Módulo 2 | Aula 1
letramento racial para trabalhadores do sus
Sistema escravista e trabalho livre no Brasil: cidadania e saúde para quem?
“No dia 14 de maio, eu saí por aí Não tinha trabalho, nem casa, nem pra onde ir Levando a senzala na alma, eu subi a favela Pensando em um dia descer, mas nunca desci”. (14 de Maio - Lazzo Matumbi)
Você já ouviu falar que no Brasil houve uma falsa abolição da escravidão ou mesmo uma abolição inacabada pela Lei Áurea?
Fonte: Arquivo Nacional. Domínio Público. Wikimedia Commons.
Essa questão costuma repercutir anualmente, uma vez que o dia 13 de maio - data da abolição da escravatura em 1988 - não tem sido comemorado pelo movimento negro, mas sim tomado como um dia nacional de luta contra o racismo, diante uma abolição negligente e precária.
Por outro lado, há os que propagam que após a Abolição não houve barreiras institucionais que impedissem que as pessoas negras alcançassem melhores condições de vida no Brasil, uma vez que nosso arcabouço jurídico-institucional é 'a-racial' e combate a discriminação.
Para analisar criticamente essa questão, veremos mais adiante alguns elementos históricos sobre a transição do sistema escravista para o trabalho livre no Brasil, que nos ajudam a compreender como o racismo pavimentou o caminho para as condições contemporâneas de vida, trabalho e saúde da população negra no país.
Lei Áurea assinada, e agora?
Fonte: Junião Cartunista e Ilustrador. 2015. Disponível em: https://juniao.com.br/princesa-isabel-nao-me-representa/
O racismo é uma ideologia que, no passado, fez com que os colonizadores se utilizassem dela para sequestrar pessoas africanas de seu continente e escravizá-las, comercializando-as com fins de enriquecimento, servindo-se delas como se fossem animais de tração (gado, cavalo, jumento) e ainda, fazendo com que a sociedade encarasse isso como algo natural, mesmo já sendo visto como uma desumanidade para os valores europeus à época, quando se tratava de pessoas brancas.
Para saber mais
Clóvis Moura foi um sociólogo, jornalista, historiador e escritor brasileiro, natural de Amarante, no Piauí. Influenciado pelo marxismo, Clóvis desenvolveu a sociologia da práxis negra. Em 1994, publicou um artigo na Revista Princípios sobre as interações entre ideologia e racismo. Saiba mais acessando:
Estudiosos apontam que o tráfico de pessoas escravizadas entre o século XVI e XVIII foi mais lucrativo do que até mesmo a comercialização internacional de produtos agrícolas, frutos do trabalho das pessoas escravizadas nos grandes latifúndios. Ou seja, a escravidão não só foi responsável por construir as bases para essa sociedade capitalista que conhecemos, como foi também responsável por gerar riquezas de famílias de traficantes de escravizados e fazendeiros que mais tarde, no pós-abolição, viriam a se tornar os grandes comerciantes, industriários, banqueiros, políticos influentes, conformando as “elites” responsáveis por comandar a política institucional do país.
Mesmo quando a lei Áurea não mais permitia (pelo menos formalmente) o trabalho escravo em território nacional, essa ideologia se manteve e se renovou afetando diretamente as pessoas que descendiam e carregavam marcas fenotípicas, culturais e sociais dos africanos, antes escravizados (cabelo, nariz, lábios, cor da pele, religião, local de moradia, renda, escolaridade, etc.).
Ou seja, a população negra, foi sistematicamente excluída, sendo apagada das legislações brasileiras que constituíam e ampliavam direitos naquele momento, sendo assim empurrada para a marginalidade, sem acesso a direitos básicos, incluindo as expressões autônomas das culturas afro-brasileiras.
Um exemplo disso foi a proibição da capoeira, mesmo após a abolição da escravidão. Clique nas setas da apresentação abaixo e entenda mais sobre esse assunto:
É fato que a Lei Áurea deixou de reconhecer o direito à propriedade de uma pessoa sobre outra, mas por outro lado não ofereceu políticas de reparação que possibilitassem a integração na sociedade dos escravizados libertos. Aliás, passados quase quatro séculos de escravidão formal no Brasil, tudo o que foi dito na referida lei ocupa apenas exatas três linhas, em dois artigos, assim:
"Art. 1°: É declarada extincta desde a data desta lei a escravidão no Brazil.”
“Art. 2°: Revogam-se as disposições em contrário."
Fonte: Biblioteca Nacional. c2024. Disponível aqui