Módulo 3 | Unidade 1 O papel das conferências e suas repercussões no processo delibertivo
O mapeamento das deliberações das conferências de saúde e a construção de um plano de ação
Neste tópico iremos apresentar uma alternativa de mapeamento das deliberações das conferências de saúde, com a identificação do que são e de como se dá o seu processo de construção. Buscaremos, igualmente, abordar: quem são os atores sociais responsáveis por essa construção; em que documento as deliberações estão localizadas; e de que forma essas podem ser sistematizadas no plano de ação da política pública de saúde.
As deliberações das Conferências de Saúde: o que são e onde estão
Você já leu as deliberações das conferências de saúde no Relatório Final? Você já fez parte da sistematização das propostas no Relatório Final de alguma conferência de saúde?
Se sua resposta for sim para uma dessas questões, você conhece muito bem o conteúdo das deliberações e sabe que são fruto da participação popular!
É importante lembrar, como descrito no Módulo 1, que as conferências de saúde vêm sendo realizadas desde 1941, mas até 1980, (1ª a 7ª) conferências de saúde eram compostas por técnicos convidados pelo Ministério da Saúde. Somente a partir da 8ª Conferência (1986) é que a participação popular foi incluída neste espaço, sob forte influência de organismos internacionais no final dos anos 1970 e década de 1980, e com poder deliberativo, que significa que as decisões tomadas no âmbito das conferências deveriam direcionar os planos de ação da política pública de saúde (ARAÚJO; GUIMARÃES, 2021).
A partir da 8ª Conferência Nacional de Saúde (1986) inaugurou-se a participação popular como protagonista no processo de formulação da política de saúde. De lá, saíram o relatório final e comissões, que forneceram os subsídios para a elaboração do texto constitucional e das leis orgânicas da saúde que conformariam o novo sistema de saúde, o nosso SUS. Veja o vídeo do Canal Saúde sobre História das Conferências e faça conosco um passeio pela história recente da participação social na saúde.
Da 9ª a 16ª Conferência, o controle social no Brasil vem aperfeiçoando esse espaço democrático e incrementando os mecanismos de apoio ao processo decisório e àviabilidade da inclusão das deliberações nos planos de ação. Devemos destacar o caráter deliberativo da participação popular nas conferências de saúde, porque esta não é uma realidade em relação a outros sistemas universais de saúde que temos no mundo.
Por exemplo, no Servizio Sanitario Nazionale (SSN) italiano e no National Health Service (NHS) britânico, os Conselhos Consultivos Mistos (CCM) e Conselhos Comunitários de Saúde (CHC), respectivamente, que são os espaços de participação popular no setor da saúde pública, são de caráter consultivo ou de controle. Assim, as decisões tomadas nestes espaços não têm respaldo para fazer valer sua influência no processo decisório da administração pública (SERAPIONI; ORONI, 2006).
No Brasil, o fato de as decisões tomadas nas conferências de saúde terem caráter deliberativo, fortalece as instâncias de controle social e a efetivação destas decisões nos planos de ação. Isso faz com que o planejamento dos sistemas de saúde tenha como fundamento a política pública de saúde elaborada de forma participativa.
A deliberação, como utilizamos aqui no sistema de saúde vigente, significa a busca pela paridade entre a representação de usuários, trabalhadores, gestores e prestadores de serviços de saúde no processo decisório sobre qual direção a política de saúde deve seguir. Pelo princípio da paridade, essa representação envolve 25% dos profissionais da saúde, 25% de gestores e prestadores de serviço de saúde e 50% dos usuários da saúde. A participação social, considerada um dos grandes avanços do SUS, supera o modelo centralizador do governo federal de definição das políticas de saúde que vivenciávamos antes da implementação do SUS (BARRETO; PASSOS, 2011).
Como vimos no módulo 2, o planejamento governamental em saúde deve ocorrer de forma ascendente, ou seja, da esfera municipal para a esfera nacional, e deve contemplar as diretrizes para a formulação da política de saúde estabelecida nas Conferências de Saúde. Da mesma forma, as conferências de saúde ocorrem por meio de um processo ascendente envolvendo as etapas municipais, estaduais e nacional.
