Módulo 5 | Aula 1 Normas e legislações vigentes relacionadas ao enfrentamento do estigma, da discriminação e das legislações discriminatórias
Fixando o conhecimento
1. Imagine o seguinte caso clínico:
Lívia, uma mulher moradora de uma região periférica do Rio de Janeiro, acaba de receber o diagnóstico de HIV durante o pré-natal. Ao dar o resultado, a médica perguntou se ela era casada e se teve relações fora do casamento. A médica parecia determinada a identificar como ela foi infectada. Abalada e sem entender ainda o resultado da sorologia, Lívia fica constrangida com tantas perguntas e pensa: “Por que a médica quer tanto saber a forma como me infectei pelo HIV”?
Por fim, a médica pergunta: Qual é a sua profissão? Lívia, tão jovem, entende que a médica acha que ela trabalha como profissional do sexo. Negra, vivendo com HIV, morando em uma comunidade, sem companheiro e trabalhando como diarista, ela vai enfrentar muitos desafios a partir dessa descoberta...
O caso clínico citado foi inspirado no livro E se fosse com você? Histórias vividas de estigma e discriminação em 40 anos de HIV/Aids”, organizado por Souza e Pereira (2021) e publicado pela Associação Brasileira Interdisciplinar de Aids (ABIA).
A ginecologista explicou que era fundamental ela começar o tratamento para o vírus não ser transmitido para o bebê, principalmente na hora do parto (carga viral indetectável seria o ideal). Na Unidade Básica de Saúde as fichas das pessoas com HIV eram marcadas com um sinal positivo em vermelho, mas Lívia não queria que seu diagnóstico fosse referido na sua ficha, principalmente no pré-natal compartilhado com o serviço especializado em HIV/Aids. Ela tinha receio que a quebra do sigilo do diagnóstico levaria ela a perder seu trabalho de diarista em função do estigma social do HIV.
O que poderia ser feito para garantir a Lívia um tratamento e pré-natal sem haver quebra do sigilo do diagnóstico de HIV?
Leia as afirmativas e marque a opção correta.
1. Em um atendimento humanizado, a médica poderia indicar para Lívia que não seria marcada nenhuma referência ao HIV em sua ficha, permitindo que seu diagnóstico permanecesse anônimo.
- Verdadeiro
- Falso
A médica poderia ser solidária com as preocupações da Lívia e auxiliá-la na melhor forma de manter o sigilo do diagnóstico. A Política Nacional de Humanização (HumanizaSUS) busca trocas solidárias entre gestores, trabalhadores da saúde e usuários do SUS, visando um atendimento humanizado no cuidado à saúde.
Assista ao TED da médica Dra. Júlia Rocha sobre “O SUS e a humanização da saúde”. Para ela “humanizar não é o destino, é o caminho”:
2. A médica, com experiência no atendimento de mulheres grávidas com HIV na UBS, poderia explicar a importância do uso dos antirretrovirais (na gravidez e parto) para não ocorrer a transmissão vertical do vírus para o bebê e abordar a necessidade dela realizar os exames. O principal seria orientar Lívia a seguir o protocolo para a prevenção vertical de IST do Ministério da Saúde, que indica: privacidade e sigilo de opiniões e condutas para adolescentes e confidencialidade do diagnóstico. Caberia ainda aconselhá-la a ficar atenta às anotações na carteira do recém-nascido para não haver exposição de dados referente ao HIV.
- Verdadeiro
- Falso
A médica deve seguir o “Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas para Prevenção da Transmissão Vertical do HIV, Sífilis e Hepatites Virais”, do Departamento de Doenças de Condições Crônicas e Infecções Sexualmente Transmissíveis (DCCI/SVS/MS), que garante o sigilo do diagnóstico para as gestantes.
Veja o protocolo neste link.
3. A médica poderia sugerir que Lívia fosse esterilizada após o nascimento do filho e, assim, evitar novas gestações com risco de transmissão vertical e não precisar mais revelar sua sorologia nas consultas dos serviços de pré-natal.
- Verdadeiro
- Falso
Tal indicativo fere os direitos sexuais e reprodutivos das mulheres vivendo com HIV/Aids, sendo uma discriminação a tais direitos. Ainda há médicos que pressionam essas mulheres a não se tornarem mães. Segundo a “Declaração dos Direitos Fundamentais da Pessoa Portadora do Vírus da Aids”, de 1989: “XI - Toda pessoa com HIV/Aids tem direito à continuação de sua vida civil, profissional, sexual e afetiva. Nenhuma ação poderá restringir seus direitos completos à cidadania”. A reportagem da ONG Gestos, de Recife, aborda os dados de uma pesquisa nacional de 2019, que diz: “A análise em profundidade do Índice de Estigma em relação às pessoas vivendo com HIV/Aids de mulheres cis destaca o estigma que persiste em relação à maternidade. Além da recomendação para que não se tornassem mães (13,8%), 7,8% disseram terem sido pressionadas para serem esterelizadas; 1,6% ainda teve acesso negado a anticoncepcionais ou a serviço de planejamento familiar”.
