Módulo 1 / Aula 2

Saúde dos povos indígenas

Olá! Essa é a segunda aula do Módulo 1 do curso Covid-19 e a atenção à gestante em comunidades indígenas e tradicionais. Ao final da aula, você vai ser capaz de:

  • Descrever o histórico das ações de saúde direcionadas aos povos indígenas.

  • Descrever a organização do Subsistema de Atenção à Saúde Indígena (SASI-SUS) e o princípio de atenção diferenciada.

  • Identificar os desafios para o SASI-SUS no contexto da pandemia.

Para uma experiência de aprendizagem mais ampla, assista aos vídeos e visite os materiais e links externos que estão disponíveis ao longo do texto. Eu vou sempre te indicar materiais que podem contribuir para o seu aprendizado.

Essa aula é parte do curso Enfrentamento da Covid-19 no contexto dos povos indígenas, do Campus Virtual Fiocruz.

Ações e políticas de saúde direcionadas aos povos indígenas

Desde o processo de colonização, para além das violências os indígenas contaram exclusivamente com seus próprios recursos para enfrentar as doenças que vieram do contato com os brancos. Até o início do século XX, não havia uma preocupação com vida e proteção dos povos indígenas por parte dos governantes.

A primeira iniciativa do governo brasileiro para lidar com a chamada questão indígena foi a criação do Serviço de Proteção ao Índio (SPI), em 1910.

No que se refere à saúde, o SPI começou a realizar algumas ações somente décadas depois de sua criação. Tratava-se de uma atuação incipiente que envolvia apenas ações pontuais de assistência sanitária aos indígenas, a partir de estruturas simplificadas de atenção à saúde.

A iniciativa mais próxima nessa direção resultou da atuação de um médico, Noel Nutels, que conheceu a realidade da saúde indígena com a expedição Roncador-Xingu. Em 1952, Nutels elaborou um plano para a “defesa do índio brasileiro contra a tuberculose”, no qual destacou a importância de serem criadas “barreiras sanitárias” no entorno dos territórios indígenas. Dessa forma, aqueles que ingressassem em terras indígenas seriam submetidos a rigoroso controle de saúde, com ênfase nas doenças contagiosas. Pode-se ver que a estratégia de “barreiras sanitárias” tem um precedente como medida de proteção dos povos indígenas, que está sendo retomada no contexto da pandemia.

Entretanto, o plano de Nutels somente foi posto em ação em 1956, com o nome de Serviço de Unidades Sanitárias Aéreas (SUSA), vinculado administrativamente ao Serviço Nacional de Tuberculose. O trabalho das equipes do SUSA enfatizava o diagnóstico, a prevenção e o tratamento de doenças infecciosas endêmicas. Apesar dos esforços do pequeno grupo de idealistas liderados por Nutels, o SUSA padeceu de dificuldades decorrentes da extensão territorial do país, da insuficiência de recursos e da complexidade da questão da saúde nacional, não conseguindo reverter a gravidade do quadro de saúde da população rural em geral, e da indígena em particular.

Noel Nutels (dir.) e Cláudio Villas Bôas, em viagem por terras indígenas

Fonte: Wikipedia

Quando a Funai substituiu o SPI em 1967, os serviços de saúde foram organizados em torno do conceito que surgiu com o SUSA, o de Equipes Volantes de Saúde (EVS), instaladas em pontos estratégicos do país e vinculadas aos escritórios regionais da Funai. Em tese, cada EVS deveria ser composta por médico, enfermeiro, técnico de laboratório e dentista, e dispor de meios de transporte para levá-la a visitas periódicas a aldeias indígenas sob sua jurisdição.

