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Módulo 2 | Aula 4

O Papel das Organizações da Sociedade Civil no Enfrentamento ao HTLV

Objetivos de aprendizagem

  • Conhecer a importância das Organizações da Sociedade Civil (OSCs) na Saúde e no contexto do HTLV.
  • Identificar oportunidades e espaços para fomentar a criação de novas Organizações da Sociedade Civil (OSCs) no país que trabalhem a temática da infecção por HTLV entre diversos grupos populacionais.

A Importância das OSCs na Saúde Pública

O HTLV é um retrovírus que, apesar de ser relativamente desconhecido pelo público geral, tem um impacto significativo na saúde pública. Apesar da gravidade das condições relacionadas ao HTLV, este permanece negligenciado, recebendo pouca atenção da sociedade civil e, principalmente, dos formuladores de políticas públicas. Nesse contexto, as Organizações da Sociedade Civil (OSCs) desempenham um papel crucial no enfrentamento dessa lacuna.

As Organizações Sociais, ou OS, atuam como intermediárias vitais entre a população afetada e os sistemas de saúde, pois elas promovem conscientização, prevenção e tratamento em diferentes temáticas. Essas entidades têm uma conexão direta com as comunidades, o que facilita identificar necessidades emergentes e adaptar suas intervenções de acordo com as especificidades locais.

Além disso, as OS são fundamentais na mobilização de recursos, tanto financeiros quanto humanos, e na implementação de campanhas educativas que podem transformar o panorama de uma doença pouco conhecida. As OSCs também desempenham um papel advocatício crucial, podendo atuar na defesa dos direitos dos pacientes, buscando influenciar políticas públicas à atenção necessária dos órgãos governamentais.

No Brasil, o marco regulatório das Organizações da Sociedade Civil (OSCs) é estabelecido pela Lei nº 13.019/2014, também conhecida como Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil (MROSC). Ela estabelece diretrizes claras para a celebração de parcerias, prestação de contas e acesso a recursos públicos. Esta legislação foi um passo significativo para fortalecer a relação entre o Estado e as OSCs.

No entanto, apesar deste avanço normativo, o envolvimento da sociedade civil na temática do HTLV ainda é extremamente limitado. Poucas OSCs se dedicam ao enfrentamento do HTLV, o que contribui para o cenário de pouca conscientização e interesse público sobre essa condição de saúde negligenciada.

Assim, as OSCs podem contribuir significativamente para a disseminação de informações sobre HTLV, seus modos de transmissão, sintomas e possibilidades de tratamento. Através de palestras, workshops e material informativo, essas organizações educam a população sobre a importância da testagem e da prevenção.

Ademais, as OSCs podem facilitar o acesso a serviços de saúde, promover a realização de testes de triagem e conectar pacientes a especialistas e centros de tratamento. Este papel de facilitadoras é essencial para superar as barreiras de acesso ao diagnóstico e ao tratamento.

A OSCs e o HTLV

As OSCs desempenham um papel fundamental, atuando como pontes entre as necessidades da população e as políticas de saúde pública. Essas organizações são especialmente importantes em contextos onde o sistema de saúde enfrenta limitações ou onde determinadas condições de saúde, como o HTLV, são negligenciadas.

No Brasil, o maior exemplo de OSCs que atua na temática do HTLV, é a Associação HTLVida. Sediada na cidade de Salvador na Bahia, atua ativamente na temática do HTLV, promovendo oficinas, acolhimento e ações educativas regularmente.

Imagem do perfil no Instagram da HTLVida
Fonte: Instagram da HTLVida @htlvida

Embora exista hoje apenas a HTLVida constituída legalmente e dedicada especificamente na temática do HTLV, a experiência e a estrutura dessa organização pode servir como modelo para novas iniciativas focadas neste contexto.

Contribuições das OSCs

As OSCs podem contribuir de várias maneiras para a saúde pública. Um ponto crucial é promover a conscientização sobre condições de saúde negligenciadas, educar a população sobre prevenção e tratamento, e facilitar o acesso a serviços de saúde.

No caso do HTLV, as OSCs podem desempenhar um papel fundamental ao aumentar a visibilidade da doença, organizar campanhas de testagem e prevenção, e fornecer apoio psicossocial aos infectados. Além disso, essas organizações podem realizar pesquisas epidemiológicas e clínicas, ajudando a preencher lacunas de conhecimento e a desenvolver intervenções mais eficazes.

