Módulo 3 / Aula 1

Manejo Clínico da gestante no contexto da Covid-19 - contexto brasileiro

Olá! Essa é a primeira aula do Módulo 3 do curso Covid-19 e a atenção à gestante em comunidades indígenas e tradicionais. Ao final da aula, você vai ser capaz de:

  • Identificar mecanismos de transmissão e manifestações clínicas da Covid-19.
  • Identificar critérios de gravidade da Covid-19 em gestantes e puérperas, bem como apontar seus efeitos na gravidez e no recém-nascido.
  • Recomendar ações para manutenção do pré-natal, sem comprometer a segurança de gestantes e profissionais e organizar a triagem e os fluxos para atendimento ao parto de mulheres assintomáticas e sintomáticas.
  • Identificar sinais de tromboembolismo venoso, deterioração clínica e necessidade de intervenções.
  • Discutir ações para prevenção da mortalidade materna por Covid-19.

Para uma experiência de aprendizagem mais ampla, assista aos vídeos e visite os materiais e links externos que estão disponíveis ao longo do texto. Eu vou sempre te indicar materiais que podem contribuir para o seu aprendizado.

Gravidade da Covid-19 em Mulheres Grávidas e Não Grávidas

Não estava claro no início da pandemia se a gravidez em si era um fator de risco para casos graves de Covid-19. Atualmente existem evidências crescentes de que as mulheres grávidas podem ter risco aumentado de doença grave por Covid-19 em comparação com mulheres não grávidas, particularmente no terceiro trimestre e puerpério.

O sinal mais consistente de gravidade aumentada nesse público é o aumento nas admissões de UTI para mulheres grávidas.

É provável que a internação em UTI seja mais comum em mulheres grávidas com Covid-19 do que em mulheres não grávidas da mesma idade com Covid-19.


No momento atual, entende–se que as gestantes e puérperas constituem grupo de risco frente à Covid-19.


Transmissão da Covid-19

A maioria dos casos de Covid-19 é transmitida de pessoa para pessoa. O vírus pode ser facilmente isolado de gotículas ou secreções respiratórias, fezes e fômites (objetos). A transmissão do vírus é conhecida por ocorrer mais frequentemente através do contato próximo com uma pessoa infectada ou de superfícies contaminadas.

Transmissão vertical

A transmissão vertical é aquela que ocorre da mulher para o bebê no período pré-natal ou intraparto. As evidências sugerem que, se a transmissão vertical ocorre, ela é incomum. Se ocorre, parece não ser afetada pelo tipo de nascimento, clampeamento tardio do cordão umbilical, contato pele a pele, amamentação ou alojamento conjunto. A capacidade de transmissão do SARS-CoV-2 pelo sangue ainda é incerta. Foi detectada presença temporária do vírus, em pequena quantidade em 1% dos pacientes sintomáticos, sugerindo que a via placentária de transmissão viral seja provável, mas não frequente.

Prevenção e cuidados

A prevenção da Covid-19 se baseia em isolamento de casos e contatos, distanciamento social, uso de máscaras e práticas de higiene, incluindo etiqueta respiratória e lavagem correta das mãos com água e sabão. Essa orientação deve ser mantida e reforçada para gestantes e puérperas.

As mulheres devem ser aconselhadas a continuar seu cuidado pré-natal de rotina.O cronograma de atendimento pré-natal deve ser oferecido na íntegra sempre que possível. Idealmente, e onde for seguro, essas consultas devem ser feitas pessoalmente, principalmente para mulheres que vivem com condições médicas, sociais ou psicológicas que as colocam em maior risco de complicações ou resultados adversos durante a gravidez.
Alterações no cronograma de atendimento pré-natal podem ocorrer em casos suspeitos ou confirmados de Covid-19.