A formulação da atual política de saúde indígena

A 8ª Conferência Nacional de Saúde, realizada em 1986, foi um evento fundamental para a reformulação da Política Nacional de Saúde, pois aprovou as diretrizes básicas da Reforma Sanitária, implementando o SUS. Essa Conferência foi uma etapa importante do processo denominado Movimento pela Reforma Sanitária Brasileira, iniciado nos anos 1970, e que formulou os princípios e diretrizes da reforma setorial da saúde no Brasil.

Como parte da 8ª CNS, foi realizada em 1986 a 1ª Conferência Nacional de Proteção à Saúde do Índio (CNPSI). Nessa oportunidade, recomendou-se que a saúde indígena fosse coordenada pelo Ministério da Saúde, tendo suas ações operacionalizadas por meio de um subsistema de serviços de saúde vinculado ao SUS.

Algumas recomendações da 1ª CNPSI foram:

  • participação da população indígena na formulação, no planejamento, na execução e na avaliação das ações;
  • respeito e reconhecimento das noções e práticas de saúde dos povos indígenas;
  • no nível local, os serviços devem se fundamentar na estratégia da atenção primária;
  • estímulo à formação de indígenas como profissionais de saúde, em todos os níveis.

Alguns fatos merecem destaque. Acompanhe:

1991

Se anteriormente, as ações de saúde direcionadas aos povos indígenas eram de responsabilidade da FUNAI, pela coordenação da saúde indígena, em 1991, ela foi transferida para a Fundação Nacional de Saúde (FNS/Ministério da Saúde) (Decreto n. 23/1991), iniciando um período de disputas. Nesse contexto, havia certa tensão nas relações entre a Funai e a FNS.

1992

Em 1992, durante a 9ª Conferência Nacional de Saúde, foi aprovado que a organização da atenção à saúde indígena seguiria um modelo diferenciado, a partir de Distritos Sanitários Especiais Indígenas, articulado ao SUS. Nessa época, havia uma preocupação significativa com o discurso municipalista da reforma sanitária e por isso lideranças indígenas e seus apoiadores fizeram uma grande articulação para reforçar que a saúde indígena deveria ter uma estrutura organizada a partir da lógica dos seus territórios, sob a coordenação da gestão federal.

1994

Em 1994, a Funai retomou o controle das ações de saúde indígena (Decreto n. 1.141/1994). Foi estabelecido um impasse entre as duas instituições, o que resultou, no mesmo ano, na atribuição à FNS da responsabilidade pelas ações de prevenção e controle de agravos à saúde, saneamento básico e capacitação de recursos humanos. À Funai couberam as ações de assistência médico-sanitária.

Em 1998, a Procuradoria Geral da República considerou inconstitucional a permanência da coordenação da saúde indígena no Ministério da Justiça, ao qual está vinculada a Funai.

1999

A disputa entre instituições quanto à gestão da saúde indígena só foi superada com a aprovação da chamada Lei Arouca (n. 9.836/1999). A Lei estabeleceu o Subsistema de Atenção à Saúde Indígena (SASI-SUS), acrescentando dispositivos à Lei n 8.080 do SUS, garantindo o direito à saúde da população indígena que vive em território brasileiro. Nesse momento, a Fundação Nacional de Saúde (agora com a sigla Funasa) assumiu a gestão do Subsistema.

2000

A partir de 2000, foram publicadas diversas Portarias governamentais que tiveram por objetivo regulamentar aspectos específicos do funcionamento do atual modelo de atenção à saúde indígena.

Destacamos, em 2002, a aprovação da Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas (PNASPI), que detalha o modelo de atenção do SASI-SUS.

Diretrizes da Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas

A Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas orienta como o SUS deve atender esses povos. Ela leva em consideração suas vulnerabilidades e questões culturais. É importante que você conheça as diretrizes dessa política:

  • Organização dos serviços de atenção à saúde dos povos indígenas na forma de Distritos Sanitários Especiais e Pólos-Base, no nível local, onde a atenção primária e os serviços de referência se situam;
  • Preparação dos recursos humanos para atuação em contexto intercultural;
  • Monitoramento das ações de saúde;
  • Articulação dos sistemas tradicionais indígenas de saúde;
  • Promoção do uso adequado e racional de medicamentos;
  • Promoção de ações específicas em situações especiais;
  • Promoção da ética nas pesquisas e nas ações de saúde envolvendo comunidades indígenas;
  • Promoção de ambientes saudáveis e proteção à saúde indígena;
  • Controle social.

