Série 4 | Curso 1

Educação Aberta

Aula 3

A Educação Aberta na Fiocruz

Nesta aula você conhecerá a experiência da Fiocruz e suas políticas institucionais com relação à Educação Aberta e também alguns aspectos importantes relacionados aos direitos autorais neste tipo de iniciativa educacional.

Esperamos que ao final desta aula você possa:

  • Entender a relação entre direitos autorais e educação.
  • Compreender melhor a formulação de uma política institucional para Recursos Educacionais Abertos.

Educação Aberta e direitos autorais

Os direitos autorais são parte de um conjunto mais amplo, denominados direitos de propriedade intelectual, que derivam da atividade intelectual nos campos industrial, tecnológico, científico, educacional, literário e artístico.

Regulamentados principalmente pela Lei de Direitos Autorais (Lei 9.610/98), protegem as expressões literárias, artísticas e científicas, tais quais os livros, filmes e músicas. Além disso, no que tange ao acesso, dados e questões relacionadas à Ciência Aberta, esses direitos se aplicam a artigos científicos, bancos de dados e coletâneas.

Além dos direitos autorais, a propriedade intelectual inclui as patentes, marcas empresariais, culturais, topografia de circuitos integrados e conhecimento tradicional, sendo novas possibilidades vislumbradas constantemente.

No caso da educação devemos lembrar o quanto os direitos autorais impactam no que diz respeito ao acesso ao material didático. O custo por aluno, tanto por programas governamentais para escolas públicas, através do Programa Nacional do Livro e do Material Didático (PNLD), quanto por aluno nas escolas particulares. As editoras se inscrevem para participar do PNLD em prazos definidos pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) e divulgados através de edital. Quase 50% de todos os exemplares de livros vendidos em 2016 foram didáticos e, dos mais de 200 milhões de livros didáticos produzidos naquele ano, 147 milhões foram vendidos por meio do PNLD. (BNDES, 2018)

Além da pressão da indústria cultural — que cerceia a divulgação livre de recursos educacionais —, os conteúdos de interesse educacional, apesar de sua grande produção, não encontram facilidade no mercado editorial tradicional. Isso resulta, muitas vezes, no desconhecimento de produtos de qualidade.

Esse antagonismo entre a apropriação privada e social do conhecimento coloca em xeque os atuais mecanismos de regulação dessa produção. Assim, para Albagli, na contracorrente dos novos “cerceamentos” do que é produzido em comum, há uma crise nas relações de propriedade. Na era das redes (CASTELLS, 1996) e do acesso (RIFKIN, 2001), os próprios marcos jurídicos tradicionais de propriedade são postos em xeque (COCCO, 2006 apud ALBAGLI, 2014).

Vídeo 1 - Ciência Aberta - um pouco da história - Sarita Albagli

Fonte: Ciência Aberta Ubatuba

Para falar de direitos autorais na educação, devemos lembrar que essa discussão sobre o uso de Recursos Educacionais Abertos está inserida no movimento de acesso aberto ao conhecimento científico, já tratado na série 1 do Programa de Formação Modular sobre Ciência Aberta, no curso 1 - O que é Ciência Aberta - Aula 2 - Acesso Aberto .

Por acesso aberto entende-se: disponibilizar literatura de caráter científico ou acadêmico na Internet, de forma livre, sem quaisquer barreiras ao acesso (custos, registro/login etc.), sendo desejável nenhuma ou poucas limitações à reutilização. Ou seja, a literatura de acesso aberto é gratuita e sem a maioria das restrições associadas ao copyright/direitos autorais (patrimoniais) e licenciamento.

A primeira definição de acesso aberto foi estabelecida numa reunião, em 2001, em Budapeste, que esteve na origem da Declaração da Iniciativa de Budapeste pelo Acesso Aberto ( Budapest Open Access Initiative ), também conhecida por BOAI.

Os direitos autorais formam um dos ramos da propriedade intelectual. Em razão desses direitos, o titular de uma obra autoral protegida pode usá-la como desejar e impedir terceiros de utilizá-la sem sua autorização. Em geral, a legislação nacional concede “direitos exclusivos” ao titular dos direitos de autor sobre uma obra protegida. Isso porque o titular tem permissão para autorizar terceiros a usar a obra. Ressalvam-se os direitos e interesses reconhecidos legalmente a esses terceiros, ou em virtude do interesse público, o que impõe limitações a todos os direitos.

Saiba mais

Para se aprofundar neste assunto, acesse o conteúdo da aula sobre Propriedade Intelectual (Série 2 – Curso 1) deste programa sobre Ciência Aberta.