Gestantes com diagnóstico confirmado de infecção pelo Sars-CoV-2, caso essas gestantes necessitem de retorno ao pré-natal ou atendimento de urgência/emergência nos 10 dias iniciais de sintomas, deverão ser atendidas em área ambulatorial definida para Covid-19 ou em serviços de emergência. Mesmo após avaliação presencial, caso essas gestantes retornem para suas residências, precisam ser monitoradas por contato telefônico a cada 24 horas para acompanhamento da evolução da doença até o 10º dia do início dos sintomas pelo risco de agravamento do quadro. Havendo piora clínica da paciente, esta deverá ser orientada a se dirigir à unidade hospitalar para avaliação e possível internação.

As gestações de alto risco podem exigir maior frequência de consultas presenciais. Em muitos casos, avaliações maternas e de vitalidade fetal seriadas são necessárias e devem ser preservadas. Gestantes com comorbidades, especialmente com diabetes e hipertensão arterial, devem seguir os protocolos assistenciais e de retornos de rotina dos ambulatórios de alto risco.

Nos casos das gestantes que residem em territórios indígenas, atendidos pelo Subsistema de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas (SASISUS), deve-se evitar o deslocamento e permanência nos centros urbanos para a realização de exames de rotina. Como alternativa, sugere-se priorizar os testes rápidos; coletas de material no próprio território e envio para os laboratórios credenciados em condições adequadas de acondicionamento; e uso de equipamentos portáteis. Em situações urgentes, que exijam a remoção, os municípios deverão priorizar o seu atendimento, considerando os riscos de infecção da gestante e de toda sua comunidade, devido à sua longa permanência nos centros urbanos.

Modificações nos serviços são necessárias para permitir medidas de distanciamento social, para reduzir o risco de transmissão entre mulheres, funcionários e outros visitantes da Unidade.

Organização dos fluxos de atendimento

A organização dos fluxos de atendimento de gestantes e puérperas é essencial para proteção de pacientes, contactantes, recém-nascidos e profissionais da saúde. Na vigência da pandemia pelo SARS-CoV-2, torna-se extremamente necessária a reorganização da Rede para a adequada assistência e acompanhamento da mulher durante o ciclo gravídico puerperal. Nesse sentido, algumas questões devem ser observadas:

  • Antes do atendimento nos serviços de saúde, toda gestante precisa passar por triagem para sintomas gripais e sobre o contato prévio com paciente positivo, além de ter a sua temperatura aferida. Para consultas eletivas, essa triagem deve ocorrer idealmente dois dias antes, por telefone, e repetida na recepção no dia da consulta. Confira o protocolo indicado para triagem aqui:
  • Toda a vez que eu chegar numa unidade de atendimento, não esqueça de me fazer as perguntas para triagem clínica

    Abordagem

    "Antes do seu atendimento, preciso que você responda algumas perguntas. É muito importante que você responda com sinceridade, para podermos cuidar de você da forma correta"

    Faça uma pergunta de cada vez e dê tempo para a resposta

    • Você está com gripe?
    • Você está tendo tosse?
    • Seu nariz está escorrendo?
    • Você está com dor de garganta?
    • Você está com dor no corpo?
    • Você está percebendo que não consegue sentir cheiro e o sabor/gosto das coisas?
    • Você teve febre ou sentiu calafrios nos últimos dois dias?
    • Você tem falta de ar?
    • Você está com um quadro de diarréia?
    • Você teve contato com alguém que testou positivo para Covid, nos últimos 14 dias?
    • Você teve contato com alguém que foi internado por gripe ou pneumonia, nos últimos 14 dias?

    Resultado

    Se a gestante respondeu NÃO a todas as perguntas e não apresenta temperatura ≥37,5ºC: atendimento pré-natal de rotina em área comum do ambulatório, não Covid-19.

    Se a gestante respondeu SIM a pelo menos uma das perguntas, ou apresentar temperatura ≥37,5ºC: será considerada suspeita e, usando máscara conforme o protocolo local, será encaminhada à área de atendimento separada e reservada no estabelecimento de saúde para atendimento de Covid-19.

