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Pré-natal de
Qualidade

Aconselhamento e Dispensação
de Contraceptivos e Prevenção
da Gravidez na Adolescência
Curso para ACS

Capa das páginas do curso Campus Virtual

Módulo 3 | Condições clínicas comuns

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Aula 3

Anemia por deficiência de ferro durante a gestação

Objetivos de aprendizagem:

  • Analisar as repercussões da anemia sobre a saúde materna e fetal.
  • Interpretar o hemograma para reconhecer alterações nos níveis de hemoglobina.
  • Aplicar protocolos para o acompanhamento da suplementação profilática de ferro na gestação.

O que é anemia

Em termos clínicos, a anemia é uma massa insuficiente de hemácias circulando no sangue; em termos de saúde pública, a anemia é definida como uma concentração de hemoglobina abaixo dos limiares indicados pela OMS, UNICEF, UNU.

Na gravidez, a anemia é definida quando os valores de hemoglobina (Hb) abaixo de 11g/dL.

A anemia nutricional é aquela relacionada à carência de um ou mais nutrientes. A deficiência no consumo ou na absorção de ferro são as causas mais comuns.

Além da deficiência de ferro, a anemia pode ter outras causas:

  • Doenças infecciosas como malária, ancilostomíase e esquistossomose;
  • Deficiências de outros micronutrientes essenciais, incluindo folato, vitamina B12 e vitamina A;
  • Condições hereditárias que afetam os glóbulos vermelhos (hemácias), como talassemia.

Fonte: Freepik (2025)

Eletroforese de Hemoglobina na Gravidez
É o exame que faz parte da rotina do pré-natal, e serve para identificar anemias hereditárias, especialmente anemia falciforme.

Resultados possíveis e conduta

Padrão na Eletroforese Interpretação Conduta
AA Normal Pré‑natal habitual.
AS / AC Traço falciforme Não aumenta risco gestacional significativo → Sem cuidados especiais além do habitual.
SS / SC Doença falciforme Alto risco de complicações (embolia pulmonar, pré‑eclâmpsia, morte) → Acompanhamento em serviço especializado e atenção imediata a sinais de alarme.

Prevalência elevada

A prevalência de anemia durante a gestação, em nível global, foi estimada em 32%, equivalente a 32 milhões de mulheres.

No Brasil, uma revisão incluindo estudos dos últimos 40 anos avaliou a prevalência de anemia ferropriva (anemia por deficiência de ferro) na gestação. A prevalência média foi de cerca de 30%, e variou ao longo da gestação.

Trimestre de gestação Prevalência mínima encontrada Prevalência máxima encontrada
Primeiro trimestre 3,6% 23,9%
Segundo trimestre 9,2% 43,9%
Terceiro trimestre 10,9% 52,3%

Clique aqui e ouça o podcast sobre os principais determinantes da anemia durante a gestação e nos primeiros anos de vida, com base nas diretrizes do Manual de Condutas Gerais do Programa Nacional de Suplementação de Ferro, do Ministério da Saúde

Consequências da anemia para o indivíduo.

As consequências da anemia ferropriva podem variar desde disfunção do sistema imunológico, distúrbios no trato gastrointestinal até comprometimento da regulação e função neurocognitiva. É uma doença que pode ter graves repercussões sobre a qualidade de vida dos indivíduos.

Alerta

Atenção!

Em mulheres grávidas, a anemia pode aumentar os riscos de baixo peso ao nascer, parto prematuro, mortalidade perinatal e neonatal.

Fonte: Campus virtual Fiocruz, por meio da ferramenta Chatgpt.

Como identificar a anemia

Os sintomas clínicos da Anemia por Deficiência de Ferro incluem fadiga, lassidão, palidez e falta generalizada de energia. O exame físico pode mostrar taquicardia, falta de ar, enchimento capilar deficiente, fadiga e palidez da conjuntiva e da pele.

Gráfico
Fonte: Freepik (2025)

Distúrbios comportamentais também foram observados, especialmente em crianças e mulheres grávidas. Um dos mais comuns é a alotriofagia (síndrome de pica), que se caracteriza pelo consumo de itens não alimentares, como terra (geofagia), gelo (pagofagia), tijolo, entre outros. Esse distúrbio está frequentemente associado a deficiências nutricionais, principalmente de ferro e zinco, sendo um sinal de alerta para investigação e correção do estado nutricional do indivíduo.

