recente do sistema, incluindo o cenário da pandemia de Covid-19, e traz reflexões sobre o futuro da saúde no Brasil.

O vídeo mostra o balanço dos 30 anos do Sistema Único de Saúde (SUS), por Jairnilson Paim, referência no campo da saúde coletiva e na luta pela Reforma Sanitária Brasileira.

Jairnilson Paim: uma leitura sobre os 30 anos do SUS

Assista o vídeo no link: https://www.youtube.com/watch?v=C3KRpdIdOGk

Transcrição

ícone indicando o texto para assistir mais vídeosPara outros vídeos sobre o SUS, consultar a Plataforma de Filmes em Acesso Aberto da VideoSaúde da Fiocruz: https://videosaude.icict.fiocruz.br/

REFERÊNCIAS
REFERÊNCIAS:

BAPTISTA, Tatiana W. F. Seguridade social no Brasil. Revista do Serviço Público, Brasília, v. 49, n. 3, p. 99-118, 2014. Disponível em: https://revista.enap.gov.br/index.php/RSP/article/view/373/379

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível em: https://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/518231/CF88_Livro_EC91_2016.pdf

BRASIL. Lei nº 8.142, de 28 de dezembro de 1990. Dispõe sobre a participação da comunidade na gestão do Sistema Único de Saúde - SUS e sobre as transferências intergovernamentais de recursos financeiros na área da saúde e dá outras providências. Diário Oficial [da República Federativa do Brasil], Brasília, DF, 31 dez. 1990, p. 25694. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8142.htm

BRASIL. Lei Orgânica da Saúde - Lei n. 8.080, de 19 de setembro de 1990. Dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 20 set. 1990, p. 18.055. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8080.htm

DRAIBE, Sônia Miriam. Avaliação da descentralização das políticas sociais no Brasil: saúde e educação fundamental. Informe Final do Projeto Estudios de Descentralización de Servicios Sociales da División de Desarrollo Econômico da Cepal. Campinas: Universidade Estadual de Campinas, Núcleo de Estudos de Políticas Públicas, 1998. Disponível em: https://repositorio.cepal.org/server/api/core/bitstreams/96b367d3-353a-4208-8fb9-4b3c9cdfe0f0/content

ESCOREL, S.; BLOCH, R. A. As conferências nacionais de Saúde na construção do SUS. In: LIMA, N. T. et al. (Org.) Saúde e democracia: história e perspectivas do SUS. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2005. Disponível em: https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/7626199/mod_resource/content/1/coll.%20-%20Sa%C3%BAde%20e%20Democracia_%20Hist%C3%B3ria%20e%20perspectivas%20do%20SUS-Fiocruz%20_%20OPAS-PAHO%20_%20OMS-WHO%20%282005%29.pdf

MACHADO, C. V.; LIMA, L. D.; BAPTISTA, Tatiane. W. F. Políticas de saúde no Brasil em tempos contraditórios: caminhos e tropeços na construção de um sistema universal. Cad. Saúde Pública, v. 33, Suppl.2, 2017. Disponível em: https://www.arca.fiocruz.br/bitstream/handle/icict/23547/PoliticasSa%c3%badeBrasil.pdf?sequence=2&isAllowed=y

MACHADO, C. V. et al. Federalismo e política de saúde: comissões intergovernamentais no Brasil. Rev. Saúde Pública, v.48, n. 4, p. 642-650, 2014. Disponível em: https://www.scielo.br/j/rsp/a/JXhzTK954zL4B34GmFZ6QXL/?lang=pt&format=pdf

NORONHA, J. C.; LIMA, L. D.; MACHADO, C. V. O Sistema Único de Saúde - SUS. In: GIOVANELLA, L. et al. (Org.). Políticas e Sistema de Saúde no Brasil. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2012. p. 365-393. Disponível em: https://books.scielo.org/id/c5nm2/pdf/giovanella-9788575413494-18.pdf. Acesso em: 7 maio 2023.

NORONHA, J. C.; SOARES, L. T. A Política de Saúde no Brasil nos Anos 90. Ciência e Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 6, n. 2, p. 445-450, 2001. Disponível em: https://www.scielo.br/j/csc/a/ffQBwmvLX6KgkDFMtMKYH4k/?format=pdf&lang=pt

PAIM, Jairnilson S. et al. O que é o SUS. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2015. Disponível em: http://www.livrosinterativoseditora.fiocruz.br/sus/. Acesso em: 20 jan. 2021.