Módulo 1

Introdução

Aula 3

Princípios e diretrizes do SUS no processo de Gestão de Riscos de Emergências em Saúde Pública

O processo de gestão de riscos de emergências em saúde pública deve ser contínuo e permanente, contemplando todas as etapas e fases diferenciadas: etapa de Redução do Risco de Desastre, com as fases de prevenção, mitigação e preparação; etapa de Manejo do Desastre, com as fases de alerta e resposta; e a etapa de Recuperação, com as fases de reabilitação e reconstrução (Narvaéz et al, 2009).

Como citado anteriormente, o setor saúde, mais especificamente o SUS, deve estar organizado e preparado para agir em todas as etapas deste processo, seguindo os seus princípios e diretrizes, a fim de minimizar os fatores de risco para as emergências em saúde pública e seus impactos nas condições de vida e saúde dos indivíduos e populações.

A seguir veja esses princípios e diretrizes e suas relações com o processo de Gestão de Riscos de Emergências em Saúde Pública.

Princípios

No contexto das emergências em saúde pública é necessária atenção a todos os grupos populacionais vulneráveis, expostos e afetados. Todos devem ter acesso às ações e serviços de saúde.

Diante do contexto das emergências em saúde pública, as ações do setor saúde devem ser intensificadas principalmente para territórios e grupos populacionais mais vulneráveis e que apresentam necessidades diferentes, de modo a se alcançar a igualdade de oportunidades para todos os grupos sociais e populacionais que apresentam condições desiguais diante da emergência em saúde pública, do adoecer e/ou do morrer, para se garantirem condições de vida e saúde mais iguais para todos.



A partir da ocorrência das emergências em saúde pública são necessárias ações que envolvam todos níveis de atenção desde a vigilância em saúde, a promoção da saúde, a prevenção de riscos e agravos, a assistência e a recuperação em saúde, para os efeitos de curto, médio e longo prazos, considerando o sujeito inserido em um contexto social, familiar e cultural.

Diretrizes

O processo de gestão de riscos de emergências em saúde pública deve ter uma direção única em cada nível do governo (municipal, estadual e nacional). E o setor saúde, caso seja necessário, deve atuar nos seus três níveis do governo para oferecer ações especificas para a gestão de riscos de emergências em saúde pública.

As ações, instalações, recursos (leitos, profissionais, laboratórios) e capacidade do setor saúde devem estar organizados para, caso seja necessário, superar as limitações municipais e considerar a delimitação de uma base territorial regional para as ações da gestão de riscos para emergências em saúde pública. Ampliando a área de abrangência das ações para além do nível municipal e envolvendo as regiões e redes de atenção existentes no nível estadual, mesmo que não sejam estruturadas ou utilizadas em tempos de “normalidade”.

No contexto das emergências em saúde pública é necessário o estabelecimento de uma rede que articule os diferentes níveis de complexidade das unidades de atendimento de saúde, por meio de um sistema de referência e contrarreferência de usuários e de informações e estabelecimento de vínculos específicos entre unidades que prestam serviços de natureza mais específica, como rede de atendimento a urgências/emergências e rede de atenção básica. A depender do tipo de emergência em saúde pública, como a pandemia da Covid-19, os atendimentos podem ser feitos na urgência e emergência, como também pela atenção básica e vigilância em saúde.

A participação social deve estar contemplada em todas as etapas e fases do processo de gestão de riscos de emergências em saúde pública. O compartilhamento de conhecimentos diferenciados (técnicos, científicos e comunitários) e aprendizagem coletiva são fundamentais para subsidiar as ações da gestão de riscos e a garantia da sustentabilidade delas.

Fonte: adaptado de Freitas et al, 2018.

Tendo como referência a pandemia da COVID-19, esta tem como ameaça/perigo os fatores biológicos que provocam impactos na saúde. A combinação destas ameaças com a exposição (indivíduos que não podem se manter isolados como trabalhadores essenciais, trabalhadores informais, moradores de ruas, pessoas que precisam de transporte público, presidiários, entre outros), condições de vulnerabilidade social (condições de vidas inadequadas, idosos e pessoas com hipertensão, diabetes, obesidade, problemas respiratórios), e a insuficiente capacidade de resposta (ausência de equipamentos, insumos e recursos humanos em estabelecimentos de saúde) fazem com que a pandemia seja uma Emergência em Saúde Pública (Rocha e Londe, 2021).

Este cenário gera riscos, compromete ainda mais a capacidade de resposta do setor saúde, amplia as condições de vulnerabilidades já existentes e aumenta a possibilidade de riscos presentes e futuros para outras emergências em saúde pública.

O espalhamento da COVID-19 nas periferias das grandes cidades expôs a fragilidade prévia das redes locais de saúde, incluindo os diferentes setores, como: atenção básica, urgência e urgência e emergência e vigilância em saúde. Tal situação gera um “colapso” como a incapacidade da rede de saúde de ofertar cuidado diante do aumento significativo da demanda, seja pela falta de profissionais, serviços ou equipamentos (Costa et al, 2020).

Em determinadas capitais e municípios do Brasil o sistema de saúde sofreu esgotamento e colapso.

Clique nas áreas destacadas do mapa e veja o que ocorreu nessas regiões.