Políticas de acesso ao conhecimento

Uma das características da Educação Aberta é a possibilidade de criar, usar e compartilhar recursos sem impedimentos legais. No caso de Recursos Educacionais Abertos (REA) tem sido comum a utilização de uma iniciativa em particular, ligada a uma organização não-governamental, denominada Creative Commons (Bens Criativos Compartilhados por Todos), criada oficialmente em 2001. Seu objetivo é promover o desenvolvimento de conteúdos culturais abertos. Existe uma enorme variedade de tipos de licença. Para que um recurso educacional seja de fato considerado aberto, é necessário que seja possível adaptá-lo a realidades locais, contextos institucionais e possa ser reutilizado. Esse tema será tratado na Aula 3 do curso REA: Como usar, remixar um REA.

Nessa nova ordem, os países em desenvolvimento travam uma nova luta: protecionismo intelectual. “Demonstramos que não há base teórica nem empírica para apoiar o argumento de que uma forte proteção dos direitos privados de propriedade intelectual é necessária para o progresso tecnológico e portanto para o desenvolvimento econômico, particularmente para os países em desenvolvimento. O ‘quem aproveita’ aqui é claro: 97% das patentes do mundo pertencem aos países desenvolvidos.” (CHANG, 2003)

No centro desse debate entre a promoção da Educação Aberta e a proteção por propriedade intelectual, desdobram-se os interesses econômicos de editoras, instituições de ensino particulares, que muitas vezes atingem o ensino público,especialmente o universo da pós-graduação, especialização ou formação profissional continuada.

O papel das novas tecnologias digitais é essencial à ampliação do acesso à educação e sua universalização. Para isso, o uso de Recursos Educacionais Abertos é estratégico.

É consenso que a educação ocupa papel central no desenvolvimento social e que, portanto, deve ser uma prioridade. Neste sentido, o estímulo ao conhecimento científico deve ser ampliado, daí, a grande importância do acesso aberto e da Educação Aberta.

No entanto, muitas são as dificuldades para garantir educação de qualidade, pública e de acesso universal no Brasil, sendo uma delas as restrições de acesso a Recursos Educacionais Abertos e de qualidade.

Como vimos, a criação, o uso e o compartilhamento de recursos estão na base da Educação Aberta. Para isso, licenças ou termos de cessão, como as licenças Creative Commons têm sido bastante utilizadas. Isso porque oferecem a todas as pessoas e organizações do mundo uma forma gratuita, simples e padronizada de conceder permissões de direitos autorais para trabalhos criativos e acadêmicos, de garantir atribuição adequada e de permitir que outras pessoas copiem, distribuam e façam uso dessas obras.

As licenças e termos de cessão serão tratados ainda nesta série, ao abordarmos Recursos Educacionais Abertos (Curso 2 – Aula 3).

Ensino remoto e direitos autorais no contexto da Covid-19

Como manter ou retomar o dinamismo das atividades educacionais face às incertezas relacionadas à evolução e duração da pandemia? Quais as condições necessárias para desenvolver atividades educacionais, considerando a gravidade da situação, sem acentuar as desigualdades sociais? Quais seriam os parâmetros para orientar as atividades educacionais na fase de convivência com a Covid-19?

Em 16 de junho, o MEC publicou a Portaria 544/2020, admitindo, em caráter excepcional, a substituição das disciplinas presenciais, em cursos regularmente autorizados, por atividades letivas que utilizem recursos educacionais digitais, tecnologias de informação e comunicação ou outros meios convencionais.

A partir da Portaria do MEC, várias instituições de ensino e universidades fizeram planos para regular o ensino remoto emergencial. O texto das Orientações para a Educação Remota Emergencial na Fiocruz foi aprovado em 23 de julho, e apresenta diretrizes gerais para todas as unidades da instituição.

O documento define educação remota emergencial como uma alteração temporária da forma de oferta das atividades educacionais, devido a circunstâncias de crise. Tal modalidade envolve o uso de soluções remotas para processos educativos que, normalmente, seriam oferecidos de forma presencial.