2008

Foi iniciado um processo de reformas visando a gestão do SASI-SUS, que culminou com a criação, em 2010, da Secretaria Especial de Saúde Indígena (SESAI), atual gestor do Subsistema. A SESAI é fruto da importante mobilização indígena, que desde a 1ª Conferência Nacional de Proteção à Saúde do Índio, em 1986, defendia a necessidade de uma secretaria ligada diretamente ao Ministério da Saúde.

2019

Mais recentemente, o Decreto nº 9.795/2019 redefiniu as competências da SESAI. Elas estão descritas no Artigo 40 do Decreto:

  • planejar, coordenar, supervisionar, monitorar e avaliar a implementação da Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas, observados os princípios e as diretrizes do SUS;
  • coordenar o processo de gestão do Subsistema de Atenção à Saúde Indígena para a promoção, a proteção e a recuperação da saúde dos povos indígenas, e a sua integração ao SUS;
  • planejar, coordenar, supervisionar, monitorar e avaliar as ações referentes ao saneamento e às edificações de saúde indígena;
  • orientar o desenvolvimento das ações de atenção integral à saúde indígena e de educação em saúde segundo as peculiaridades, o perfil epidemiológico e a condição sanitária de cada Distrito Sanitário Especial Indígena, em consonância com as políticas e os programas do SUS, às práticas de saúde e às medicinas tradicionais indígenas, e a sua integração com as instâncias assistenciais do SUS na região e nos Municípios que compõem cada Distrito Sanitário Especial Indígena;
  • planejar, coordenar, supervisionar, monitorar e avaliar as ações de atenção integral à saúde no âmbito do Subsistema de Atenção à Saúde Indígena e sua integração com o SUS;
  • promover ações para o fortalecimento da participação social dos povos indígenas no SUS;
  • incentivar a articulação e a integração com os setores governamentais e não governamentais que possuam interface com a atenção à saúde indígena;
  • promover e apoiar o desenvolvimento de estudos e pesquisas em saúde indígena; e
  • identificar, organizar e disseminar conhecimentos referentes à saúde indígena.

Linha do tempo das ações e políticas de saúde direcionadas aos povos indígenas

O Subsistema de Atenção à Saúde Indígena hoje

O Subsistema de Atenção à Saúde Indígena, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SASI-SUS), está na linha de frente na prevenção da transmissão e no cuidado com os doentes afetados pela Covid-19.

O Subsistema é articulado ao SUS, atendendo às seguintes condições:

  • considerar os conceitos de saúde e doença próprios dos povos indígenas e os aspectos intersetoriais de seus determinantes;
  • ser construído coletivamente mediante um processo de planejamento participativo;
  • possuir instâncias de controle social formalizadas em todos os níveis de gestão;
  • articulação com o restante da rede SUS para garantia da integralidade da atenção.

O SASI-SUS atende à população indígena residente em territórios indígenas, numa estrutura de 34 sistemas locais de saúde denominados Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEI).

O que é distrito sanitário?

Distrito sanitário é um modelo de como os serviços de atenção à nossa saúde deve ser organizado. O modelo leva em consideração nosso dinamismo etnocultural e a limitação geográfica, populacional e administrativa que temos.