Além do processo ascendente descrito, a partir da 15ª CNS, a possibilidade de realização de conferências livres, organizadas pela sociedade civil, para a elaboração de diretrizes para a formulação da política faz parte dos mecanismos de participação social em saúde. No processo de mobilização da 16ª CNS houve a oportunidade de indicar participantes livres, conforme os critérios pré-determinados pela comissão organizadora.
No que se refere ao processo deliberativo em nosso país, cumpre destacar, igualmente, o importante papel das conferências temáticas. Em 1986, impulsionados pela mobilização social e orientadas pelo modelo de cuidado em saúde previsto no SUS, a partir da 8ª CNS, foram realizadas as seguintes Conferências:
1990
Conferência Nacional de Saúde e Direitos da Mulher;
2004
I Conferência Nacional de Proteção à Saúde do Índio;
1990
I Conferência Nacional de Recursos Humanos;
2004
I Conferência Nacional de Saúde dos Trabalhadores.
No ano de 1987 foi realizada a I Conferência Nacional de Saúde Mental. Destacamse, nos anos seguintes, as Conferências voltadas à Segurança Alimentar; Saúde Bucal; Assistência Farmacêutica; Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde; Ciência e Tecnologia e Vigilância em Saúde. Tais conferências temáticas, que têm por objetivo propor diretrizes para a formulação de políticas de saúde específicas, foram a base para a instituição, entre outras, da Política Nacional de Vigilância em Saúde (PNVS), de 2018, e da Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas (PNASPI), de 2002.
Várias dessas conferências temáticas tiveram sequência nos anos posteriores. No âmbito da saúde indígena, no ano de 2022 foi realizada a 6ª Conferência Nacional de Saúde Indígena (6ª CNSI) com o objetivo central de redefinir as diretrizes e efetivar as particularidades étnicas e culturais no modelo de atenção à saúde dos povos indígenas no âmbito da PNASPI. Já em 2023, após a 17ª Conferência Nacional, está prevista a realização da 5ª Conferência Nacional de Saúde Mental (5ª CNSM) que tem como tema A Política de Saúde Mental como Direito: Pela defesa do cuidado em liberdade, rumo a avanços e garantia dos serviços da atenção psicossocial no SUS.
O debate nas conferências temáticas está em consonância com os princípios constitucionais do SUS, como o princípio da universalidade.
Como vimos no Módulo 1, ao se analisar um problema de saúde e observar que a ocorrência desse problema é diferente em grupos e/ou populações distintas em relação às suas condições de vida e de trabalho, pode-se concluir que existem desigualdades sociais relacionadas a essas condições que fazem com que determinados grupos sejam mais vulneráveis ao risco de adoecer que outros grupos.
Para intervir sobre essas desigualdades sociais, é importante definir políticas públicas de longo prazo e intersetoriais que atuem sobre as injustiças sociais que produzem essas desigualdades e, também, definir políticas públicas do setor saúde que sejam direcionadas para as necessidades de saúde específicas desses grupos identificados como mais vulneráveis.
Ao atender de forma específica grupos que têm necessidades e demandas de saúde distintas, efetiva-se o princípio constitucional da equidade.
O controle social, historicamente, convoca esses grupos e/ou populações com necessidades e demandas de saúde específicas para que, coletivamente, sejam construídas as políticas públicas que particularmente atendam a essas necessidades.
Essa convocação é realizada por meio das conferências temáticas de saúde, e as diretrizes e propostas deliberadas devem subsidiar políticas públicas para a promoção da equidade.
Podcast da organização da sociedade civil Politize! (16'12'')
Para a concretização do processo deliberativo, a comissão organizadora do Conselho Nacional de Saúde define, por meio de resoluções, a metodologia para realização das conferências, o tema central e os eixos temáticos, bem como produz um documento orientador de apoio aos debates.