Podemos identificar a anemia conforme o aparecimento de sintomas, clínicos, físicos e comportamentais conforme a seguir:

  • Fadiga.
  • Lassidão.
  • Falta generalizada de energia.
  • Palidez.

  • Taquicardia.
  • Falta de ar.
  • Enchimento capilar deficiente.
  • Palidez da conjuntiva e da pele.

  • Pica (ou alotriofagia): desejo de ingerir substâncias não alimentares, como:
    • Terra (pagofagia).
    • Gelo (geofagia).
    • Tijolo.

Alerta

Atenção!

Pacientes gravemente anêmicos podem apresentar sintomas de insuficiência cardíaca.

Outras alterações físicas que podem influenciar a qualidade de vida incluem desempenho físico prejudicado e diminuição da atividade física, o que pode resultar em redução da capacidade de trabalho, resistência e produção.

Porém fique atento, nos casos mais leves, os sintomas da anemia por deficiência de ferro podem ser confundidos com sintomas comuns da própria gravidez, como cansaço, fraqueza, sonolência.

Hemograma no primeiro trimestre e início do terceiro trimestre

O rastreamento para anemia deve ser oferecido a toda gestante duas vezes durante o pré-natal. O exame deve ser solicitado o mais precocemente possível (no diagnóstico de gestação) e com 28 semanas. A dosagem de hemoglobina também deve ser solicitada o mais precocemente possível (grau de recomendação A – nível de evidência II).

Alerta

Atenção!

A anemia é diagnosticada através da hemoglobina, um dos parâmetros do hemograma. O diagnóstico de anemia é confirmado se a hemoglobina é < 11 mg/dL. Se maior do 11 mg/dL, a gestante não tem anemia.

Os fatores de risco para anemia na gestação são:

  • Dieta com pouco ferro, vitaminas ou minerais;
  • Perda de sangue decorrente de cirurgia ou lesão;
  • Doença grave ou de longo prazo (como câncer, diabetes, doença nos rins, artrite reumatoide, Aids, doença inflamatória do intestino, doença no fígado, insuficiência cardíaca e doença na tireoide);
  • Infecções de longo prazo;
  • Histórico familiar de anemia herdada, como talassemia e anemia falciforme.

Durante a gravidez, a alimentação é o principal fator de risco para a anemia. Por isso, é essencial orientar a gestante sobre seus hábitos alimentares. As dietas podem ser classificadas de acordo com a biodisponibilidade de ferro em três níveis: baixa, intermediária e alta.

Dieta com baixa biodisponibilidade (5%–10%) Dieta com biodisponibilidade intermediária (11%–18%) Dieta com alta biodisponibilidade (≥ 19%)
Carne, aves, peixe < 30 g/dia.
Ácido ascórbico < 25 mg/dia.
Carne, aves, peixe 30–90 g/dia OU Ácido ascórbico 25–75 mg/dia. Carne, aves, peixe > 90 g/dia OU Ácido ascórbico > 75 mg/dia.
Alternativamente: Carne, aves, peixe 30–90 g/dia + Ácido ascórbico 25–75 mg/dia.
Baseada em cereais, raízes e tubérculos, com quantidades negligenciáveis de carne, peixe ou vitamina C. Predominam alimentos que inibem a absorção de ferro, como arroz, feijão, milho e farinha de trigo integral. Principalmente cereais, raízes e tubérculos, mas inclui alguns alimentos de origem animal e/ou ácido ascórbico. Diversificada e com generosas quantidades de carnes ou alimentos ricos em ácido ascórbico, além de conter poucos alimentos inibidores da absorção do ferro.

Como é a biodisponibilidade de ferro nas imagens abaixo?

Fonte: Freepik (2025)

Prevenção – suplementação com ferro em mulheres sem diagnóstico de anemia

No Brasil, o Ministério da Saúde recomenda a suplementação com ferro para todas as mulheres grávidas, desde o início da gestação. Em alguns casos, a mulher não consegue ingerir o suplemento de ferro na fase inicial da gravidez, devido à presença de vômitos, muito frequentes nesta fase da gravidez. A critério do médico, o início da suplementação pode ser adiado para uma fase mais tardia (a partir de 20 semanas, por exemplo).

Recomendações para a suplementação de ferro no Brasil

Público Conduta* Periodicidade
Crianças de seis a 24 meses 1 mg de ferro elementar/kg Diariamente até completar 24 meses
Gestantes (ao iniciar o pré‑natal) 40 mg de ferro elementar e 400 µg de ácido fólico Diariamente até o final da gestação
Mulheres no pós‑parto e pós‑aborto 40 mg de ferro elementar Diariamente até o terceiro mês pós‑parto e até o terceiro mês pós‑aborto
Fonte: Ministério da Saúde, 2013.