Formas de atuação das OSCs

Educação e Conscientização. Campanhas Educativas: As OSCs podem organizar campanhas educativas para aumentar o conhecimento sobre o HTLV, suas formas de transmissão e prevenção. Programas de Capacitação: Treinamentos e workshops para profissionais de saúde e membros da comunidade são fundamentais para disseminar informações corretas e atualizadas sobre o HTLV. Utilização de Mídias Sociais e Tradicionais: As OSCs podem utilizar diversas plataformas de comunicação, incluindo mídias sociais, rádio, TV e impressos para alcançar um público mais amplo e diverso. PESQUISA E COLETA DE DADOS. Contribuição para a Pesquisa Científica: As OSCs podem colaborar com instituições de pesquisa para coletar dados epidemiológicos e participar de estudos sobre o HTLV. Utilização de dados para melhorar intervenções: Dados coletados podem ser utilizados para melhorar as intervenções e políticas de saúde, direcionando recursos para onde são mais necessários. PREVENÇÃO E REDUÇÃO DA TRANSMISSÃO. Intervenções em Saúde Sexual e Reprodutiva: As OSCs podem promover programas de educação sexual que enfatizem práticas seguras para prevenir a transmissão do HTLV. Triagem e Testagem: Promover a triagem regular e o acesso a testes diagnósticos é crucial para a identificação precoce e manejo da infecção. Prevenção da Transmissão Vertical: As OSCs podem educar e apoiar mulheres grávidas infectadas pelo HTLV sobre as opções para prevenir a transmissão do vírus para seus filhos. APOIO E ASSISTÊNCIA AOS PACIENTES. Grupos de Apoio: A criação de grupos de apoio para pacientes e suas família pode fornecer suporte emocional, social e psicológico. Acesso a Tratamento e Cuidados: As OSCs podem ajudar a facilitar o acesso a tratamentos e cuidados adequados, trabalhando em parceria com serviços de saúde e governamentais. Advocacia e Direitos dos Pacientes: Defender os direitos dos pacientes e garantir que recebam cuidados de qualidade e tratamento digno é uma parte crucial do papel das OSCs.
Fonte: Adaptado de Tatiana Assone

Um exemplo de atuação nessa lacuna é o HTLV Channel, disponível no Youtube e no Instagram. O canal foi fundado em 2020 pelas pesquisadoras Dra. Carolina Rosadas, da Imperial College London, e a Dra. Tatiane Assone da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.

Imagem do perfil no Instagram do HTLV Channel
Fonte: HTLVChannel no Instagram - @htlvchannel

Apesar de não ser uma OSC formalizada, o HTLV Channel se propôs a divulgar nas redes sociais, vídeos e conteúdos informativos sobre a infecção por HTLV, o que oportunizou a conexão de outros atores na temática, como formuladores de políticas públicas e sociedade civil, fomentando um debate sobre a temática.

A partir de vários encontros promovidos pelo HTLV Channel em parceria consolidada com a Organização Panamericana de Saúde (PAHO/WHO) e diversos Ministérios de Saúde de países latino-americanos, observa-se a criação de guias e programas de saúde, direcionados a pessoas que vivem com HTLV na região.

Imagem do canal no YouTube do HTLV Channel
Fonte: HTLVChannel no Youtube - @htlvchannel

Outros canais no Instagram também atuam ativamente na divulgação de conteúdos no Brasil sobre a temática. Conheça alguns perfis liderados por pesquisadores brasileiros em diversas regiões do país.

Esse trabalho reforça a importância da criação de espaços para comunicação em saúde, trazendo informações confiáveis para pessoas vivendo com HTLV, gestores públicos e profissionais da saúde.

Imagem da capa do livro HTL… o quê?
Fonte: Autores

Conheça o Viraldo
Conheça o livro que @htlvbrasil publicou, no Dia Nacional da Pessoa com HTLV, 23 de março. O livro está disponível no repositório Arca, da Fiocruz. Acesse o livro aqui.

Oportunidades para atuação

Há inúmeras oportunidades para as OSCs atuarem na temática do HTLV. Para isso, é importante conhecer a realidade de cada região e o cenário dessa infecção em cada comunidade. Um ponto estratégico é observar a prevalência do HTLV, uma vez que varia de forma significativa nas diferentes regiões do Brasil. Essa variação cria oportunidades específicas para as OSCs atuarem de maneira direcionada.

Por exemplo, no estado da Bahia e no Maranhão, onde a prevalência do HTLV é mais alta, as OSCs podem focar em campanhas de conscientização e testagem em massa, além de oferecer suporte específico para populações de risco, como mulheres grávidas e comunidades rurais e quilombolas. Em regiões com menor prevalência, as OSCs podem se concentrar na educação e na prevenção, impedindo a propagação do vírus e reduzindo o estigma associado à infecção.