Temos nestes documentos, assuntos – tema central e eixos - que delimitam os elementos da situação de saúde que devem ser analisados, além de um conjunto de informações que podem influenciar no debate dos conferencistas e em seus processos de elaboração das diretrizes e proposições. Conhecer esses documentos pode ser central para a compreensão do conteúdo das deliberações!
O documento orientador de apoio aos debates deve fornecer subsídios sobre o tema central e os eixos temáticos, podendo contextualizar os conferencistas sobre o desenvolvimento histórico e a situação atual de cada um desses assuntos, além de justificar suas escolhas atuais.
A comissão organizadora de cada localidade onde serão realizadas as conferências de saúde, pode ampliar esses subsídios com o levantamento dos mesmos tipos de informação contextualizados ao seu território, para apresentação na plenária inicial.
Vamos, a seguir, detalhar quem são os atores sociais que participam da formulação das deliberações e o seu processamento ao longo das conferências nas suas diferentes etapas.
No nível municipal, os delegados participam da construção das deliberações, para que a construção da política de saúde incorpore as pautas presentes no âmbito local. A metodologia pressupõe que essa construção seja feita nas conferências municipais, em que todas as pessoas sejam delegados, com direito à voz e ao voto.
Durante as conferências municipais, após a votação das deliberações, são eleitas as pessoas delegadas municipais que irão para as conferências estaduais, também com direito à voz e ao voto e, nestas últimas, são eleitas as pessoas delegadas estaduais que irão para a conferência nacional também com direito à voz e ao voto. As conferências livres também podem eleger pessoas delegadas para as respectivas etapas. Dependendo do regimento de cada conferência, as pessoas conselheiras de saúde também participam como delegadas nas respectivas etapas.
As regras para as eleições da delegação são definidas pelo regulamento da conferência, votado na plenária inicial. O quantitativo de pessoas delegadas a serem eleitas nas etapas municipais e estaduais é previamente definido e deve, necessariamente, respeitar as cotas definidas para cada grupo, quais sejam 50% de representantes do segmento de usuários, 25% de representantes de trabalhadores da saúde e 25% para representantes de gestores e prestadores de serviços de saúde.
Nesta etapa municipal, que pode ser precedida de conferências locais e/ou distritais e conferências livres de âmbito municipal, temos as discussões sobre situação de saúde na localidade e deliberação das diretrizes e propostas construídas nas conferências municipais de saúde. Do total de deliberações, as que dizem respeito à governabilidade dos municípios devem compor a política municipal de saúde e as que dizem respeito à governabilidade dos estados e da união devem ser encaminhadas para as conferências estaduais de saúde.
Nas conferências estaduais de saúde, aprecia-se as deliberações construídas nas conferências municipais e nas conferências livres de âmbito estadual, no caso de serem espaços previstos nos seus regimentos, que dizem respeito à governabilidade do âmbito estadual e as que dizem respeito ao âmbito nacional devem ser encaminhadas para as conferências nacionais de saúde.
Na conferência nacional de saúde, são apreciadas as diretrizes e propostas oriundas do processo ascendente a partir das etapas municipal e estadual, além daquelas elaboradas pelo processo horizontal em conferências livres de âmbito nacional, cuja governabilidade está na esfera da política nacional de saúde.
Cada conferência realizada deve ter uma plenária inicial que fornece informações para subsidiar os debates sobre a situação de saúde; os grupos de trabalho, no qual são debatidas e formuladas as deliberações no nível municipal e debatidas e sugeridas alterações no nível estadual e nacional; e a plenária final, na qual devem ser votadas pelos delegados a inclusão da deliberação no nível municipal e a sugestão de alteração nos níveis estadual e nacional.
As deliberações (diretrizes e propostas) são, portanto, construídas nas etapas municipais, e nas etapas estaduais e nacional estas são apreciadas, não podendo ser excluídas nem alteradas. Elas podem ter sua redação aperfeiçoada ou agrupada a outra deliberação, desde que mantido o sentido inicial.
