Temos quase 750 mil brasileiros encarcerados no Brasil, segundo o boletim do Departamento Penitenciário Nacional- DEPEN (BRASIL, 2019). Esse número aumentou dramaticamente na última década, conforme demonstra o relatório mundial sobre encarceramento no Brasil (figura 1) (WORLD PRISON BRIEF, 2020). Essa população apresenta taxas elevadas de doença crônica e maior prevalência de condições infecciosas e não infecciosas do que a população em geral. Mesmo que a maioria da população carcerária em todo o mundo seja composta de homens adultos jovens, normalmente não considerada vulnerável aos graves efeitos da Covid-19, os fatores relacionados à precariedade da saúde prisional no país colocam essa população em condições de extrema vulnerabilidade à epidemia (SIMPSON; BUTLER, 2020; WORLD PRISON BRIEF, 2020).
Recomenda-se a leitura do artigo a seguir:
Esse ambiente propício à propagação de doenças infecciosas impõe dificuldades adicionais ao manejo da Covid-19 devido à superlotação, à falta de ventilação e ao acesso restrito a materiais de higiene pessoal por uma população com muitos fatores de risco. A atual pandemia vem escancarar os problemas crônicos da saúde no sistema prisional, que tem ambientes suscetíveis à propagação rápida de doenças infecciosas. A manutenção de níveis desproporcionais de doenças respiratórias no ambiente prisional ao longo de anos, como a tuberculose, demonstra a fragilidade de todo um sistema em controlar a disseminação de doenças em sua população.
Pesquisadora da Ensp/Fiocruz e coordenadora do grupo de pesquisa Saúde nas Prisões, Alexandra Sanchés, discute o impacto do Covid-19 entre a população privada de liberdade.
Das pessoas inseridas no sistema prisional, cerca de 500 mil estão cumprindo regimes fechado e provisório (BRASIL, 2019). Até meados de junho de 2020 havia registro de 50 mortes por Covid-19 e mais de 2100 notificações nas diferentes unidades federadas do país.
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Como a Saúde Prisional se insere no SUS?
A saúde nas prisões atualmente segue a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde das Pessoas Privadas de Liberdade no Sistema Prisional (PNAISP), que, embora instituída desde 2014, ainda carece de ampla adesão pelos estados e municípios.
A política visa garantir o acesso das pessoas privadas de liberdade ao cuidado integral no Sistema Único de Saúde (SUS). Está previsto na PNAISP que os serviços de saúde no sistema prisional passem a ser ponto de atenção da Rede de Atenção à Saúde (RAS) do SUS, qualificando também a Atenção Primária no âmbito prisional como porta de entrada do sistema e ordenadora das ações e serviços de saúde pela rede (BRASIL, 2014).
Assim, as pessoas privadas de liberdade devem usufruir dos mesmos padrões de assistência à saúde disponíveis na comunidade, e seus direitos devem ser salvaguardados de acordo com os tratados internacionais. O gerenciamento da crise da Covid-19 e as restrições necessárias impostas não são motivos para minar os direitos das pessoas privadas de liberdade (MONTOYA-BARTHELEMY et al., 2020).
Dentro desse contexto, o desafio é utilizar esse modelo de atenção à saúde prisional para a implementação dos planos de contingência ao avanço do coronavírus nestes locais e continuar garantindo o amplo acesso para as demandas habituais, em um cenário restrito de profissionais da saúde.
Caracterização da população carcerária e da organização do Sistema Prisional
O sistema penitenciário brasileiro conta com 442.349 vagas no total, considerando femininas e masculinas – e possui quase 750 mil pessoas privadas de liberdade. Destes, 96,3% são homens, mais da metade deles na faixa etária de 18 a 29 anos. Cerca de dois terços são negros com baixa escolaridade. O maior percentual de crimes está relacionado a crimes contra o patrimônio e à Lei de drogas (BRASIL, 2019).
Quanto à distribuição por tipo de regime, no Gráfico 1 vemos a que o regime semiaberto e aberto ainda é minoria.