Outra lacuna importante de atuação é em relação ao apoio a populações de risco específicas para o HTLV. Essas populações incluem mulheres, especialmente durante a gestação e o parto, e indivíduos em áreas rurais e de baixa renda, onde o acesso à informação e aos serviços de saúde são mais limitados.

Nesse cenário, as OSCs podem desenvolver programas de educação sexual e reprodutiva e oferecer serviços de aconselhamento e suporte psicológico. Ao direcionar suas ações para essas populações, as OSCs podem efetivamente reduzir a transmissão do HTLV e melhorar a qualidade de vida dos infectados, contribuindo para uma resposta mais robusta e equitativa à doença.

Exemplo da atuação da HTLVida

O Grupo de Apoio ao Portador do Vírus HTLV 1/2, conhecido pela sigla HTLVida, é um exemplo de atuação em área de grande prevalência da infecção por HTLV. A HTLVida nasceu do grande incentivo do Prof. Dr. Bernardo Galvão Castro Filho, diretor e fundador do Centro de HTLV da Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública, ao perceber a necessidade de criar uma associação que levasse a voz das PvHTLV para cobrar e provocar a criação de políticas públicas. Outro objetivo da HTLVida é divulgar medidas preventivas a fim de esclarecer a população em geral sobre essa infecção viral.

Fundada em Salvador, na Bahia, em setembro de 2010, a HTLVida está aberta a toda pessoa com suspeita ou diagnóstico de HTLV, que pode acessar gratuitamente serviços como agendamentos de exames e consultas em centros de referência à PvHTLV.

A HTLVida oferece oficinas sobre a infecção, terapias em grupo, cursos de capacitação profissional, assistência social e acolhimento. O atendimento é voluntário e está disponível nas áreas de: fisioterapia, nutrição, psicologia, enfermagem, massoterapia e serviço social. Hoje, a HTLVida atende cerca de 150 pessoas por mês em sua sede.

Imagem de Márcia Brandão e Adijeane Oliveira, ativistas do HTLVida na sede da instituição em Salvador , Bahia
Fonte: Arquivo Pessoal HTLVida

Márcia Brandão e Adijeane Oliveira, ativistas do HTLVida na sede da instituição em Salvador , Bahia

A diretoria da associação, entre diversas dificuldades, incluindo financeiras e de recursos humanos, é composta por PvHTLV, algumas das quais com HAM/TSP. Todos os integrantes da Associação HTLVida participam ativamente de ações como seminários, palestras, rodas de conversas, encontros, entrevistas em jornais, TV e rádios.

A HTLVida tem papel importante no cenário político no Brasil. Também são participantes ativos no Conselho de Saúde de Salvador e Conselho Estadual de Saúde da Bahia e no Grupo de Trabalho para construção da Linha do Cuidado na Bahia, voltada às PvHTLV. Ele integra o Comitê Interministerial para a Eliminação da Tuberculose e Outras Doenças Determinadas Socialmente (CIEDDS).

Imagem de representantes da HTLVida participaram da 17ª Conferência Nacional de Saúde
Fonte: Autores

Representantes da HTLVida participaram da 17ª Conferência Nacional de Saúde

O grupo tem parceria com centros universitários locais e abre suas portas para receber estudantes e profissionais. Eles oferecem terapias e aconselhamento a pessoas que vivem com HTLV. Também em parceria com o Departamento de HIV, Aids, Tuberculose, Hepatites Virais e Infecções Sexualmente Transmissíveis (DATHI, Ministério da Saúde), colabora com oficinas estaduais sobre HTLV.

Além das oficinas estaduais, o HTLVida estimulou a inclusão da meta de eliminação da transmissão vertical do HTLV enquanto problema de saúde pública no Programa Brasil Saudável, reforçando a importância da atuação da sociedade civil no contexto da saúde pública.

Recursos Financeiros e apoio institucional e governamental

A captação de recursos financeiros e o apoio institucional são fundamentais para o sucesso das ações das OSCs na luta contra o HTLV. Ao buscar parcerias com governos em diferentes níveis, universidades e agências internacionais, as OSCs podem ampliar seu alcance e impacto, desenvolvendo ações eficazes e sustentáveis que atendam às necessidades das comunidades afetadas.

Há várias estratégias e fontes potenciais para captar esses recursos, que incluem parcerias com governos, universidades e agências internacionais.

Parcerias com Universidades

As universidades são aliadas valiosas para as OSCs pois elas oferecem tanto recursos financeiros quanto conhecimento técnico e científico.

