Unidade 2

Do Período Getulista à Ditadura Civil Militar​

Aula 4

A emergência de novos problemas
sanitários: as doenças crônicas não transmissíveis na agenda da saúde brasileira

Cartaz educativo para a prevenção do câncer produzido pelo Serviço Nacional de Câncer, nos anos 1940.
Cartaz educativo para a prevenção do câncer produzido pelo Serviço Nacional de Câncer, nos anos 1940.
Fonte: Acervo COC/Fiocruz.

A associação entre saúde e desenvolvimento socioeconômico também foi relevante na consolidação das doenças crônicas não transmissíveis como objetos de preocupação da saúde pública brasileira.

À época chamadas de doenças degenerativas (tanto por resultarem na degeneração lenta do corpo quanto por degenerarem a força de trabalho da nação), essas enfermidades eram consideradas problemas típicos de países mais desenvolvidos.

Essa visão resultava de uma percepção sobre os padrões de adoecimento e envelhecimento das populações que foi nomeado nos anos 1970 de transição epidemiológica.

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A percepção de que o câncer, as doenças cardíacas e a diabetes eram sinais de civilização era tão forte que muitos médicos e políticos chegavam a considerar positivo o aumento da mortalidade por essas doenças.

A lógica era a seguinte: se as pessoas estão morrendo mais por doenças degenerativas, significa que estão vivendo mais, o que é resultado de melhores condições de vida e menores índices de mortalidade por doenças de massa e pestilenciais.

Assim, as doenças crônicas serviam como um “termômetro” do desenvolvimento nacional. Entre elas, o câncer foi a que recebeu maior atenção da saúde pública.

Primeira metade do século XX

Primeira metade do século XX

Na primeira metade do século XX, o câncer era visto como doença de pequena incidência. Para os responsáveis pelas políticas de saúde da época, o controle deveria restringir-se à medicina curativa de base hospitalar e às ações pontuais de propaganda sanitária, que mostravam a importância da detecção e do tratamento precoce

Para a população em geral, o câncer era considerado uma doença das elites, que só atacava os mais ricos. Além disso, era considerado um mal raro e incurável.

Meados do século XX

Meados do século XX

Em meados do século XX, o envelhecimento da população fez com que a doença ganhasse mais evidência, e os avanços da medicina possibilitaram diagnósticos mais exatos de diversos tumores. Por fim, o desenvolvimento da radiologia, da radioterapia e principalmente da cirurgia abriu a possibilidade de cura.

Tudo isso deu maior visibilidade à doença, que vinha ocupar lugar de destaque na nosologia nacional.

Nesse cenário, a doença foi gradativamente configurada como um problema urbano e industrial, sendo o aumento de sua incidência um resultado direto da ampliação das cidades e das fábricas, além das mudanças nos hábitos cotidianos.

Cartaz educativo do Serviço Nacional do Câncer na década de 1940.
Cartaz educativo do Serviço Nacional do Câncer na década de 1940.
Fonte: Acervo Família Kroeff.

No programa para a área da saúde, Juscelino Kubitschek, candidato à presidência em 1955, apontava o câncer como um "novo problema nacional", que seria derrotado pelo "poder da ciência médica".

De acordo com o candidato mineiro, tratava-se de “um novo problema de saúde que não é apenas nosso, mas de todos os países civilizados”.

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Assim, a doença servia de elemento retórico para reposicionar o país, sugerindo que o aumento de sua incidência era resultante da ampliação do grau de desenvolvimento socioeconômico do Brasil. O uso retórico da doença, nesse sentido, ajuda a compreender a maior importância a ela atribuída e sua nova forma de se vincular às representações sobre a sociedade brasileira.