As orientações estão resumidas em nove artigos que abordam questões sobre o processo de implantação, acompanhamento e manutenção da educação remota emergencial na Fiocruz, incluindo temas como:

  • Aplicabilidade das novas normas.
  • Análise de viabilidade de adaptação de cursos, disciplinas e módulos para a educação remota emergencial.
  • Planejamento acadêmico com envolvimento dos corpos docente e discente.
  • Critérios e parâmetros orientadores do processo de conversão de disciplinas presenciais para a educação remota emergencial.
  • Estratégias de apoio aos docentes.
  • Apoio aos discentes com vistas a garantir boas condições para o acompanhamento das atividades de ensino e continuidade dos itinerários de formação
  • entre outros aspectos.
Uma professora, dando aula on-line de trigonometria, exibe para a câmera do notebook um desenho de um triângulo escaleno.

Fonte: Freepik

A nova realidade traz, igualmente, novos desafios e formas de exercer a docência, construir a aula, nos relacionarmos com outros profissionais e alunos, e muitas dúvidas sobre o que seria legal neste processo. Afinal, é um tema que ainda está sendo mapeado e formulado por especialistas. Em julho de 2020, foi lançado o Guia Direito Autoral e Educação Aberta e a Distância: Perguntas e Respostas, que trata das questões aqui levantadas sobre direitos autorais na educação e ajuda a esclarecer algumas perguntas:

  • As normas de direitos autorais que valem para o ensino presencial também se aplicam ao ensino on-line?
  • Que tipos de materiais os docentes podem usar no decurso de suas aulas?
  • Posso utilizar vídeos hospedados em plataformas em minhas aulas?
  • Posso usar material preexistente de terceiros na produção de material educacional novo que produzirei?
  • Preciso solicitar autorização dos estudantes e convidados para gravação e disponibilização das aulas em que eles participam?

Para responder essas e outras dúvidas sobre direitos autorais e educação, consulte o Guia Direito Autoral e Educação Aberta e a Distância: Perguntas e Respostas. (Rocha & Amiel, 2020)

Assista agora a aula do Prof. Allan Rocha sobre Ensino on line e direitos autorais:

Vídeo 2 - Ensino online e direito

Fonte: Campus Virtual Fiocruz

Educação Aberta na Fiocruz

Contexto e histórico

Entre os objetivos da República Federativa do Brasil, expressos na Constituição Federal de 1988, está a construção de uma sociedade livre, justa e solidária. Em decorrência desse enunciado, a educação é considerada um direito social fundamental, de grande relevância para a consolidação de um Estado Democrático de Direito.

Como vimos na Aula 1: Educação Aberta: histórico e contexto, a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável mantém a educação inclusiva, equitativa e de qualidade como elemento fundamental, destacando a tecnologia no processo de impulsionar o progresso humano, eliminar o fosso digital e fomentar o desenvolvimento de sociedades do conhecimento.

Com o avanço das tecnologias digitais e de computação e o surgimento de novos meios de comunicação (principalmente a Internet), outros modelos emergem e impõem mudanças na lógica de produção de cultura, informação e conhecimento dominantes. Isso não significa que o modelo proprietário e comercial tenha sido superado ou desaparecido. Ao contrário, os meios de comunicação de massa e a indústria cultural tradicional seguem fortes e concentram um grande poder. No entanto, a hegemonia deste modelo é cada vez mais questionada pelas novas formas de produção. Esse novo modelo se constrói em grande medida a partir da colaboração e da produção não comercial.

Se a tecnologia digital é um fator que pode contribuir com a melhoria do acesso à educação de qualidade, a forma como criamos e compartilhamos conhecimento hoje torna-se fundamental nesse processo.

O movimento de acesso aberto, ao qual a Fiocruz aderiu em 2014, mostra a importância da difusão da ciência e da produção científica no país e no mundo, e precisa se estender à educação e à comunicação.

Sintonizada com os debates nacionais e internacionais sobre o acesso aberto ao conhecimento, a Fundação lançou seu repositório institucional, chamado de Arca, em abril de 2011. Administrado pelo Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde (Icict/Fiocruz), o Arca reúne e disponibiliza a produção intelectual da instituição, de forma ampla, em consonância com o movimento de acesso aberto à informação científica.

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Em 2014, a Fiocruz instituiu sua Política de Acesso Aberto ao Conhecimento , visando garantir à sociedade o acesso gratuito, público e aberto ao conteúdo integral de toda sua obra intelectual.

No mesmo ano, criou um Grupo de trabalho específico para discutir e propor um conjunto de diretrizes para desenvolvimento e adoção de Recursos Educacionais Abertos. Essas ações visam atender às necessidades de educação permanente dos trabalhadores da saúde, ampliando sua escala e alcance. Em 2016, como parte desta estratégia, a Fiocruz publica suas diretrizes para Recursos Educacionais Abertos.

