Módulo 2 | Aula 4 Tratamento farmacológico do diabetes: estratégias de uso e peculiaridades no manejo dos pacientes idosos
Metas do controle glicêmico
De um modo geral, a meta desejada do controle glicêmico é uma hemoglobina glicada (HbA1c, ou A1C na abreviação em inglês) abaixo de 7%.
A hemoglobina glicada (HbA1c) é um exame de sangue que mede a média da concentração de glicose no sangue ao longo dos últimos dois a três meses. Esse teste é fundamental para o controle e monitoramento do diabetes, pois fornece uma visão geral do nível de controle glicêmico do paciente.
Em pacientes não idosos e saudáveis, a American Association of Clinical Endocrinology (AACE) recomenda, fora da gravidez, níveis de hemoglobina glicada menores que 6,5%, caso seja seguro de alcançar tal meta. Vale lembrar que a hemoglobina glicada é um indicador da média de glicemia dos últimos dois a três meses.
Esse alvo, é geralmente alcançado com níveis de glicemias de jejum abaixo de 110 mg/dl e 2 horas pós-prandial (após as refeições) menor que 140 mg/dl. Níveis de HbA1c próximos a 7% correspondem a glicemias médias diárias de aproximadamente 154 mg/dl, variando de 122 a 184 mg/dl (Tabela 1).
Tabela com a correlação entre os níveis de HbA1c e níveis médios de glicose, tabela dividida em três colunas com a primeira linha sendo: A1C (%), mg/dL * e mmol/L e mais oito linhas, na segunda linha o A1C (%) é 5, o mg/dL* é 97 (76-120) e o mmol/L é 5.4 (4.2-6.7), as outras linhas seguem o mesmo padrão: 6, 126 (100-152), 7.0 (5.5 – 8.5); 7, 154 (123-185), 8.6 (6.8-10.3); 8, 183 (147-217), 10.2, (8.1-12.1); 9, 212 (170-249), 11.8 (9.4-13.9); 10, 240 (193-282), 13.4 (10.7-15.7); 11, 269 (217-314), 14.9 (12.0-17.5); 12, 298 (240-347), 16.5 (13.3-19.3).
Fonte: National Library of Medicine
Os dados da Tabela 1 foram baseados no estudo internacional A1C-Derived Average Glucose (ADAG). Quinhentos e sete adultos com diabetes tipo 1, tipo 2 e não diabéticos realizaram automonitorização da glicemia capilar sete vezes ao dia, enquanto usavam um sensor de glicose. Os dados foram correlacionados aos valores de HbA1c. Este estudo foi capaz de mostrar quais metas de glicemia devem ser buscadas para se atingir níveis de glicemia média desejáveis e, consequentemente, a meta de HbA1c.
Exame de sangue, coletado da ponta do dedo, que oferece resultado imediato acerca da concentração de glicose, por meio de um aparelho de glicemia.
Contudo, é importante salientar que a hemoglobina glicada pode não corresponder às glicemias indicadas na Tabela 1 em certas situações clínicas que afetam o tempo de vida dos glóbulos vermelhos (onde se encontra a hemoglobina), tais como hemodiálise, perda sanguínea, transfusão recente ou terapia com eritropoetina (usada para tratar certos tipos de anemia). Muitas dessas situações são comumente encontradas em pacientes idosos e podem falsamente aumentar ou diminuir os níveis de HbA1c. Nesses casos, as glicemias capilares ou as leituras do sensor de glicose devem ser utilizadas como metas. Para se fazer uma boa avaliação dos pacientes com diabetes tipo 2, o parâmetro regularmente necessário é a medida da hemoglobina glicada. Nos casos de diabetes estável, com a glicemia controlada, o ideal é realizar o exame a cada 6 meses. No entanto, se o diabetes não está controlado, deve-se fazer o exame com mais frequência, a cada 3 meses.
Para idosos com diabetes descompensado, em esquema de insulinoterapia intensiva ou em vigência de um quadro infeccioso ou de doença aguda, é recomendado um monitoramento mais rigoroso da glicemia capilar, realizado em jejum, nos períodos pré-prandiais, 2 horas após as refeições e antes de dormir, visando melhor controle glicêmico e prevenção de hipoglicemias.
Entretanto, a meta do controle glicêmico deve ser individualizada, levando em consideração a expectativa de vida, duração do diabetes, história de hipoglicemia severa ou falta de percepção de hipoglicemias, doença cardiovascular grave, doença renal avançada e condições de comorbidades importantes, como pacientes com câncer em estágio avançado ou aqueles muito fragilizados, com função cognitiva e condição psicológica comprometidas. Isso acontece frequentemente na população de idosos.
Nessas condições, um alvo menos rigoroso de hemoglobina glicada, entre 7 e 8,5%, pode ser recomendado, pois os riscos de um controle glicêmico intensivo (sobretudo hipoglicemias severas e/ou frequentes) passam a ser maiores e mais preocupantes. Esses riscos também podem ser evitados pelo uso de medicamentos antidiabéticos que não estão associados à hipoglicemia, como veremos a seguir.
Mais recentemente, com o advento da medição contínua da glicose pelos sensores de glicose, foram incorporados novos parâmetros nas metas do controle glicêmico, como o tempo no alvo (TIR, do inglês Time in Range), o tempo em hipoglicemia, o coeficiente de variação e a glicemia média estimada.
Nos pacientes portadores de diabetes tipo 1 e 2, o objetivo é alcançar mais de 70% das glicemias entre 70-180 mg/dl, menos de 5% das glicemias acima de 250 mg/dl e menos de 25% das glicemias acima de 180 mg/dl. Enquanto isso, para pacientes diabéticos idosos comprometidos ou muito comprometidos, ou aqueles com presença de múltiplas comorbidades e complicações do diabetes que implicam em maior risco de hipoglicemia severa, a meta desejada seria menos de 10% das glicemias acima de 250 mg/dl, menos de 50% das glicemias acima de 180 mg/dl, mais de 50% das glicemias entre 70 e 180 mg/dl e menos de 1% das glicemias abaixo de 70 mg/dl.