Módulo 3 | Aula 2 Pessoas em situação de rua
Doenças infecciosas
As pessoas em situação de rua são vulneráveis à exposição e a contraírem várias doenças infecciosas. Isso se deve às dificuldades relacionadas aos modos de vida na rua, que incluem por exemplo:
Dificuldade em manter a higiene pessoal.
Dificuldade em obter alimentação adequada.
Permanência em ambientes lotados e mal ventilados, como nos Centros de Acolhida.
Envolvimento em trabalho sexual.
Uso nocivo do álcool e de outras substâncias psicoativas.
História de vida no sistema prisional.
As pesquisas sobre doenças infecciosas na população em situação de rua têm seu maior foco em hepatite, tuberculose (TB), vírus da imunodeficiência humana (HIV), síndrome da imunodeficiência adquirida (AIDS) e infecções sexualmente transmissíveis (IST). Pouco se estuda sobre micoses endêmicas e hanseníase nas PSR.
O maior impacto das IST na população em situação de rua decorre do contexto social da vida nas ruas, principalmente da não adoção de práticas seguras nas relações sexuais, dificuldade de acessar os serviços de saúde, uso de drogas e discriminação. Considerando suas condições de vida, é importante observar a relação entre as IST e a autoestima, bem como incluir no plano terapêutico a elaboração de um projeto de vida.
Muitas vezes os(as) trabalhadores(as) da saúde não levam em consideração a realidade e os modos de vida na rua ao fazerem suas recomendações e são até rudes quando os(as) usuários(as) não seguem suas orientações. Você precisa ficar atento(a) para não agir dessa forma, pois tais atitudes resultam em afastamento e recusa aos serviços.
Agora, vamos falar sobre algumas pesquisas realizadas. Você sabia que existem pesquisas específicas sobre hepatites virais IST, tuberculose, HIV/Aids com foco nas PSR? A seguir você verá um breve resumo de algumas delas.
Os estudos mostram que a hepatite B é muito mais frequente na PSR, se compararmos à população em geral. 32,5% dos indivíduos que vivem em situação de rua e usam substâncias ou enfrentam problemas de saúde mental testaram positivo para o vírus da hepatite B (HBV). Como a vacinação para a prevenção da Hepatite B é administrada em três doses, as pessoas em situação de rua dificilmente conseguem completar o ciclo vacinal dentro do período exigido de 6 meses (STEIN & NYAMATHI, 2010).
Um estudo canadense concluiu que o risco de infecção pelo vírus da hepatite C era 29 vezes maior na PSR em comparação com a população em geral. Considerando queixas de mal-estar na PSR, indivíduos com hepatite C são mais propensos a apresentar sintomas adversos relacionados à infecção, como sentir dor e desconforto regularmente (61% versus 35%) ou estar tão cansados que não têm energia para andar um quarteirão ou fazer trabalho físico leve (72% versus 48%). Fatores como as condições precárias associadas à vivência da situação de rua, a rigidez dos ambientes hospitalares e a falta de conscientização emergiram como as principais barreiras ao tratamento; e a disponibilidade dos serviços foram considerados facilitadores importantes (Paisi et al., 2022).
A PSR apresenta maiores chances de contrair tuberculose, além de apresentar taxas de comorbidades mais altas que as da população geral. As condições precárias de vida são fatores determinantes para a ocorrência da doença na PSR. Em estudo realizado em Salvador, a TB aparece como a terceira maior causa de adoecimento nesse grupo. Já em uma pesquisa realizada em São Paulo, com base em dados de 2009 a 2013, estimou que o abandono do tratamento entre a PSR chega a 57,3%.
Em um outro estudo descritivo sobre a PSR baseado em dados do Sinan e do CadÚnico foi observado que a alta proporção de abandono do tratamento (39,0%) refletiu em elevados percentuais de reingresso e reincidência da doença (Silva et al., 2021).
Para mais informações veja o curso Manejo da Tuberculose na Atenção Primária à Saúde para População em Situação de Rua.
A vida nas ruas configura-se como uma sinergia de situações de discriminação e violência que aumentam a vulnerabilidade à infecção pelo HIV, assim como em várias outras condições e morbidades observadas neste curso. Ao mesmo tempo, tais condições dificultam o acesso aos serviços de saúde e a guarda da medicação antirretroviral utilizada, impedindo o tratamento adequado nos casos de adoecimento por Aids. Além disso, as PSR apresentam taxa de internação hospitalar 10 vezes maior que a população domiciliada devido às complicações do HIV (Lopes, 2016).
Vale destacar também que alguns estudos realizados constataram que as PSR com HIV/Aids sofreram mais discriminação, em comparação com pessoas de nível socioeconômico mais alto e com moradia. Tal situação pode ocorrer em relação aos demais agravos referidos nesta aula.