Veja a seguir os principais marcos da Fiocruz em direção à implantação da Educação Aberta:

2011

Lançamento do Repositório Institucional ARCA

2014

2018

  • Ampliação de cursos EAD e necessidade de criar uma plataforma que cubra todo o ciclo de REA

2019

Lançamento da Plataforma Educare

Diretrizes da Fiocruz

As instituições públicas de ensino produtoras de recursos educacionais desempenham um papel fundamental para garantir a inclusão social por meio de uma Educação Aberta. Ao se engajarem nesta iniciativa, contribuem para maior autonomia de professores e instituições, no que concerne ao atendimento de especificidades individuais e sociais por meio de adaptações e modificações dos materiais educativos gerados e disseminados.

Com o objetivo de orientar e promover a adoção de Recursos Educacionais Abertos por todos os profissionais da Fiocruz que produzam tais recursos, propõem-se algumas diretrizes para sistematizar o processo de produção, disponibilização e divulgação dos diversos tipos de materiais educacionais.

Diretrizes de REA

O desenvolvimento de obras intelectuais que se enquadrem como recursos educacionais deverá atender a padrões técnicos abertos que garantam seu acesso, utilização e ampla distribuição.

Incentivar o desenvolvimento e a adoção de REA, o depósito, a publicação e a disponibilização dos recursos produzidos nas diversas atividades acadêmicas, assegurando o acesso aberto e não oneroso a esses materiais.

Para estimular a produção de Recursos Educacionais Abertos, a instituição promoverá ações de incentivo e fomento junto aos docentes.

O repositório de recursos educacionais deve adotar metadados comuns, de acordo com protocolos da web e abertos que permitam a interoperabilidade entre repositórios e recuperação na rede.

Formar um conselho consultivo e oferecer treinamentos aos Núcleos de Acesso Aberto ao Conhecimento (NAACs) para classificação, identificação e depósito de recursos educacionais.

Vídeo 3 - Política de Acesso Aberto da Fiocruz e REA

Fonte: Campus Virtual Fiocruz

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Plataformas educacionais na Fiocruz

Os Recursos Educacionais Abertos (REA) potencializam-se, portanto, como recursos essenciais para o aprendizado, colaboração e compartilhamento do conhecimento, e principalmente por ofertar oportunidades de aprendizagem de forma ampla e irrestrita, alcançando usuários que não teriam outras formas de acesso.

Ciente da relevância da Educação Aberta, a Fiocruz propõe então a adoção e criação de plataformas que incentivem maior colaboração e compartilhamento de conhecimentos. As plataformas e guias visam reforçar e potencializar o uso de recursos educacionais na instituição, a adoção de padrões abertos na elaboração de seus cursos on line e incentivar o trabalho colaborativo.

Vídeo 4 - EDUCARE - Ecossistema Digital Educacional da Fiocruz

Fonte: Campus Virtual Fiocruz

Outras iniciativas de Educação Aberta no Brasil

No próximo curso, você vai aprender mais sobre Recursos Educacionais Abertos, como criar, compartilhar e entender a importância dos REA na Educação Aberta.

Conclusão

No Brasil, ainda não contamos com uma política governamental de Educação Aberta, nem mesmo com uma Política de Acesso Aberto ao Conhecimento. Ainda assim, o movimento pela Educação Aberta vem ganhando espaço de discussão em diferentes esferas, tanto em universidades e instituições públicas, quanto em organizações não governamentais, movimentos sociais, sociedade civil e governos. Uma de suas maiores forças está na cultura digital e no uso de REA.

A Educação Aberta está diretamente relacionada a práticas que nos ajudam a repensar o conceito de autoria e promovem o protagonismo de professores e alunos, enfatizando a produção colaborativa e o conhecimento compartilhado, construído por distintas pessoas em torno de interesses comuns.

Viabilizar a construção de uma Educação Aberta pressupõe o engajamento e o diálogo entre Estado, setor privado e sociedade civil, e fomentar um movimento de partilha de conhecimento. Portanto, não se trata simplesmente de pensar em tecnologias e sistemas, mas de uma perspectiva ética sobre o trabalho educacional..

(Furtado; Amiel, 2019)

É de suma importância o engajamento de professores e alunos no Movimento de Educação Aberta, ajudando a divulgar práticas abertas de aprendizagem e que instituições, escolas e universidades comecem a discutir planos e políticas internas que sejam apropriados pelos conceitos e diretrizes da Educação Aberta, garantindo maior acesso ao ensino gratuito, aberto e de qualidade.

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