  • Para prevenção da Covid-19, oriente as gestantes e seus familiares a manter as práticas de higiene, respeitar o distanciamento social e usar máscara em lugares públicos.
  • Profissionais de saúde que atendem gestantes devem estar atentos para o diagnóstico precoce da Covid-19. Frente a essa suspeita, recomenda-se a procura sistemática de sinais de gravidade por meio do uso de quadros ou escores de alerta padronizados.
  • Profissionais e gestores de saúde devem considerar as gestantes e puérperas como grupo de risco para o desenvolvimento de formas graves ou fatais da Covid-19, principalmente a partir do 3º trimestre gestacional e na presença de doenças preexistentes.
  • Para diminuir o risco de exposição, para gestantes de risco habitual está indicado o espaçamento de consultas, substituindo alguns encontros presenciais por atendimento remoto. As gestantes devem receber orientações claras sobre a sequência de consultas e aonde se dirigir em caso de urgência. Gestantes com gravidez de alto risco devem manter as consultas presenciais.
  • Gestantes e puérperas com sintomas leves, sem sinais de gravidade ou que são contactantes assintomáticas, devem permanecer em isolamento. Elas permanecerão sob cuidados da Unidade Básica de Saúde ou de maternidade de baixo risco. Os gestores dessas unidades devem criar estratégias de acompanhamento remoto a cada 24-48h, até o 10º dia do início dos sintomas, além de orientar as mulheres e familiares quanto aos sinais de gravidade.

Para o diagnóstico e vigilância oportunos e à prevenção da mortalidade materna por Covid-19, o RT-qPCR para detecção do SARS-CoV-2 deve ser solicitado:

  • a toda gestante ou puérpera que apresente sintomas gripais
  • a toda gestante assintomática, em caso de internação para assistência obstétrica (parto, aborto, gravidez ectópica), para cuidado de doença clínica ou obstétrica, para tratamento cirúrgico - em caso de internações eletivas, recomenda-se colher o RT-qPCR 3 dias antes e nos locais em que houver demora do resultado, recomenda-se colher com 37-38 semanas de gravidez.

Gestantes e puérperas com formas moderadas ou graves de Covid-19 atendidas em unidades sem UTI deverão ter transferência oportuna para centros com esse recurso na vigência de baixa saturação de O2 apesar da oferta de O2 por cateter nasal. Veja recomendações para transferência hospitalar aqui.

Se você precisar remover alguma de nós para outra unidade de atendimento, fique atento às recomendações para transferência hospitalar

Em razão da possibilidade de rápido agravo dessas pacientes, a transferência deve considerar:

  • Tempo de translado
  • Como é a estrada/trajeto (pode ser fluvial)
  • Tipo de veículo
  • Quantidade de oxigênio disponível
  • Recursos humanos e materiais

No veículo de transporte, é recomendável a presença de um profissional habilitado e material de ventilatório para garantir oxigenação, caso necessário.

É necessário que o encaminhamento seja acompanhado da história detalhada da gestante/puérpera, preferencialmente com o cartão de pré-natal, e que ocorra comunicação efetiva da equipe com a gestante e com o/a acompanhante, informando sobre a necessidade da transferência e sobre o quadro clínico.

Para saber mais sobre Assistência pré-natal em época de pandemia pela Covid-19, assista a videoaula:

Vacinação em gestantes

Nenhuma das vacinas atualmente disponíveis foi submetida a ensaios clínicos específicos em mulheres grávidas.

O Ministério da Saúde recomenda a vacinação de todas as gestantes conforme Nota Técnica nº 36/2021 – SECOVID/GAB/SECOVID/MS.

As orientações sobre vacinação vêm sendo atualizadas pelo Ministério da Saúde. Consulte as notas técnicas mais atualizadas sobre o assunto no Portal de Boas Práticas em Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente do IFF/Fiocruz

Diagnóstico e manifestações clínicas

O diagnóstico de Covid-19 pode ser feito com base nos sintomas e na exposição conhecida, ou simplesmente de um teste positivo para SARS-CoV-2, mesmo na ausência de quaisquer sintomas. Covid-19 pode, portanto, ser sintomático ou assintomático.

Para o diagnóstico laboratorial da Covid-19 deve-se considerar a fase clínica da infecção em que a paciente se encontra para definir os exames que apresentam os melhores perfis de desempenho para suporte diagnóstico. Podem ser utilizados testes de biologia molecular e testes sorológicos, usando diferentes métodos laboratoriais.

