Com a nova legislação, as políticas de formação e habilitação de profissionais de saúde, em todos os níveis, assim como a gestão dos hospitais universitários e de ensino, ficaram sob a responsabilidade do Ministério da Educação e Cultura.
Unidade 3
Da Ditadura Civil Militar à regulamentação do SUS
A consolidação do modelo previdenciário
O sucessor de Médici na Presidência foi o general Ernesto Geisel (1974-1979). Empossado em março de 1974, Geisel herdou um país dividido e em forte ebulição.
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Política
Na política, multiplicavam-se os protestos pela volta da democracia, ao mesmo tempo em que a oposição, articulada em torno do partido político de oposição - o MDB, denunciava as injustiças do modelo de desenvolvimento adotado pelos militares.
Economia
Na economia, os desequilíbrios não eram menores e fatores externos, como a crise do petróleo de 1973, ou internos, como o aumento do déficit público, apontavam para o esgotamento do ciclo expansivo verificado nos anos do “milagre”.
Geisel foi eleito indiretamente pelo Congresso Nacional com o compromisso de restaurar a democracia por meio de uma “distensão lenta, gradual e segura”, de modo que os militares não perdessem o controle do processo. Assim, uma das primeiras medidas tomadas pelo novo governo foi o abrandamento da censura.
A ela, seguiram-se:
- A reforma da Lei de Segurança Nacional, com a revogação do AI-5;
- O restabelecimento do habeas corpus para crimes políticos;
- O fim das cassações;
- A revogação do direito presidencial de fechar o Congresso e de outros poderes discricionários.
Para Escutar
Ouça abaixo o audio selecionado:
Na concepção da sanitarista Sarah Escorel, estudioda do período militar, os ideólogos do regime autoritário pretendiam restaurar as abaladas bases de legitimidade social do regime. Nesse quadro, ter capacidade para produzir respostas ao dramático quadro social brasileiro se apresentava como importante questão política. No que toca especificamente à área da saúde, as ações do governo Geisel estiveram ligadas a duas importantes iniciativas: a criação do Ministério da Previdência e Assistência Social (MPAS) e a instituição do II Plano Nacional de Desenvolvimento (II PND).
Já primeira na reunião de seu gabinete, em junho de 1974, Geisel anunciou a criação do Ministério da Previdência e Assistência Social (MPAS), pasta com maior orçamento dentre todos os ministérios da União.
Outra iniciativa importante foi o lançamento, em fins de 1974, do II Plano Nacional de Desenvolvimento (II PND). Ainda ecoando a euforia desenvolvimentista dos anos do milagre, o plano tinha como meta principal o aprofundamento da política de substituição de importações, a qual, a partir daquele momento, deveria se concentrar na produção de insumos básicos e de bens de capital.
Embora, inicialmente, tenha ajudado a manter o ritmo de crescimento econômico, os efeitos positivos do II PND logo seriam superados pelos reflexos da crise mundial iniciada com a elevação do preço do petróleo em 1973. Ainda assim, o plano teve o mérito de inserir na agenda governamental temas essenciais como saúde, educação e infraestrutura urbana.
Material Complementar
Para saber mais sobre o assunto, assista aos vídeos abaixo que mostram o contexto e o pensamento do período sobre o sistema previdenciário:
- INPS (1974) – Reportagem produzida pela Agência Nacional sobre o Instituto Nacional de Previdência Social - INPS. O vídeo mostra o presidente da instituição, Reinhold Stephanes, e o diretor da Agência Nacional, João Batista da Costa, assinando convênio para campanha de divulgação do sistema previdenciário. (Fonte: Arquivo Nacional. Fundo Agência Nacional. BR_RJANRIO_EH_0_FIL_BHO_077)
- Ministério da Previdência Social (1975) – Documentário que mostra a atuação do Instituto Nacional de Previdência Social no ano de 1975. O parto em maternidade do INPS, o programa de assistência materno-infantil, o programa de reabilitação profissional dos segurados visando seu reemprego e o acompanhamento em sua nova atividade são alguns dos temas retratados no documentário. (Fonte: Arquivo Nacional. Fundo Agência Nacional. BR_RJANRIO_EH_0_FIL_DCT_0055_0001)
No âmbito do Ministério da Saúde, o resultado do II PND propiciou uma maior articulação entre os diversos setores e uma coordenação mais apurada das atividades. A pasta aumentou o repasse de verbas para os estados e passou a priorizar o desenvolvimento de programas verticais dirigidos ao controle de doenças como hanseníase, tuberculose e câncer.