*Essas condutas estão de acordo com as recomendações oficiais da Organização Mundial da Saúde (WHO, 2001; 2012); da Sociedade Brasileira de Pediatria (2013), para prevenção e controle da deficiência de ferro, e da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (2012), para prevenção da ocorrência de defeitos do tubo neural.

Qual é o papel do ACS?

Conversar com a gestante e verificar se recebeu os suplementos de ferro, se está ingerindo os comprimidos e se apresenta algum efeito colateral. Efeitos colaterais são muito frequentes e podem levar a mulher a abandonar o tratamento. Se isso ocorrer, uma avaliação médica é necessária, para avaliar formas alternativas de administrar o ferro.

Formulário
Fonte: Caderneta da Gestante, Ministério da Saúde, 2024.

Outra ação importante do ACS é investigar fatores de risco para anemia por deficiência de ferro, particularmente fatores dietéticos. A alimentação deve ser variada, com fontes de proteínas, carboidratos e vitaminas. Na Caderneta da Gestante, existem orientações úteis sobre dieta saudável, que podem ser utilizadas pelo ACS.

Caderneta
Fonte: Caderneta da Gestante, Ministério da Saúde, 2024.

Tratamento da anemia com sulfato ferroso oral

Se a concentração de hemoglobina for inferior a 11 g/dL, o diagnóstico de anemia está confirmado. Embora outras causas possam estar associadas à anemia, a deficiência de ferro é a mais comum. Por isso, o tratamento inicia-se com um medicamento à base de ferro. Existem diversas formulações disponíveis, mas o medicamento ofertado pelo SUS é o sulfato ferroso.

Sulfato ferroso
Fonte: Campus virtual Fiocruz, por meio da ferramenta Chatgpt.

Para o tratamento de anemia, recomenda-se 120 a 200 mg de ferro elemento por dia. Existem inúmeras apresentações e fórmulas de ferro. O Ferro disponibilizado pela RENAME é o sulfato ferroso em comprimidos, contendo 40 mg de ferro elemento.

A posologia recomendada corresponde de 2-5 cp/dia, em duas tomadas diárias, antes das refeições.

Alguns fatores podem aumentar ou diminuir a absorção de ferro no trato gastrointestinal.

Aumentam a absorção Diminuem a absorção
  • Ascorbato (vitamina C).
  • Aminoácidos.
  • Deficiência de ferro.
  • Fitatos (presente em leguminosas).
  • Antiácidos (medicamentos).
  • Sobrecarga de ferro.
  • Uso concomitante de polivitamínicos (zinco, cobre, manganês).

O feijão é um alimento importante para a suplementação de ferro, especialmente em populações com maior risco de anemia, como gestantes e crianças.

Além disso, é rico em ferro, fibras e proteínas, sendo fundamental na alimentação cotidiana de muitas famílias brasileiras. No entanto, a forma de preparo pode influenciar diretamente na absorção de seus nutrientes. Uma etapa simples, mas muito importante, é o remolho dos grãos.

Deixar o feijão de molho em água ou vinagre é uma forma de eliminar fitatos, substâncias que dificultam a absorção de nutrientes.

Nesse sentido, o agente de saúde tem um papel fundamental ao orientar a gestante sobre práticas alimentares que favorecem a absorção do ferro, incluindo o preparo adequado de alimentos como o feijão.

Deixar o feijão de molho em água ou vinagre é uma forma de eliminar fitatos, substâncias que dificultam a absorção de nutrientes.

A importância dos alimentos na prevenção e tratamento da anemia

Mas uma dieta rica em ferro pode atuar em sinergismo com os comprimidos de ferro, facilitando o tratamento. Se estiver disponível, vale a pena uma consulta com nutricionista.

  • Todas as mulheres grávidas devem receber aconselhamento dietético (2B).
  • A educação e o aconselhamento em relação à dieta podem melhorar a ingestão de ferro e aumentar a absorção, mas o grau de mudança alcançável permanece em questão (2B).

> O efeito colateral na suplementação do ferro

A intolerância gastrointestinal com o uso de sulfato ferroso é bastante alta (até 70% dos pacientes).

Os efeitos adversos mais relatados incluem náusea, flatulência, dor abdominal, diarreia, constipação e fezes escuras. Por isso, até 50% dos pacientes abandonam o uso da medicação, levando à falha no tratamento e investigações desnecessárias.