O espectro de manifestações clínicas observadas em grávidas infectadas pelo SARS-CoV-2 é amplamente variável, indo do estado assintomático a quadros graves e potencialmente fatais.


Mais de dois terços das mulheres grávidas com Covid-19 são assintomáticas: dois estudos apontam 74% e 86% de mulheres grávidas positivas para Covid-19 assintomáticas.


A maioria das mulheres sintomáticas apresenta apenas sintomas leves ou moderados de resfriado/gripe. Os sintomas mais comuns de Covid-19 em mulheres grávidas foram:

  • Tosse: 41%
  • Febre: 40%

Os sintomas menos frequentes foram:

  • Dispneia: 21%
  • Mialgia: 19%
  • Perda de paladar: 14%
  • Diarreia: 8%

Critérios de gravidade e seguimento do cuidado

A identificação precoce da gravidade da doença em gestantes ou puérperas possibilita o início oportuno de medidas adequadas, como tratamento de suporte, encaminhamento e admissão rápidos em leito de enfermaria hospitalar ou unidade de terapia intensiva de acordo com os protocolos institucionais ou nacionais.

Classificação clínica da Covid-19 - sinais e sintomas em gestantes e puérperas


O cuidado pré-natal é de extrema importância na gestação em relação à classificação de risco e demais cuidados de rotina. Neste período de pandemia, é necessário fazer ajustes para que esse cuidado não seja comprometido.


Planejamento do nascimento do bebê

Para gestantes no terceiro trimestre que não estão clinicamente bem, deve-se realizar tratamento individualizado e oferecer avaliação multidisciplinar para decidir se uma cesariana de emergência é indicada, seja para facilitar a ressuscitação materna (incluindo a necessidade de posicionamento pronado) ou devido a preocupações em relação à saúde do feto.

Pronação

O decúbito ventral pode ser uma manobra importante no manejo de paciente com quadro de doença crítica por Covid-19.

Embora não existam estudos avaliando o impacto dessa manobra durante a gestação de mulheres com covid -19, a posição prona se mostrou segura para gestantes e seus fetos em pacientes sem doenças maternas.

A posição prona deve ser indicada em situações em que há dificuldade de manter a oxigenação de gestantes > 95% ou de puérperas > 92%, que estejam entubadas e sedadas.

Para mais orientações sobre Pronação na Gestante com Covid-19, consulte o Manual de Recomendações para Assistência à Gestante e Puérpera frente à Pandemia de Covid-19.​

FLUXO PARA PRONAÇÃO EM GESTANTES

FLUXO PARA PRONAÇÃO EM GESTANTES

Uma vez que a determinação da gravidade do quadro clínico da gestante pode ser desafiadora, recomenda-se que os profissionais de saúde utilizem o Escore de Alerta Precoce, como ferramenta de apoio às orientações terapêuticas. Mulheres com dois ou mais sinais de alerta amarelo ou um ou mais sinais de alerta vermelho, assim como aquelas com síndrome respiratória aguda grave (SRAG), têm risco aumentado de evolução desfavorável e, portanto, merecem cuidado diferenciado.

Escore de alerta Obstétrico Modificado (MEOWS)

Fonte: Ministério da Saúde (2020) - adaptado de (Poon, Yang et al. 2020).

Ações de prevenção do Tromboembolismo Venoso

O tromboembolismo venoso (TEV) engloba a trombose venosa e a embolia pulmonar. A trombose venosa profunda ocorre geralmente em membros inferiores e pode cursar com síndrome pós-trombótica. Além disso, pode evoluir principalmente nas formas proximais com embolia pulmonar. A embolia pulmonar pode ser de difícil diagnóstico na gravidez, pois os sintomas podem facilmente ser confundidos com os da gestação: dispneia e taquicardia. Além disso, a embolia pulmonar na gravidez pode levar à morte materna em um terço dos casos, sendo uma das principais causas de morte materna no mundo. O tratamento anticoagulante e a hospitalização pelo tromboembolismo geram custos muito altos para o sistema de saúde. Assim, a prevenção é sem dúvida a melhor alternativa. As evidências apontam maior risco de eventos tromboembólicos nas gestantes e puérperas com Covid-19.