Modelo assistencial do DSEI

Fonte: Centro Cultural do Ministério da Saúde

Cada DSEI é responsável pela realização de ações de atenção primária à nossa saúde, a partir do trabalho de Equipes Multidisciplinares de Saúde Indígena (EMSI). As Equipes envolvem Agentes Indígenas de Saúde (AIS), Agentes Indígenas de Saneamento (AISAN), médicos, enfermeiros, odontólogos, técnicos de enfermagem e de saúde bucal. A rede de serviço do território do DSEI deve funcionar de forma integrada e hierarquizada, com complexidade crescente e articulada ao restante da rede SUS.

Distribuição dos DSEI

Fonte: Centro Cultural do Ministério da Saúde

Ainda no primeiro ano de implementação do Subsistema, em 2000, foi criado o Sistema de Informação da Atenção à Saúde Indígena (Siasi). O objetivo do Siasi inclui a coleta, o processamento e a análise de informações para o acompanhamento da saúde das comunidades indígenas, registrando óbitos, nascimentos, morbidade, imunização, produção de serviços, recursos humanos e infraestrutura.

Apesar de promissor, os relatórios produzidos pela Funasa e SESAI, a partir do Siasi, permaneceram incapazes de fornecer informações consistentes sobre a situação de saúde dos povos indígenas no Brasil e suas tendências. Por isso, nos últimos anos, diversas análises têm se baseado nos dados do Censo do IBGE de 2010, que também apresentam limitações. Além disso, as restrições ao acesso público do Siasi, desde sua implantação, agravaram o problema da crônica falta de dados e inviabilizaram análises que possam identificar inconsistências e pontos a serem melhorados.

Como funciona a rede do Subsistema

A rede de serviços de um DSEI prevê a existência de postos de saúde nas aldeias e polos-base. Cada polo-base tem responsabilidade sobre um conjunto de aldeias localizadas em sua área de abrangência. Sua equipe, além de prestar assistência à saúde, realiza a capacitação e a supervisão dos agentes indígenas de saúde. As Casas de Saúde Indígena (Casai) também integram a rede de referência do Subsistema, servindo para abrigar tanto os pacientes quanto seus acompanhantes e cuidar deles durante períodos de tratamento em serviços de referência fora das aldeias.

RefleXões sobre a rede de saúde indígena

Meus parentes lá do Pará participaram de um documentário que fala sobre a estruturação e o funcionamento da rede de saúde indígena e traz reflexões sobre a relação com a diferença entre a medicina ocidental e a nossa medicina tradicional. Assista!

Atenção Diferenciada

O SASI-SUS segue os princípios e as diretrizes do SUS, mas possui uma dimensão específica, denominada Atenção Diferenciada, visando destacar a dimensão de atuação intercultural e do pluralismo médico. Langdon ressalta que a atenção diferenciada “é mais bem conceituada não como incorporação de práticas tradicionais aos serviços de saúde primária, e sim como articulação entre estes e as práticas de autoatenção existentes nas comunidades” (2004, p. 42).

O conceito de autoatenção, cunhado pelo antropólogo Eduardo Menédez, refere-se às dimensões do pluralismo médico (familiar, popular e profissional). Destacam-se duas dimensões da autoatenção:

  • num sentido amplo, todo o conjunto de conhecimentos e práticas relacionadas à manutenção da vida e bem-estar;

  • num sentido estrito, o conjunto de representações e práticas de cura e cuidado.

A autoatenção no sentido estrito implica que os indivíduos e seu grupo social, buscando prevenir, curar e/ou aliviar o seu problema de saúde, articulam conhecimentos e práticas sem a intervenção direta de especialistas (sejam eles da forma de atenção biomédica ou tradicional/popular), ainda que essas formas de atenção tenham sido a fonte original dos conhecimentos e práticas. Por exemplo, a automedicação é uma atividade de autoatenção, podendo ser tanto o uso de medicamentos como de plantas medicinais. Outro aspecto fundamental da autoatenção é seu caráter coletivo, ou seja, suas atividades fazem parte de saberes e práticas compartilhados pelas famílias e seus grupos sociais.