Manaus Manaus, por exemplo, foi palco de elevadas taxas de incidência e mortalidade pela COVID-19 em maio de 2020, nas últimas semanas de dezembro de 2020 e primeiras semanas de janeiro de 2021, uma nova onda de casos atinge o município, resultando no colapso do sistema municipal e privado de saúde por falta de leitos de enfermaria, leitos de UTI, oxigênio e profissionais de saúde (Barreto et al, 2021). Com a superlotação dos hospitais, diversos doentes precisaram ser transferidos para outros estados, como Maranhão, Piauí, Goiás, Rio Grande do Norte e Paraíba e para o Distrito Federal (Cofen, 2021)

O exemplo de Manaus demonstra que o processo de Gestão de Riscos para a pandemia, como uma Emergência em Saúde Pública, especialmente com ações de preparação e resposta, foram frágeis e não consideraram as premissas do processo Gestão de Riscos assim como os princípios do SUS.

Fonte: Politize, 2021

Diante deste exemplo e de tantas outras situações que o sistema de saúde no Brasil tem vivenciado durante a pandemia, é importante que os princípios Universalidade, Equidade e Integralidade sejam garantidos, visto que estes 3 pilares estão intimamente relacionados, e a performance de um afeta os outros.

Para Refletir

A má performance da equidade, ou seja, o não investimento e restruturação dos serviços de saúde onde há maior carência, afeta a integralidade, não oferecendo a assistência necessária em todos os níveis. Isso, por sua vez, implica no não alcance da universalidade, ou seja, o sistema único de saúde brasileiro não chega da mesma forma a todos que estão no território especialmente diante de uma emergência em saúde pública, como a Covid-19 (Politize, 2021).

Por isso, é importante a união dos 3 princípios SUS para garantir o acesso universal e integralidade a todos os indivíduos (sem qualquer distinção de sexo, classe social e raça) aos cuidados e serviços em saúde nos níveis de complexidade dos setores, assim como a igualdade de oportunidades para todos os indivíduos e população é fundamental para o alinhamento do processo de gestão de riscos do setor saúde para a COVID-19 com os princípios do SUS (Politize, 2021).

Além destes aspectos, para garantia da integralidade é fundamental estabelecer políticas, planos e ações que evitem a descontinuidade e desassistência de diversos tratamentos para diferentes grupos, bem como a quantidade suficiente de testes de COVID-19 para vigilância e vacina para prevenção especialmente para os grupos sociais e populacionais mais vulneráveis, que muitas vezes também demonstram maior precariedade no acesso ao sistema de saúde.

E por fim, para a garantia da equidade é essencial a redistribuição da oferta de ações e serviços, de modo a priorizar a atenção para grupos sociais, cujas condições de vida e saúde sejam mais precárias, desta forma garantindo que as diferentes necessidades de grupos e indivíduos sejam atendidas.

Atenção

A priorização e superação de barreiras históricas que superem o subfinanciamento e desestruturação do SUS em todos os níveis de governo é outro passo importante para avançarmos em garantir que a Gestão de Riscos de Emergências em Saúde Pública esteja em total sintonia com os princípios do SUS (Freitas et al, 2020).

Certamente, o SUS ainda possui fragilidades, porém é muito importante observar os pontos positivos desse sistema universal de saúde. Este é o único sistema público universal para mais de 100 milhões de pessoas antes, durante e depois de uma crise sanitária. Considerando nosso cenário atual, da pandemia da COVID- 19, caso o SUS não existisse, os impactos sanitários poderiam ser ainda maiores, combinados com os econômicos através de endividamentos para atendimentos, diagnósticos e internações.

Além da sua capilaridade quase que no país inteiro, o que facilita a detecção de casos sintomáticos suspeitos, acompanhamento dos isolados domiciliares, busca ativa de grupos de risco, vacinação pela influenza, assistência em diversos níveis de complexidade, dentre tantas ações para minimizar os efeitos da pandemia e monitorar seus efeitos para além do pico da curva de casos confirmados e mortes pela COVID-19.

(Filho Silva, 2020)
Por isso, a importância do SUS, nas três esferas de gestão, e que este esteja preparado para atuar em todas as etapas e fases do processo de gestão de riscos para emergências em saúde pública (Rocha e Londe, 2021).

(Rocha e Londe, 2021).

A pandemia da COVID-19 é o maior desafio do sistema de saúde brasileiro em décadas e uma oportunidade histórica de resgatar a centralidade do SUS como política social. O apoio do Estado e da sociedade brasileira à organização pública da saúde possibilitará ao SUS avançar significativamente no alcance dos seus princípios e diretrizes (Facchini, 2020).

Além disso, é fundamental que o processo de Gestão de Riscos para Emergências em Saúde Pública tenha como eixo organizador as medidas e ações do projeto de nação presente na Constituição Federal de 1988, que tem seus compromissos pautados na cidadania e na dignidade humana. Este compromisso tem como objetivos fundamentais uma “sociedade justa e solidária” e “um desenvolvimento nacional combinado com erradicação da pobreza, redução das desigualdades sociais e promoção do bem de todos”. É deste compromisso e objetivos que nasce e se estrutura o SUS, como sistema de saúde de acesso para todos, cuidando de modo diferenciado de quem mais necessita e mantendo as condições e capacidades de cuidar dos problemas e necessidades de saúde como um todo, além da COVID-19, pautado assim nos princípios de universalidade, equidade e integralidade, saúde para todos (Freitas et al, 2020).

Rocha e Londe (2021), afirmam que o SUS deve atuar em todas as etapas do processo de Gestão de Riscos de Emergências em Saúde Pública, visto que este é capaz de conhecer os riscos, ameaças, populações expostas e vulneráveis. Assim será possível priorizar políticas públicas e ações para reduzir e controlar os fatores de risco e minimizar os impactos nas populações afetadas.