Recomendações para todas as gestantes:

  • Devem ser orientadas a se manterem hidratadas e ativas.
  • Devem ter uma avaliação de risco para tromboembolismo venoso (TEV) durante a gravidez.

Em caso de Covid-19:

  • Todas as mulheres grávidas admitidas com quadro moderado/grave com Covid-19, confirmado ou suspeito, devem receber heparina de baixo peso molecular (HBPM) profilático, a menos que o nascimento seja esperado dentro de 12 horas ou haja risco significativo de hemorragia.
  • Para mulheres com complicações graves por Covid-19, a dosagem apropriada do regime de HBPM deve ser discutida com uma equipe multidisciplinar.
  • Todas as mulheres grávidas com Covid-19 hospitalizadas devem receber tromboprofilaxia por 10 dias após a alta hospitalar. Uma maior duração deve ser considerada para mulheres com morbidade persistente.
  • Mulheres admitidas com Covid-19, confirmado ou suspeito, dentro de 6 semanas pós-parto, devem receber tromboprofilaxia durante o período de internação e por pelo menos 10 dias após a alta.

Atendimento obstétrico

Gestantes com Covid-19 sintomáticas têm risco duas a três vezes maior de nascimento prematuro, principalmente de nascimento prematuro iatrogênico: estudo inglês aponta que 27% das gestantes com Covid-19 tiveram partos prematuros, sendo que 47% foram iatrogênicos por comprometimento materno e 15% foram iatrogênicos por comprometimento fetal.

O Covid-19 está associado a um aumento da taxa de nascimentos por cesárea: 59% das mulheres tiveram cesarianas, sendo que metade destas foram por comprometimento materno ou fetal. O restante foi por motivos obstétricos (ex.: progresso do trabalho de parto, cesárea anterior) ou solicitação materna. Mesmo assim, o diagnóstico de Covid-19 não constitui, por si só, indicação para cesariana. A determinação do momento e via de parto deverá se basear em aspectos obstétricos, idade gestacional e avaliação individual da gravidade do quadro materno.

Interromper a gestação em mulher com quadro de infecção grave pela Covid-19 é desafiador. O aumento do consumo de oxigênio, a capacidade residual funcional reduzida da gravidez e as alterações inflamatórias predispõem à deterioração rápida do status materno e fetal. Por isso deve-se levar em consideração a idade gestacional e o estado materno e fetal.


Deve-se priorizar a estabilização materna antes da realização do parto.


Caso uma gestante com Covid-19 suspeito ou confirmado procure o pronto atendimento, recomenda-se o manejo, conforme orientações do Manual de Recomendações para a Assistência à Gestante e Puérpera frente à Pandemia de Covid-19

Fonte: Ministério da Saúde (2020).

Se o nascimento de urgência for indicado por motivos fetais, deve-se seguir as indicações obstétricas, desde que a condição materna seja estável. Quando o nascimento prematuro iatrogênico é necessário, recomenda-se a administração de corticóide antenatal para promover a maturação pulmonar fetal e sulfato de magnésio para neuroproteção do feto. No entanto, uma interrupção de gestação de urgência não deve ser postergada para aguardar sua administração. O Ministério da Saúde aponta quais alterações de vitalidade fetal que indicam a realização da interrupção da gestação nos casos de gestantes com Covid-19. Confira:

Parâmetro - Cardiotocografia

  • Bradicardia fetal persistente
  • Taquicardia fetal persistente
  • Presença de desacelerações tardias (conhecidas como DIP II)
  • Desacelerações variáveis de repetição associadas ou não à diminuição da variabilidade

Parâmetro - Volume de Líquido Amniótico (US) - Oligoâmnio caracterizado por:

  • Índice de Líquido Amniótico (ILA) ≤ 5,0, e/ou
  • Maior bolsão < 2 X 2 cm

Parâmetro - Perfil Biofísico Fetal (PBF):