Evento adverso Sulfato ferroso n=238 Ferro polimaltose n=319 p
Náusea, pirose, epigastralgia. 45,7% 13,1% <0,001
Diarreia. 15,4% 5,9% <0,001
Constipação. 15,9% 8,7% <0,05
Mancha nos dentes. 7,7% 0,7% <0,001
Fonte: CANÇADO et al. (2010).
Alerta

Atenção!

A baixa adesão, devido a efeitos colaterais do sulfato ferroso, constitui uma das principais causas de falha do tratamento.

Caso a gestante relate desconforto com o uso do sulfato ferroso, agende uma consulta com o médico. Existem estratégias para controlar os efeitos colaterais e melhorar a adesão ao tratamento.

É comum a prescrição de outras preparações de ferro para diminuir a frequência de efeitos colaterais. Frequentemente são medicações mais caras, não disponíveis no sistema público. Não existem evidências de que outras preparações de ferro apresentem menor frequência desses efeitos adversos.

Para acompanhar a gestante, o agente de saúde deve orientar sobre a importância do retorno à unidade de saúde cerca de 30 dias após o início do tratamento com sulfato ferroso. Nesse período, um novo hemograma deve ser realizado para avaliar a resposta à suplementação. Espera-se um aumento de 2 a 3 g/dL nos níveis de hemoglobina.

Caderneta
Fonte: Caderneta da Gestante, Ministério da Saúde, 2024.

Se não houver aumento nos níveis de hemoglobina após 30 dias de tratamento, o médico deverá reavaliar o caso para identificar a causa. Na maioria das vezes, o problema está na adesão inadequada ao uso do sulfato ferroso. No entanto, também é preciso considerar outras possibilidades, como má absorção intestinal do ferro ou anemia de outra origem.

O ACS deve estar atento à adesão ao tratamento com sulfato ferroso. Durante as visitas domiciliares, deve perguntar se a gestante está fazendo uso da medicação e se está tolerando bem. Também é importante observar as datas: se já se passaram de 3 a 4 semanas desde o início do tratamento, é hora de orientar sobre a necessidade de repetir o hemograma para avaliar a resposta terapêutica.

E quando a anemia não melhora, mesmo após tratamento adequado? Ou nos casos mais graves, com hemoglobina muito baixa?

Caderneta
Fonte: Caderneta da Gestante, Ministério da Saúde, 2024.

Anemia moderada-grave

Pacientes com anemia grave devem ser imediatamente encaminhadas para serviço de referência para investigação e tratamento conforme a etiologia. Além dos efeitos sobre resultados fetais e perinatais, de afetar a qualidade de vida da mãe, anemia moderada e grave foi associada a maior risco de mortalidade materna.

Encaminhamento para serviço de referência (PNAR) deve ser considerado sempre que presentes sintomas significativos, ou uma das condições abaixo:

  • Anemia grave (Hb < 8 mg%).
  • Gestação tardia (> 34 semanas).
  • Falha em prova terapêutica.

Em algumas situações, pode ser necessário o uso de ferro venoso, o que deve ser sempre avaliado e prescrito por um médico. Nesses casos, o medicamento mais utilizado é o Noripurum (sacarato de hidróxido férrico). A dose recomendada depende do peso da paciente e do nível de hemoglobina. De modo geral, a mulher deve retornar à unidade de saúde duas a três vezes por semana, por um período de 2 a 3 semanas. O ACS deve acompanhar o tratamento até sua conclusão, garantindo que todas as etapas sejam cumpridas.

E após o parto? O tratamento continua?

Sim. Após o parto, é fundamental avaliar a situação da mulher:

A anemia na gestação e nos primeiros anos de vida continua sendo um desafio de saúde pública com impactos diretos sobre o bem-estar da mulher e o desenvolvimento da criança. O acompanhamento adequado, a suplementação com ferro e a adoção de práticas alimentares saudáveis são estratégias fundamentais para enfrentar esse problema.

O papel do Agente Comunitário de Saúde é essencial nesse processo. Ao identificar sinais precoces, orientar sobre o uso correto da suplementação, acompanhar os retornos e reforçar a importância do pré-natal, o ACS contribui de forma direta para a prevenção, o diagnóstico e o sucesso do tratamento da anemia.

Mais do que distribuir informações, é preciso construir vínculo, promover confiança e garantir que cada gestante se sinta acolhida, compreendida e bem orientada.

Atividade

Em relação à anemia durante a gravidez, é correto afirmar que:


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