Em 1975, também por iniciativa do governo, foi aprovada a Lei n.º 6.229, que instituiu o Sistema Nacional de Saúde.
À pasta da Saúde ficaram subordinadas as ações de caráter coletivo, entre elas:
- A organização de campanhas de vacinação;
- A fiscalização e o controle sanitários;
- A coordenação da vigilância epidemiológica em todo o país.
Saiba Mais
Ao Ministério da Previdência e Assistência Social, coube a direção dos serviços assistenciais e as ações voltadas para a atenção da saúde individual.
Ao definir nesses termos as atribuições da Saúde e do MPAS, a Lei n.º 6.229 acabou por consolidar a histórica separação entre os campos da saúde pública e da medicina previdenciária no país.
Outra importante dicotomia que a Lei 6.229 também ajudaria a perpetuar é a tradicional falta de coordenação e sintonia verificada no Brasil entre as instituições formadoras de recursos humanos e as reais necessidades do sistema de saúde.
Num documento enviado ao ministro do Planejamento, João Paulo dos Reis Velloso, em janeiro de 1975, o novo ministro da Saúde, Paulo de Almeida Machado, empossado meses antes no cargo, descreveu, nos seguintes termos, a situação sanitária do país e as condições que encontrara ao assumir a pasta:
“Nas grandes cidades, existe uma deterioração crescente da saúde. (...) A mortalidade infantil em São Paulo é hoje mais elevada que em 1962. O Ministério da Saúde, dominando eficazmente as técnicas preventivas para áreas menos desenvolvidas, não se aparelhou para a era industrial. É inegável o despreparo dos órgãos de saúde para enfrentar a problemática dos grandes centros industrializados”.
Para Refletir
A assimetria entre o MPAS e o Ministério da Saúde em números:
Segundo estudo do sanitarista Carlos Gentile de Mello, a verba destinada ao Ministério da Saúde no Orçamento Geral da União chegava a ser 16 vezes menor do que a despesa da Previdência apenas com programas de saúde.
A tabela a seguir apresenta a evolução dos gastos federais com saúde segundo áreas ou programas específicos. Sua análise permite verificar a imensa desproporção entre os gastos da saúde pública e os da atenção médico-hospitalar do sistema previdenciário.
Gastos % Anos de referência | |||||||
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Programas do Governo Federal | 1978 | 1979 | 1980 | 1981 | 1982 | 1983 | 1984 |
Alimentação e nutrição | 2,83 | 3,00 | 3,28 | 3,97 | 4,76 | 5,95 | 5,84 |
Atendimento básico de saúde | 0,87 | 1,46 | 2,14 | 1,87 | 3,06 | 2,89 | 2,36 |
Controle de doenças transmissíveis | 2,91 | 2,81 | 2,12 | 1,76 | 2,21 | 2,93 | 2,72 |
Atenção médico hospitalar | 86,48 | 86,64 | 86,29 | 85,21 | 83,95 | 80,46 | 81,33 |
Produtos profiláticos e terapêuticos | 0,41 | 0,28 | 1,89 | 2,78 | 2,56 | 2,81 | 2,23 |
Outros | 6,52 | 5,81 | 4,28 | 3,42 | 3,46 | 4,94 | 5,49 |
Fonte: Consolidação Plurianual dos Programas de Governo, 1987.
Outro capítulo importante da institucionalização da previdência social no governo Geisel, iniciada com a criação do MPAS em 1974, foi o lançamento, em setembro de 1977, do Sistema Nacional de Previdência e Assistência Social (Sinpas).
Com o Sinpas, a estrutura da previdência brasileira passou a ser organizada em torno de três institutos: o Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social (Inamps), para a assistência médica; o INPS, para a concessão de benefícios previdenciários; e o Instituto de Administração Financeira da Previdência e Assistência Social (Iapas), para o controle financeiro do sistema.