Desta forma, mantém-se a integração interfederativa e o caráter participativo, seguindo um dos princípios constitucionais do SUS: o de descentralização, escutando o nível municipal e local para a organização do sistema de saúde e suas ações e serviços; além de aperfeiçoar o que Faria e Lins (2013) nomeiam de expertise deliberativa, que pode ter no trabalho de síntese a compreensão dos elementos que compõem a complexidade do sistema de saúde no nível analisado.
Agora, vamos exemplificar esse processo deliberativo a partir da 17ª CNS, em suas 3 etapas:
- Etapa Municipal
- Etapa Estadual e do DF
- Etapa Nacional
Além das etapas municipais, estaduais e nacional, ainda há outras formas de participar da 17ª CNS:
Atividades
Preparatórias
As Atividades Preparatórias são eventos coordenados pelo Conselho Nacional de Saúde ou realizados pela sociedade civil e comunicados à Comissão Organizadora da 17ª CNS. Mesmo sem caráter deliberativo, as atividades preparatórias, que antecedem as etapas Municipal, Estadual/Distrito Federal e Nacional, são importantes espaços para ampliar a participação popular nos debates dos temas propostos pela 17ª CNS.
Conferências
Livres
As Conferências Livres poderão ser organizadas pela sociedade civil em âmbito Municipal, Intermunicipal, Regional, Macrorregional, Estadual, Distrital e Nacional, com o objetivo de debater o tema da 17ª CNS ou um ou mais de seus eixos temáticos.
As conferências livres, pela primeira vez, são espaços deliberativos, portanto poderão ter seus relatórios integrados e eleger pessoas delegadas no processo da 17ª CNS (confira os prazos e regras na resolução nº 680/2022 – capítulo IV).
Durante a Conferência ocorrem diversas atividades autogestionadas.
Atividades Autogestionadas
As Atividades Autogestionadas ocorrem durante a etapa nacional. São atividades de caráter não deliberativo e de responsabilidade de organizações e instituições interessadas em promover discussões relacionadas ao tema da 17ª CNS.
- Para conhecer sobre a organização e operacionalização da referida conferência nacional, acesse a Cartilha da 17ª Conferência Nacional de Saúde
- Você pode acessar o Documento Orientador da 17ª Conferência Nacional de Saúde
- Você pode acessar o Regimento da 17ª Conferência Nacional de Saúde
Concluindo esse assunto, para mapearmos as deliberações da nossa localidade, precisamos nos debruçar sobre o relatório final das conferências de saúde. É neste documento que estarão registradas as diretrizes e respectivas propostas sugeridas para a formulação do plano de ação, organizadas de acordo com o tema central e os eixos temáticos pré-definidos pela comissão organizadora instituída pelo Conselho Nacional de Saúde.
É sempre bom lembrar que, conforme o Art. 37, da Lei 8.080/1990, cabe ao Conselho Nacional de Saúde a responsabilidade pelo estabelecimento de diretrizes para a elaboração dos planos de saúde, “em função das características epidemiológicas e da organização dos serviços em cada jurisdição administrativa”. Mas, o que são as diretrizes? Veja um exemplo de diretriz da 16ª CNS e uma proposta para o seu cumprimento.
As diretrizes são formulações que indicam as linhas de atuação que se deve seguir. Devem ser apresentadas de forma objetiva e sucinta e contemplar uma breve contextualização, que visa delimitar a prioridade e/ou estratégia geral a ser adotada.
A seguir, vamos compreender como as deliberações são o direcionamento a ser seguido no processo de planejamento da gestão do SUS da respectiva esfera de gestão, em diálogo constante com outros setores da administração pública.
Os relatórios das conferências como fundamento para o plano de ação
Você já leu os planos de ação do setor saúde da sua localidade e observou se as deliberações das conferências de saúde estão incorporadas?
Quais desafios você considera estarem presentes para a incorporação dessas deliberações nos planos de ação pelas equipes de planejamento da gestão do SUS?