Alguns aspectos da atenção diferenciada devem ser considerados pelo SASI-SUS. Toque nos cards para ver mais.

Adequação da organização da atenção

Atenção às especificidades culturais, epidemiológicas e operacionais, com adequação das formas ocidentais convencionais de organização de serviços.

Qualificação para atuação no contexto intercultural

Preparação dos profissionais de saúde para a atuação em contexto intercultural e a articulação com os sistemas tradicionais de saúde indígenas.

Participação da comunidade

Participação dos indígenas na formulação, gestão e execução do SASI-SUS para garantir a adequação e especificidade sociocultural.

Conhecimento e diálogo

Os profissionais que atuam na Saúde Indígena precisam estar preparados para trabalhar com uma cultura diferente, a nossa cultura. Temos práticas de diagnóstico, tratamento e cura distintos. Eles precisam nos conhecer, dialogar com as nossas famílias e com os pagés, rezadores, raizeiros, parteiras e outros membros das nossas comunidades, que são conhecedores da nossa cultura e praticantes de cuidados à saúde. Essas práticas de integração e participação são muito importantes para nosso processo de cuidado e saúde.

Participação e Controle Social do Subsistema

A participação indígena nas políticas públicas está respaldada por diferentes marcos legais. Em termos internacionais, a Convenção 169 da OIT preconiza a obrigação dos Estados em consultar os povos indígenas sobre quaisquer medidas que impactem suas vidas e territórios. Assim, também no contexto da pandemia, os povos indígenas reivindicam sua participação em todas as etapas, desde o planejamento até a execução e avaliação das políticas e ações para enfrentamento da Covid-19.

No âmbito do SUS, a Lei 8.142/1990 dispõe sobre a participação das comunidades na sua gestão, a partir dos Conselhos e Conferências de Saúde, que estruturam o controle social no Brasil.

Em relação à Saúde Indígena, ele funciona assim:

  • O controle social no Subsistema, no âmbito nacional, é viabilizado pelo Conselho Nacional de Saúde, que possui representação indígena e é assessorado pela Comissão Intersetorial de Saúde Indígena (CISI). A Comissão tem função consultiva e é composta por representantes da Funai, da Sesai, de organizações indígenas, da área acadêmica, entre outras entidades.
  • Localmente, o controle social deve ser exercido pelos Conselhos Distritais (CONDISI) e Locais de Saúde Indígena. Os CONDISI têm caráter deliberativo e sua composição é paritária de usuários, prestadores de serviços e trabalhadores da saúde. Suas atribuições são: aprovar o plano distrital, avaliar a execução das ações de saúde e apreciar a prestação de contas dos órgãos executores.
  • Os Conselhos Locais têm caráter consultivo e são compostos unicamente por representantes indígenas que vivem nas áreas de abrangência dos polos base. Eles têm como atribuições avaliar as ações e os serviços de saúde; indicar conselheiros para outras instâncias de controle social e atuar junto aos gestores locais para viabilizar a assistência à saúde.

Em 2006, por meio da Portaria nº 644/GM/MS de 27 de março de 2006, foi instituído o Fórum Permanente de Presidentes dos Conselhos Distritais de Saúde Indígena, no âmbito do Ministério da Saúde. Sua instância é de caráter consultivo, propositivo e analítico e assessorava o órgão gestor do Subsistema de Atenção à Saúde Indígena. O Fórum foi destituído pelo Decreto n. 9.795, de 17 de maio de 2019 e, nesse momento, está em processo de retomada pela Sesai, após pressão do movimento indígena.

Além dessas instâncias, existem também as Conferências de Saúde. Até o momento, ocorreram cinco Conferências Nacionais de Saúde Indígena. A 6ª Conferência estava prevista para 2019, foi adiada para 2020 e, com a pandemia, encontra-se suspensa.

