Módulo 3 | Aula 3 Pessoas que usam álcool e outras drogas

Tópico 4

Redução de danos

Há diversos modos de explicar o conceito e as ações de Redução de Danos (RD), mas o debate está de tal forma politizado, no Brasil, que será mais produtivo entender a questão olhando para sua história, que é bastante antiga. Vamos lá?

A politização acerca da RD é hoje um fenômeno praticamente restrito ao Brasil e alguns países islâmicos. Nos EUA, uma longa polêmica se arrastou por décadas, o que incluía o veto à utilização de verbas federais em programas de RD. Mas, após o governo Barack Obama não houve modificação substancial no governo subsequente, de Donald Trump. Outros aspectos das políticas públicas se alteraram de forma substancial entre esses dois governos. É possível concluir que esta não é uma questão que polarize os EUA atualmente, o mesmo se observa na ampla maioria dos países da Europa Ocidental, Canadá e Austrália.

A despeito das mudanças no mundo ao longo dos últimos 100 anos, os conceitos e as ações de RD atuais diferem muito pouco do núcleo conceitual e das políticas propostas pelo famoso Relatório Rolleston, publicado, no Reino Unido, em 1926. As propostas de um século atrás e as atuais guardam tantos pontos em comum, que o prêmio conferido a pessoas ou instituições que atuam em RD é denominado Prêmio Rolleston.

De forma resumida, a proposta formulada por Rolleston e o respectivo Comitê privilegia TODAS as formas capazes de reduzir os danos e riscos associados ao uso prejudicial/dependente de substâncias, sempre de acordo com as características de cada pessoa. Não há distinção entre tratamento, oferecido prioritariamente a todo usuário que dele poderia se beneficiar, e intervenções parciais e de curto prazo, para qualquer indivíduo que, em um dado momento e/ou contexto, não pudesse se beneficiar das alternativas terapêuticas disponíveis.

Embora a terapia de substituição (por exemplo de heroína por metadona) só viesse a ser formalmente estruturada e regulada duas décadas após a publicação do Relatório Rolleston, o Relatório convida os profissionais de saúde a utilizarem todos os esforços para que as pessoas assistidas deixassem de usar heroína por via injetável e optassem por substâncias e vias menos associadas a danos e riscos. Em moldes similares à atual terapia de substituição com metadona, buprenorfina e produtos similares, em uso, hoje, na América do Norte, Europa e países asiáticos.

O foco é sempre pragmático e avesso a preconceitos simplistas, preservando a todo custo a vida das pessoas e adotando soluções integradas, eventualmente escalonadas. Outro aspecto central é a integração entre clínica e saúde pública, ou seja, da questão que afeta usuários de substâncias, assim como suas famílias e comunidades.

Material complementar

Recentemente houve uma experiência extremamente bem-sucedida em Portugal, no sentido de reduzir a criminalidade, evitar a disseminação do HIV e das hepatites virais e ampliar o tratamento das pessoas, a partir da implementação de uma política integrada de enfrentamento da questão. Há inúmeras fontes, mas indicamos o relatório elaborado com base nas principais estatísticas portuguesas disponíveis no site do SICAD (Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências).

Em resumo, mesmo depois de um século, é surpreendente, como a despeito de achados científicos tão robustos, nos momentos e contextos mais diversos, os princípios básicos do Relatório Rolleston continuem sendo alvo de controvérsia em algumas sociedades.