Se você já leu os planos de ação, pode não ter encontrado uma relação direta entre as deliberações das conferências e os planos de ação elaborados pelas equipes de planejamento da gestão do SUS. Esse aparente desencontro pode ter várias razões, e neste subtópico pretendemos discorrer sobre algumas dessas razões.
Após a realização das conferências de saúde, dentre as várias funções que cabem à comissão de relatoria e/ou relato geral, está a de sistematizar as deliberações aprovadas nos grupos de trabalho e na plenária final, e encaminhar estas deliberações consolidadas no tempo adequado para as pessoas delegadas e comissão organizadora da próxima etapa da conferência de saúde.
Um dos aspectos relevantes para a inclusão das deliberações das conferências nos planos de ação é o cronograma de realização da mesma, porque este deve ter conexão com o tempo determinado de produção dos instrumentos de planejamento (RICARDI; SHIMIZU; SANTOS, 2017).
Falaremos mais sobre esses instrumentos no tópico 3, mas já podemos adiantar que o primeiro semestre do 1º ano de governo é repleto de compromissos relacionados a este assunto para o gestor do SUS.
Até 31 de agosto deste 1º ano deve ser encaminhado, à respectiva casa legislativa, um documento com a proposta orçamentária da administração pública para cada setor (incluindo a saúde), que deve contemplar objetivos, ações e metas quantitativas e qualitativas para resolver os problemas relacionados à saúde debatidos nas conferências (RICARDI; SHIMIZU; SANTOS, 2017).
A conexão entre os cronogramas citados acima deve considerar o tempo de realização de todas as etapas das conferências, o tempo de consolidação das deliberações no relatório final, considerando as esferas de gestão do SUS (municipais, estaduais, distrital e nacional) e o tempo das equipes técnicas de planejamento da gestão do SUS para incorporar as deliberações das conferências em seu plano de ação setorial, como pode ser observado no vídeo a seguir:
Aqui entra a transcrição do vídeo
Nas últimas conferências, um estudo observou uma dificuldade das equipes de planejamento da gestão do SUS no processamento de um grande número de deliberações para a incorporação no plano de ação (RICARDI; SHIMIZU; SANTOS, 2017).
Ressalta-se a importância de contemplar as proposições encaminhadas pelas pessoas delegadas nas conferências, porém, é importante considerar que o grande número de deliberações deverá ser sintetizado no momento da redação do plano de ação pelas equipes de planejamento do governo, por isso o ideal é que essa síntese ou priorização das ações mais relevantes para a sociedade, seja feita no momento da conferência, e não no momento da elaboração do plano de ação sem a participação popular (CONASS, 2009).
Além da adequação ao cronograma, temos também a necessidade de uma adequação da linguagem. Tanto as deliberações quanto os planos de ação são redigidos por pessoas com diferentes conhecimentos prévios e entendimento de quais seriam os termos mais adequados para expressar aquilo que se busca representar.
Parte das pessoas delegadas representantes dos segmentos de usuários, trabalhadores, gestores e/ou prestadores de serviços de saúde, podem utilizar termos relacionados ao conhecimento popular, saber informal e/ou relacionados às especificidades regionais das localidades, enquanto as equipes técnicas do planejamento podem utilizar termos especializados e relacionados ao conhecimento técnico e saber formal.
Quando essas mudanças de terminologia ocorrem, é importante se trabalhar a padronização do significado desses termos relacionados, de forma a tornar o plano de ação compreensível para um maior número de pessoas, em especial aos conferencistas que tanto trabalham para fornecer os subsídios para elaboração dos planos de ação.
Outra questão relevante sobre este tema diz respeito aos atores sociais que possuem governabilidade para executar determinadas propostas deliberadas nas conferências de saúde e de como as deliberações podem ser encaminhadas aos atores específicos para incorporação dessas propostas nos planos de ação das instituições a que são vinculados. Os atores sociais que podem intervir nos problemas de saúde são múltiplos.