  • PBF ≤ 6

Dopplervelocimetria (quando exame disponível):

  • Diástole zero e idade gestacional > 34 semanas
  • Diástole reversa
  • índice de Pulsatilidade do Ducto Venoso ≥1,0
Deixa eu te contar sobre os efeitos da Covid-19 no Recém-Nascido

Apesar de mais de 100 milhões de infecções Covid-19 confirmadas em todo o mundo, não tem sido observado aumento na incidência de anomalias congênitas, aumento de natimortos ou morte neonatal entre mulheres com Covid-19. Também não há evidências de que a infecção por Covid-19 tenha efeito adverso no feto ou nos resultados neonatais: não houve evidência até o momento de restrição de crescimento fetal como consequência de Covid-19.


Recomenda-se a testagem por PCR para todas as gestantes admitidas para atenção ao parto.


Trabalho de Parto e Parto

Para mulheres assintomáticas com Covid-19, não se recomenda monitoramento fetal contínuo com cardiotocografia apenas devido ao teste positivo. Realize o clampeamento oportuno do cordão umbilical e contato pele a pele.


O monitoramento da frequência cardíaca fetal deve ser considerado de forma individual, levando-se em consideração a idade gestacional e a condição materna


Mulheres com sintomas leves de Covid-19 podem ser incentivadas a permanecer isoladas em casa no início do trabalho de parto (fase latente). Deve-se orientá-las quanto aos sinais e sintomas do parto, bem como sintomas que podem sugerir deterioração relacionada ao Covid-19. Na admissão, deve-se realizar avaliação materna e fetal completa: avaliação da gravidade dos sintomas de Covid-19, avaliação dos sinais vitais, incluindo temperatura, frequência respiratória e saturação de oxigênio, confirmação do início do trabalho de parto e monitorização fetal com cardiotocografia. A reavaliação das condições clínicas deve ocorrer de hora em hora. É necessário minimizar o número profissionais que entram na sala de parto.

Também indica-se:

  • Ofertar oxigenioterapia se saturação < 95%.
  • Oferecer monitoramento fetal contínuo durante o trabalho de parto e parto vaginal.
  • Realizar o clampeamento oportuno do cordão e contato pele a pele.

As mulheres devem ser incentivadas a ter um acompanhante de livre escolha durante o trabalho de parto e parto. Todos os acompanhantes devem ser questionados na admissão sobre sintomas sugestivos de Covid-19 nos últimos 10 dias - veja as perguntas da triagem clínica. Na presença de qualquer um dos sintomas, o acompanhante deve deixar a maternidade imediatamente e isolar-se em casa. Acompanhantes sintomáticos ou em período de isolamento por confirmação de Covid-19 não devem comparecer ao hospital.

Os acompanhantes devem usar máscara facial todo o tempo, serem orientados a permanecer ao lado da mulher e a lavar as mãos com frequência.

Manejo da Deterioração Clínica de Gestantes com Covid-19

Embora a febre possa sugerir Covid-19, não se deve presumir que toda febre seja Covid-19. É preciso realizar triagem completa para descartar a possibilidade de infecção bacteriana.

Quando houver indicação (casos moderados/graves), realizar investigação radiográfica, incluindo radiografia de tórax e tomografia computadorizada (TC) de tórax. A imagem do tórax é essencial para a avaliação e deve ser realizada.

Preciso te explicar sobre a tomografia computadorizada

A tomografia computadorizada (TC) é considerada como padrão ouro de referência para diagnosticar as alterações pulmonares decorrentes da Covid-19, cujos achados radiológicos típicos são representados por opacificações bilaterais e periféricas com a característica predominante de vidro fosco. O exame radiológico simples também pode ajudar no diagnóstico do quadro pulmonar e muitas vezes é o exame disponível no local do atendimento. Tanto para a realização do RX de tórax como para tomografia em gestante, não se deve esquecer os princípios clássicos de radioproteção ao feto, notadamente a proteção do abdômen materno com avental de chumbo.

