Módulo 1

Introdução​

Aula 2

Conceito de Emergência em Saúde Pública

1992

Buscando traduzir todo esse processo e situações, o Institute of Medicine (IOM), dos Estados Unidos, utilizou o conceito de doença infecciosa emergente como:

“Doença de origem infecciosa cuja incidência em humanos tem aumentado nas últimas duas décadas ou ameaça aumentar no futuro próximo.”

Porém este conceito tinha alguns limites:

  • Tempo artificialmente estabelecido (duas décadas);
  • Ausência de território definido;
  • Desconsideração da tendência histórica da doença.

2003

O conceito de doença infecciosa é atualizado pelo IOM como:

“Uma doença infecciosa clinicamente distinta, que tenha sido recentemente reconhecida, ou uma doença infecciosa conhecida cuja incidência esteja aumentando em um dado lugar ou entre uma população específica.”

Carmo et al (2008) dizem que ainda que essa atualização torne o conceito mais preciso do ponto de vista espacial, persiste a imprecisão de que parâmetro de magnitude de incidência deva ser considerado para definir uma doença infecciosa como emergente.

Os autores afirmam ainda que a caracterização de uma doença infecciosa como emergente para ser mais precisa requer uma análise da ocorrência para cada doença de forma contextualizada para cada população, território e tempo histórico, nos quais as doenças incidem. Dessa forma, uma melhor utilização desse conceito deve considerar se a doença infecciosa e o seu surgimento ou o aumento na sua incidência têm relevância epidemiológica para uma população e território definido.

Carmo (2020) afirma que o termo emergência em saúde pública já constava em ato normativo do governo dos Estados Unidos em 1984. Inicialmente, a utilização do termo era predominantemente para as doenças transmissíveis. Porém, com a ocorrência de determinadas situações de emergência, como uso intencional de armas biológicas (liberação de bacilo de Antraz em 2001), com o ataque terrorista de setembro de 2001 e com a ocorrência de desastres de grandes proporções como o furacão Katrina, o termo passou a ser aplicado cada vez mais para caracterização de eventos de outra natureza. Desta maneira, para além de doenças infecciosas (reemergente e emergente) (Carmo et al, 2008 e Carmo, 2020).

Regulamento Sanitário Internacional (RSI) e Emergência em Saúde Pública de Importância Internacional (ESPII)

Regulamento Sanitário Internacional é um instrumento jurídico internacional vinculativo para 196 países em todo o mundo, que inclui todos os Estados Membros da Organização Mundial da Saúde (OMS). Tem como objetivo estabelecer medidas para ampliar as capacidades nacionais para detectar e responder aos riscos de disseminação ou propagação (no caso de eventos não infecciosos) de doenças entre os países.

Ainda dentro desta discussão com a aprovação do Regulamento Sanitário Internacional (RSI) pela Assembleia Mundial da Saúde, em 2005, outro conceito foi difundido, o de Emergência em Saúde Pública de importância internacional (OMS):

“Evento extraordinário, o qual é determinado, como estabelecido neste regulamento: - por constituir um risco de saúde pública para outro Estado por meio da propagação internacional de doenças; - por potencialmente requerer uma resposta internacional coordenada.”

Ainda, segundo as definições do RSI:

“Evento significa a manifestação de uma doença ou uma ocorrência que cria um potencial para doença” (OMS, 2005).

Atenção

Desta maneira, os eventos não estão restritos às doenças infecciosas e não limitam à ocorrência de dano (caso ou óbito por determinada doença), mas incluem situações e fatores de risco para sua ocorrência (que é a própria definição de evento de saúde pública). Assim, a análise desses eventos favorece a definição e adoção de medidas de forma mais oportuna, antes que o dano à saúde da população se torne mais amplo e grave. Também não são restritos à ocorrência de doenças transmissíveis, mas contemplam ainda problemas de saúde de natureza química, radionuclear ou decorrentes de desastres ambientais, como terremotos, inundações ou secas (OMS, 2005; Carmo et al, 2008 e Carmo, 2020; Carmo e Teixeira, 2020).

