Unidade 3

Da Ditadura Civil Militar à regulamentação do SUS

Aula 4

A 8ª Conferência Nacional de Saúde
e o direito à saúde

Criadas durante a Era Vargas, as Conferências Nacionais de Saúde (CNS) são uma arena importante para a mobilização das pautas do setor, principalmente por sua capacidade de reunião de diferentes grupos e agendas.​

Realizada em 1986, a VIII Conferência Nacional de Saúde foi marcada pelos debates sobre a reformulação do sistema de saúde, com pautas caras ao movimento sanitário, como a ampliação da cobertura, a descentralização e hierarquização dos serviços e a participação comunitária.

Sanitarista Sérgio Arouca, um dos líderes do movimento pela reforma sanitária, durante a VIII Conferência Nacional de Saúde, em 1986.
Sanitarista Sérgio Arouca, um dos líderes do movimento pela reforma sanitária, durante a VIII Conferência Nacional de Saúde, em 1986.
Fonte: Projeto RADIS/Fiocruz.

Reunindo um amplo espectro de alianças, a VIII CNS contou com a participação de representantes de diversas entidades da sociedade civil, profissionais de saúde, usuários do sistema e prestadores de serviços de saúde públicos. Os prestadores de serviços privados foram os grandes ausentes nos debates travados nessa Conferência.​

Após a realização da conferência, o movimento sanitário passou a pressionar o Ministério da Saúde e o Inamps/MPAS para a convocação de uma Comissão Nacional para a Reforma Sanitária (CNRS).​​

Material Complementar

Democracia é saúde

Para entender mais sobre o assunto, veja a fala do sanitarista Sérgio Arouca, nome importante na reforma sanitária brasileira, durante a 8ª CNS.​

Sinopse:

Pronunciamento do sanitarista Sergio Arouca durante a 8ª Conferência Nacional em Saúde, realizada em março de 1986, em Brasília (DF), que representa um marco na história do SUS. Arouca, em seu célebre discurso, discorre sobre o conceito ampliado de saúde -- formulado no evento -- definido como completo bem-estar físico, mental e social e não a simples ausência de doença.​

Ao longo de 1987, a CNRS reuniu atores e instituições de diferentes grupos interessados no debate sobre a reformulação do setor saúde no Brasil. Entidades de representação estatal, como o Conselho Nacional de Secretários Estaduais de Saúde (Conass); representações patronais, como a Associação Brasileira de Medicina de Grupo (Abramge); entidades de trabalhadores, como a Central Única dos Trabalhadores (CUT); e entidades científicas, como a Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), estiveram presentes nos debates realizados durante o ano.​

Em resumo, os posicionamentos em disputa envolviam um movimento pela estatização de serviços de saúde e outro alinhado a práticas liberais. O documento produzido pela Comissão Nacional para a Reforma Sanitária trazia como mote a agenda da VIII CNS, mas sua consolidação em legislação envolvia processos bem complicados de negociação na arena política. Por exemplo, um ponto importante para o movimento sanitário consistia na definição orçamentária, que não poderia ser subordinado às áreas de seguridade e previdência.

Na arena política, as negociações em torno da reforma, principalmente com a participação do chamado “Centro Democrático”, ou “Centrão”, resultaram em um projeto que diferia em vários pontos do proposto pelo movimento sanitarista, principalmente no tocante à rede hospitalar.​

Embora o texto constitucional não fosse idêntico ao que os sanitaristas haviam proposto, o essencial foi mantido: era dever do Estado a criação de um sistema universal de saúde, gratuito e de qualidade para todos os brasileiros, bem como a ordenação da formação dos trabalhadores para esse sistema.​

O Sistema Único de Saúde (SUS) deveria ser descentralizado – com a obrigação de o governo federal, por intermédio do Ministério da Saúde, destinar parte do seu orçamento para as secretarias estaduais e municipais de saúde, que teriam de assumir as ações na área de forma autônoma e coordenada. O SUS preconizou uma mudança estrutural no sistema de saúde em direção à universalidade e à eficácia, fazendo da atenção básica a porta de entrada de um sistema destinado a atender às necessidades da população.

O SUS e a reforma sanitária: diferentes visões sobre um resultado complexo.​

A relação entre o movimento pela reforma sanitária e o novo sistema de saúde criado no final dos anos 1980 é alvo de importantes discussões no campo da saúde. O questionamento central é se o SUS seria o resultado esperado pelos atores e instituições envolvidos no movimento reformista.​

Por um lado, existe um posicionamento que ressalta aspectos de permanência em relação ao sistema vigente anteriormente, principalmente na força do setor privado na oferta da assistência médica. Uma parte da crítica aponta que o movimento sanitário tinha a expectativa de uma transformação social mais ampla, que teria sido arrefecida pela negociação política e adequação institucional.​

Por outro lado, existe o apontamento de que o SUS trouxe mudanças importantes ao setor saúde, como a ampliação da atuação do Estado nas linhas de cuidado. Nessa perspectiva, a criação do novo sistema consiste em um ponto de virada para um processo de transformação social mais profunda, o que não ocorreu com a redemocratização.​

De toda forma, as diferentes posições quanto aos resultados da reforma sanitária apontam para a dinâmica de mudanças e continuidades que temos abordado ao longo do curso.

Material Complementar

Jairnilson Paim: uma leitura sobre os 30 anos do SUS​

Vamos continuar entendendo mais sobre o Sistema Único de Saúde? Assista ao vídeo a seguir:​

Sinopse:

Neste vídeo, Jairnilson Paim fala sobre a reforma sanitária e os 30 anos do SUS, uma leitura particular de um ator importante nesse processo.​