Desafios para o Subsistema de Atenção à Saúde Indígena no contexto da pandemia

Considerando a trajetória e organização do direito à saúde dos povos indígenas e a organização do SASI-SUS, apontamos que, no contexto da pandemia, alguns desafios podem ser identificados, a partir de suas características e limitações:

DESAFIOS:

Considerando as medidas preventivas de enfrentamento da Covid-19, as reuniões de CONDISI e com comunidades foram suspensas. Porém, é fundamental garantir a participação indígena no planejamento, execução e avaliação das ações. Dessa forma, a disponibilização e ampliação do acesso a meios de comunicação é fundamental, assim como criar estratégias alternativas para o envolvimento dos indígenas e suas comunidades.

A retomada do Fórum de Presidentes de Condisi e das discussões de CONDISI são fundamentais para discutir os planos de enfrentamento da Covid-19 e seu monitoramento.

As ações de atenção primária à saúde são executadas no âmbito dos Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEI), mas voltadas para a população indígena residente nas áreas rurais, em aldeias e Terras Indígenas oficializadas pelo governo brasileiro. Dessa forma, ficam fora do cadastro de população assistida pelo SASI-SUS a população indígena que vive em áreas urbanas (por diferentes motivos, tendo ou não uma identidade étnica específica declarada) e boa parcela daquelas que estão em fase de retomada de seus territórios tradicionais.

Essa população não coberta pelo Subsistema de Atenção à Saúde Indígena acessa o SUS de forma similar aos demais segmentos não indígenas da população brasileira. No contexto da pandemia, isso tem sido um agravante para a vulnerabilidade da população indígena urbana. Dessa forma, o movimento indígena tem requerido que o SASI-SUS amplie sua cobertura para as populações em terras e reservas não homologadas e aquelas em área urbana com barreiras no acesso aos serviços do SUS.

Ação de descumprimento de preceito fundamental (ADPF 709) - No contexto da pandemia, com vistas a garantir a assistência à saúde das populações indígenas em terras e reservas não homologadas e em áreas urbanas, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) solicitou, no âmbito da Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental 709, que o Supremo Tribunal Federal (STF) referendasse a extensão das ações do SASI-SUS para essas populações. O Ministro Luís Roberto Barroso, em sua decisão, determinou a extensão imediata da atuação do Subsistema para as populações indígenas em terras ou áreas não demarcadas e para os indígenas em áreas urbanas que encontram barreiras no acesso ao SUS.

O SASI-SUS desenvolve ações de atenção primária à saúde e para o enfrentamento da Covid-19 necessita de apoio diagnóstico e assistencial das redes municipais e estaduais de saúde. Por isso, é fundamental a articulação do SASI-SUS com todos os níveis de atenção e com as Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde, a fim de garantir que os planos emergenciais contemplem a população indígena e as demandas dos DSEI, deixando explícitos os fluxos e as referências para o diagnóstico (como de RT-PCR) e assistência hospitalar em tempo oportuno.

Essa articulação do SASI-SUS e o restante da rede SUS também é estratégica para a produção da informação sobre os impactos da Covid-19 em povos indígenas, sendo fundamental a identificação de cor/raça nas notificações em todos os serviços.

É necessário garantir a qualificação dos trabalhadores, a reorganização das rotinas de trabalho e a estruturação de Unidades de Atenção Primária Indígena (UAPI), visto que o enfrentamento da Covid-19 demanda protocolos, recursos e insumos específicos.

Além disso, deve-se garantir a logística adequada e oportuna dos doentes moderados e graves para centros urbanos. Assim, é possível garantir a melhor assistência e resolutividade da atenção nos territórios indígenas, minimizando as remoções e deslocamentos dos doentes.

Chegamos ao fim da aula!

Nessa aula, você conheceu o histórico das ações de saúde direcionadas aos povos indígenas, a organização do Subsistema de Atenção à Saúde Indígena (SASI-SUS) e o princípio de atenção diferenciada e os desafios para o SASI-SUS no contexto da pandemia.