A realização de testes adicionais para diagnósticos diferenciais, incluindo eletrocardiograma, ecocardiograma e tomografia pulmonar deve ser avaliada. Recomenda-se monitorar os valores absolutos e as tendências dos parâmetros clínicos, incluindo frequência cardíaca, frequência respiratória e saturação de oxigênio.

O diagnóstico de embolia pulmonar ou insuficiência cardíaca deve ser considerado para mulheres que apresentam dor no peito, piora da hipóxia ou frequência respiratória acima de 20 rpm - particularmente se houver um aumento repentino nas necessidades de oxigênio. Esse diagnóstico também deve ser considerado em mulheres cuja falta de ar persiste ou piora após a recuperação esperada da Covid-19.

A possibilidade de lesão miocárdica deve ser considerada, pois os sintomas são semelhantes às complicações respiratórias da Covid-19.


Mulheres jovens e em boa forma podem compensar a deterioração da função respiratória e são capazes de manter a saturação de oxigênio normal até descompensação repentina.


Realizar atendimento de urgência se algum dos seguintes sinais de descompensação for apresentado:

  • Frequência respiratória igual ou maior que 25rpm.
  • Aumento da frequência respiratória apesar da oxigenoterapia.
  • Aumento da necessidade de oxigênio ou fração de oxigênio inspirado (FiO2) acima 35%.
  • Redução no volume urinário.
  • Lesão renal aguda (níveis de creatinina sérica acima de 1,1mg/dl em mulheres sem doença renal.
  • preexistente).
  • Sonolência, mesmo que a saturação de oxigênio esteja normal.

Intervenções recomendadas:

  • A oxigenioterapia deve ser regulada para atingir a saturação de 95–98%.
  • Deve-se ter cuidado com o volume de infusão de fluidos intravenosos: utilizar gráficos de entrada/saída de volumes (Balanço Hídrico) de hora em hora para monitorar o equilíbrio de fluidos. O objetivo é manter o balanço hídrico neutro no trabalho de parto. Quando necessário, infusão em bolus de 250-500 ml deve ser empregada, reavaliando após cada infusão.
  • Não deve haver atraso na administração da terapia que normalmente seria administrada em cuidados de maternidade (por exemplo, antibióticos IV em mulheres com febre e ruptura das membranas prolongada
  • Se houver suspeita clínica de infecção bacteriana ou sepse, antibióticos devem ser iniciados. Se Covid-19 for confirmada, proceda a revisão precoce e racionalização do uso de antibióticos. Atenção: mesmo após a confirmação deve-se permanecer aberto à possibilidade de outra condição coexistente.
  • Todas as mulheres grávidas devem ser avaliadas quanto ao risco de TEV e prescritas tromboprofilaxia, a menos que haja contraindicação.
  • A trombocitopenia (plaquetas menores que 50 × 109/l) pode estar associada a Covid-19 grave. Nestes casos, descontinue aspirina e HBPM e solicite uma consulta de hematologia.
  • O uso de ajudas mecânicas (como compressão pneumática intermitente) deve ser usado se a terapia com HBPM for contraindicada ou devido à trombocitopenia.

Para saber mais sobre Assistência pré-natal em época de pandemia pela Covid-19, assista a videoaula:

Notas sobre uso de medicamentos

  • Oseltamivir

  • Em todos os níveis de atenção, gestantes ou puérperas com síndrome gripal cujos sintomas iniciaram há menos de 48h devem ser medicadas com oseltamivir, mantendo a medicação por 5 dias ou até que a infecção por influenza vírus tenha sido excluída.

  • Antibióticos

  • Devem ser administrados na presença de critérios clínicos e radiológicos de pneumonia bacteriana. Recomenda-se, como possível esquema, uma das associações:

    • Ceftriaxona (2 gramas EV, 1 vez ao dia) + Azitromicina

    • Posologia da azitromicina:

    Endovenosa: 500 mg EV, 1 vez ao dia, por 5 dias

    Oral: 500 mg VO 1 vez ao dia por 5 dias.

    ATENÇÃO: O esquema com amoxicilina + clavulanato de 8/8h + azitromicina pode ser utilizado, porém aumenta exposição da equipe de saúde pelo número de aplicações.