As OSCs podem firmar convênios com universidades para realizar pesquisas conjuntas sobre o HTLV e desenvolver projetos que investiguem a epidemiologia, os impactos sociais e as melhores práticas de prevenção e tratamento. Além disso, programas de extensão universitária podem mobilizar estudantes e professores para participar de ações comunitárias, como campanhas de conscientização e testagem.

As universidades também podem facilitar o acesso a laboratórios e equipamentos, essenciais para a realização de diagnósticos precisos e pesquisas avançadas sobre o HTLV.

Apoio de Agências Internacionais

Agências internacionais, como a Organização Mundial da Saúde (OMS), o Fundo Global de Combate à AIDS, Tuberculose e Malária, e fundações filantrópicas, são fontes importantes de financiamento para as OSCs. Essas entidades disponibilizam fundos através de editais e chamadas de projetos em iniciativas que combatem doenças negligenciadas e promovem a saúde pública. As OSCs podem elaborar propostas detalhadas e bem fundamentadas, demonstrando como suas ações podem contribuir para os objetivos globais de saúde.

Além do apoio financeiro, as agências internacionais podem oferecer treinamento, capacitação e ferramentas para monitoramento e avaliação de projetos, garantindo que as ações desenvolvidas sejam sustentáveis e eficazes.

Apoio Governamental em Três Instâncias

As OSCs podem buscar apoio financeiro e institucional dos governos em três níveis: municipal, estadual e federal.

• Nível municipal:

As OSCs podem se engajar com as secretarias de saúde locais para desenvolver programas comunitários de conscientização e prevenção do HTLV. Projetos específicos podem ser financiados através de editais e parcerias público-privadas.

• Nível estadual:

As OSCs podem colaborar com as secretarias estaduais de saúde para integrar suas iniciativas aos planos estaduais de saúde, garantindo acesso a fundos estaduais e recursos logísticos, como espaços para eventos e campanhas de testagem.

• Nível federal:

As OSCs podem conseguir subsídios e apoio técnico em programas do Sistema Único de Saúde (SUS) e do Ministério da Saúde. Eles também podem incluir as OSCs em grandes campanhas nacionais de saúde pública.

Estratégias de Captação de Recursos

Para captar recursos de forma eficaz, as OSCs precisam desenvolver estratégias abrangentes que incluam a elaboração de projetos sólidos, a criação de redes de contato e a transparência na prestação de contas. É fundamental a elaboração de propostas claras, que demonstrem impacto social e alinhamento com as prioridades dos financiadores.

Estabelecer uma rede de contatos com potenciais parceiros e financiadores pode abrir portas para novas oportunidades de financiamento. Além disso, a transparência na utilização dos recursos e a prestação de contas regular aumentam a confiança dos financiadores e da comunidade, facilitando a renovação de parcerias e a obtenção de novos apoios.

As parcerias com outras OSCs também colaboram para estabelecer redes de colaboração com outras OSCs para fortalecer as iniciativas e compartilhar recursos e conhecimentos. Sem esquecer de envolver a comunidade local no planejamento e execução das atividades, garantindo que as intervenções sejam culturalmente apropriadas e eficazes.

Com uma abordagem estratégica e colaborativa, as OSCs têm o potencial de transformar o cenário do HTLV no Brasil, promovendo uma saúde pública mais inclusiva e eficiente.

Desafios Enfrentados pelas OSCs

São diversas e complexas as barreiras para a regulação e organização das OSCs no Brasil. Uma das principais dificuldades é a burocracia envolvida na formalização e manutenção das OSCs, o que pode desestimular iniciativas menores e voluntárias.

Além disso, a captação de recursos é um desafio constante, especialmente para temas pouco visíveis e prioritários como o HTLV. A falta de conhecimento sobre a doença entre a população e a ausência de políticas públicas específicas também dificultam a mobilização social e o engajamento de novos atores.

A combinação desses fatores resulta em uma rede de apoio insuficiente para lidar com o HTLV e evidencia a necessidade de ações mais eficazes para promover o envolvimento da sociedade civil e a criação de mais OSCs dedicadas a essa causa.

No Brasil, diversas OSCs já foram criadas dedicadas ao HTLV. A primeira delas, a Vitamore, foi fundada por Sandra do Valle e encerrou suas atividades em 2020. Sandra também foi a criadora do simbólico laço vermelho com bolinhas brancas, que marca a luta de enfrentamento contra o HTLV.

Você chegou ao final da aula

Você viu a importância das Organizações da Sociedade Civil (OSCs) na Saúde e no contexto do HTLV e como identificar oportunidades e espaços para fomentar a criação de novas Organizações da Sociedade Civil (OSCs).

AUTORES: Adijeane Oliveira e Tatiane Assone