Leia sobre essa questão neste link.
2. Vamos continuar falando sobre Lívia:
Após o nascimento do seu filho, Lívia gostaria de seguir o tratamento de HIV em uma Unidade de Saúde distante de sua casa, com receio de que vizinhos e agentes comunitários de saúde saibam do diagnóstico. Ainda traumatizada com o parto (sofreu violência obstétrica e foi deixada por 24h com as dores de parto), Lívia não queria ser discriminada novamente no acesso à saúde. Em função da descentralização da testagem e tratamento do HIV, o serviço de saúde escolhido por ela não queria acolhê-la, pois ela morava em outra Área Programática (AP).
Quais seriam os mecanismos que Lívia poderia utilizar para garantir o seu tratamento de HIV no serviço de saúde escolhido por ela?
Leia as afirmativas e marque a opção correta.
1. Lívia deve aceitar o direcionamento para o serviço de saúde mais próximo de sua casa.
- Verdadeiro
- Falso
Lívia tem o direito de realizar o tratamento de HIV na UBS de sua escolha ou serviço especializado em HIV/Aids. Entre as tensões em torno da descentralização da testagem e tratamento do HIV na Atenção Primária à Saúde (APS), percebe-se que os médicos são generalistas e muitos estão no começo ou fim de carreira, enquanto aqueles dos serviços especializados são infectologistas, com vasta experiência em HIV/Aids. Além disso, há o perigo do compartilhamento do diagnóstico no serviço de saúde. A descentralização do tratamento do HIV na Atenção Básica começou em 2013 a partir de diretrizes do Ministério da Saúde trazendo diversos desafios éticos na atenção de saúde no âmbito local. Ao longo da segunda década dos anos 2000, diversos municípios implementaram a descentralização do tratamento e teste do HIV, capacitando profissionais de saúde. No Rio de Janeiro, a Secretaria Municipal publicou um Ofício Circular (S/SUBPAV/SAP Nº 09/2019) que aborda o “Acesso aos serviços de atenção Primária à Saúde (APS) por pessoas vivendo com HIV/Aids (PVHA)” (Nota Técnica 04). O ofício permite que a pessoa vivendo com HIV possa escolher qualquer unidade da APS para acompanhar o seu tratamento ou um serviço especializado em HIV/Aids.
Fontes:
MELO, E. A.; MAKSUD, I.; AGOSTINI, R. Cuidado, HIV/Aids e atenção primária no Brasil: desafio para a atenção no Sistema Único de Saúde? Rev Panam Salud Publica, 42:e151, 2018.
MELO, E. A. et al. Cuidado de pessoas vivendo com HIV na atenção primária à saúde: reconfigurações na rede de atenção à saúde? Cad. Saúde Pública, 37 (12):e00344120, 2021
2. Lívia deve Pedir ajuda a uma ONG de Aids para que o direito de ser atendida no local de sua escolha fosse respeitado.
- Verdadeiro
- Falso
No começo da descentralização do tratamento do HIV no Município do Rio de Janeiro, algumas ONGs receberam reclamações de que pessoas vivendo HIV/Aids não estavam sendo respeitadas na escolha do local para o tratamento. Ativistas intermediaram o diálogo com alguns serviços de saúde e foram nos locais de atendimento para que o direito de escolha das pessoas vivendo com HIV fosse respeitado.
3. Lívia deve denunciar o impedimento de acesso ao serviço de sua escolha na Ouvidoria da Secretaria Municipal de Saúde (SMS) do Rio de Janeiro, na “Plataforma Integrada de Ouvidoria e Acesso à Informação” (Fala.BR), ligar para o Disque Saúde ou para a Central de Atendimento do Município (1746), que registra demandas para a Ouvidoria da SMS-RJ.
- Verdadeiro
- Falso
A partir do conhecimento da existência de canais de comunicação para realizar denúncias no acesso à saúde, a pessoa vivendo com HIV poderia ligar ou enviar a denúncia via internet para iniciar um diálogo com o serviço de saúde ou para a abertura de processo administrativo relativo ao gestor do serviço.
Para informações sobre a ouvidoria da Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro e das Coordenadorias Gerais de Atenção Primária (CAPs), acesse neste link.