Os mesmos autores ressaltam que a utilização e a adaptação do conceito de emergência em saúde pública tornaram mais precisa e aplicável pelos sistemas nacionais de vigilância epidemiológica a definição de eventos que deveriam ser objeto de monitoramento, proposição e execução de ações que visassem evitar ou diminuir a probabilidade de disseminação ou propagação de doenças. Ademais, ao tratar de riscos, permite a adoção de medidas antecipatórias, com o potencial de evitar ou reduzir a ocorrência de dano à saúde população (Carmo et al, 2008).

Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional (ESPIN)

No Brasil, o conceito de Emergência em Saúde Pública de importância nacional é derivado do que foi adotado no RSI, em 2005, e utilizado pelo Ministério da Saúde (MS) como:

“Evento que apresente risco de propagação ou disseminação de doenças para mais de uma Unidade Federada (Estado ou Distrito Federal), com priorização das doenças de notificação imediata e outros eventos de saúde pública (independentemente da natureza ou origem), depois de avaliação de risco, e que possa necessitar de resposta nacional imediata”

Agência Nacional de Vigilância Sanitária, 2010

Porém, em 2011, foi publicado Decreto Presidencial nº 7.616, por meio do qual foram definidas três situações que poderiam caracterizar uma emergência em saúde pública:
a) epidemiológicas (surtos e epidemias);
b) desastres;
c) desassistência.

A seguir alguns exemplos citados por Freitas et al (2020) que caracterizaram a Emergência em Saúde Pública de importância nacional:
As situações epidemiológicas nesse contexto incluem:

Já os desastres incluem eventos que configurem situação de emergência ou estado de calamidade pública reconhecido pelo Poder Executivo Federal e que impliquem atuação direta na área de saúde pública. Exemplo: desastre da região serrana do estado do Rio de Janeiro, em 2011, com decreto de calamidade pública em sete cidades: Nova Friburgo, Teresópolis, Petrópolis, Bom Jardim, São José do Vale do Rio Preto, Sumidouro e Areal; derramamento de óleo na costa do Nordeste; rompimento de barragem de rejeitos de mineração atingindo Mariana e Brumadinho (MG).

E, pode ser considerada desassistência à população:

Evento que, devidamente reconhecido mediante a decretação de situação de emergência ou calamidade pública pelo ente federado afetado, coloque em risco a saúde dos cidadãos por incapacidade. Exemplo: em 2019, ao tomar posse, o governador do Distrito Federal declarou situação de Emergência em Saúde Pública (ESP) ao se deparar com o desabastecimento do estoque de medicamentos, materiais e insumos da rede de saúde; pendências de pagamentos de fornecedores; suspensão ou interrupção de contratos; déficit de pessoal; e fechamento de diversos leitos em unidades de terapia intensiva (UTIs), inclusive neonatais.

Insuficiência de atendimento à demanda e que extrapolem a capacidade de resposta das direções estadual, distrital e municipal do SUS. Exemplos: em abril de 2019, a dengue levou o estado de Minas Gerais a decretar situação de Emergência em Saúde Pública; Pandemia da COVID-19 em 2020 e 2021, Manaus declara colapso do setor saúde público e privado (falta de leitos, insumos, profissionais).

Tendo como referência Carmo (2020), o conceito de emergência em saúde pública, contexto nacional e internacional, é dirigido para a prática da saúde pública . Isto porque este tem sido utilizado para descrever situações (denominadas de eventos de saúde pública) que constituem ou apresentam risco imediato de produção, disseminação ou agravamento de danos à saúde da população, independentemente da natureza ou origem. Esse termo, quando aplicado, implica na necessidade de adoção de medidas imediatas de saúde pública , envolvendo não somente a atenção, a vigilância em saúde, mas também outras áreas de atuação de acordo com as características do evento que estejam envolvidas no processo de Gestão de Riscos de Emergências em Saúde Pública.