  • Corticoterapia

  • A administração de corticóide deve ser considerada após 7 dias do início dos sintomas, se a paciente mantiver quadro de comprometimento pulmonar importante:

    • Metilprednisolona 0,7 a 1,0 mg/Kg EV de 12/12h por 3 dias, podendo prorrogar por 7 dias se houver resposta satisfatória ao tratamento(melhora clínica e radiológica).

    • Dexametasona 6mg/dia (0,75mg/Kg/dia) por 7 a 10 dias.

    A corticoterapia deve ser considerada por 10 dias ou até a alta (o que ocorrer primeiro), para mulheres com Covid-19 e precisando de suplementação de oxigênio ou suporte ventilatório.

  • Tocilizumabe

  • Para mulheres que atendem aos critérios hipóxia com inflamação sistêmica, o uso de tocilizumabe deve ser considerado. O antagonista do receptor da interleucina-6 (anti-IL6) tocilizumabe demonstrou melhorar os resultados, incluindo a sobrevivência, em pacientes hospitalizados com hipóxia (saturação de oxigênio abaixo de 92% no ar ambiente ou requerendo oxigenoterapia) e evidência de inflamação sistêmica (proteína C reativa igual ou superior a 75 mg/l). Embora os dados para o uso de tocilizumabe na gravidez nesta situação sejam limitados, atualmente não há evidência de que tocilizumabe é teratogênico ou fetotóxico.

  • Anticoagulantes

  • Podem ser administradas heparina não fracionada ou heparina de baixo peso molecular, com posologia de acordo com o peso corporal.

    Heparina profilática: administrada apenas se contagem plaquetária ≥ 50.000/mm3,na ausência de sangramentos e de outras contraindicações ao uso dessa medicação.

    Para mais informação sobre o manejo, exames e tratamento farmacológico da Gestante com Covid-19, consulte o Manual de Recomendações para Assistência à Gestante e Puérpera frente à Pandemia de Covid-19

Cuidado Pós-Natal e Amamentação

Mulheres e seus bebês devem permanecer juntos no período pós-parto, se não exigirem cuidados maternos ou neonatais intensivos. Deve-se oferecer apoio para o contato pele a pele/canguru, se o recém-nascido não exigir cuidados adicionais neste momento.

A infecção por Covid-19 não é um contra-indicação ao aleitamento materno. A amamentação deve ser mantida em mulheres com suspeita ou confirmação de Covid-19, com a utilização de máscara e medidas de higiene, desde que estas assim o desejem e estejam estáveis clinicamente. As normas para evitar o contágio do recém-nascido devem ser mantidas por 10 dias, a partir do início dos sintomas ou da confirmação diagnóstica.


Recomende a amamentação a todas as mulheres e ofereça apoio individualizado, aconselhamento e orientação sobre amamentação.


Para mais informação sobre Aleitamento na puérpera com Covid-19, veja a videoaula:

Quer saber mais sobre o assunto?

O Ministério da Saúde (MS) em parceria com a Organização Pan-Americana de Saúde (Opas) elaborou uma série de videoaulas com o objetivo de orientar profissionais de saúde na boa prática assistencial de gestantes e puérperas, bem como apresentar diretrizes para pacientes obstétricas no contexto da pandemia da Covid-19. Veja a lista completa das aulas no Canal da SAPS, no YouTube

Chegamos ao fim da aula!

Nessa aula você viu:

Os programas de prevenção, diagnóstico e cuidado para os agravos da Covid-19 devem incluir a atenção aos profissionais de saúde que atendem as pacientes. A transparência na divulgação de informações, a garantia de equipamentos de proteção individual adequados e a oferta de cuidado emocional são essenciais para preservar a saúde e bom desempenho dos profissionais. Se você precisar de ajuda, procure os canais de apoio na sua região.

Para acessar atualizações sobre as orientações, recomendamos a contínua leitura do Portal de Boas Práticas em Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente do IFF - https://portaldeboaspraticas.iff.fiocruz.br/