Como sabemos, o SUS atua na perspectiva do conceito ampliado de saúde, considerando os condicionantes e determinantes sociais e, neste sentido, as propostas levantadas para resolver os problemas de saúde não se restringem apenas ao setor saúde, sendo necessário o diálogo com outros setores da administração pública, e em muitos casos, um arranjo nas relações público-privadas.
Dentro da administração pública, nem todas as deliberações poderão ser incorporadas pelo poder executivo, tendo parte delas relação com o poder judiciário ou legislativo. Para identificar a quem encaminhar as deliberações que estão além da governabilidade do gestor do SUS e que são aprovadas nas conferências no formato de moções, é importante conhecer as competências de cada um dos poderes da administração pública.
A revista Exame fez um vídeo muito interessante para falar sobre as atribuições de cada um dos poderes: executivo, legislativo e judiciário. Essa breve introdução pode nos ajudar a identificar quem são os atores sociais responsáveis por intervir sobre problemas específicos que são levantados nas conferências e para os quais são deliberadas diretrizes e propostas.
Muitas vezes, nas conferências, há uma preocupação na elaboração das deliberações dirigidas ao gestor federal porque o financiamento do SUS ainda se encontra dependente do orçamento federal. No entanto, uma mesma diretriz e respectivas propostas podem ser incorporadas aos planos de ação dos gestores dos 3 entes da federação, adequando às competências de cada um deles.
No Capítulo IV da Lei n.º 8.080, de 19/09/1990, temos discriminadas as atribuições e competências da união, estados, distrito federal e municípios, que podem auxiliar na redação das deliberações vinculadas a cada um dos gestores responsáveis, inclusive sobre a corresponsabilidade no financiamento do SUS. Acompanhe a retrospectiva do financiamento do SUS, desde o seu início, por Santos e Funcia (2021).
Quadro 1: Financiamento do SUS | |
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1988 Constituição |
Previsão de 30% do Orçamento da Seguridade Social para o setor saúde, porém nunca cumprida; Ao longo da década de 1990 buscou-se medidas paliativas (como a criação da CPMF) para conseguir suprir o financiamento do SUS. |
2000 Aprovada Emenda Constitucional nº 29 |
Percentuais mínimos de aplicação de recursos próprios em ações e serviços públicos de saúde (ASPS) para os 3 entes da federação; Estipulado 15% Municípios e 12% estados e para a União foi aprovada a regra da aplicação de recursos próprios do exercício anterior acrescida da variação nominal do Produto Interno Bruto. |
2015 Aprovada Emenda Constitucional nº 86 |
Alterou a regra para a união e assegurou 15% da receita corrente líquida para o do SUS. Essa regra, entretanto, não chegou a entrar em vigor devido a Emenda Constitucional no 95, aprovada em 2016. |
2016 Aprovada Emenda Constitucional nº 95 |
Previsão de vigência de 2018 a 2036, instituiu o teto de gastos. Estabeleceu como regra a união o valor empenhado na saúde no exercício anterior corrigida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo, que é um indicador do IBGE para medir a inflação. |
Os 3 aspectos levantados neste subtópico, quais sejam: o cronograma de realização das conferências e de elaboração dos planos de ação; a linguagem utilizada; e o direcionamento para os atores sociais que de fato têm governabilidade para intervir, são apenas 3 das muitas variáveis que interferem no processo de incorporação das deliberações nos planos de ação.
Vamos ampliar essa discussão com outras variáveis que vocês também consideram relevantes para termos sucesso na incorporação das deliberações nos planos de ação? Faça uma lista de outros aspectos ou situações que você acredita que interferem nesse processo de incorporação e reflita sobre estratégias que podem ser realizadas para facilitar esse processo.
Estas reflexões irão auxiliá-lo, também, no próximo tópico deste módulo para pensarmos juntos em estratégias que podem ser realizadas na construção da viabilidade técnica e/ou política para incorporação das propostas deliberadas nos planos de ação.