Módulo 1 | Aula 2
Transformação digital em saúde e no SUS
Introdução
A transformação digital está revolucionando a área da saúde, trazendo inovações que otimizam processos e melhoram a eficiência dos serviços, além de transformar a experiência do paciente por meio de cuidados mais personalizados e acessíveis. Tecnologias emergentes, como inteligência artificial, internet das coisas, big data e telemedicina, têm um impacto significativo na prática clínica e na gestão de saúde (WHO, 2021).
No contexto do Sistema Único de Saúde (SUS) no Brasil, a implementação da transformação digital apresenta desafios e oportunidades. Infraestrutura e conectividade em expansão e a necessidade de capacitação de profissionais de saúde são algumas das barreiras existentes, enquanto que os novos processos que se utilizam da tecnologia como ferramenta visam melhorar o acesso aos serviços de saúde, aumentar a eficiência do atendimento e personalizar o cuidado ao paciente (BRASIL, 2020). Refletiremos sobre essas questões, fornecendo uma visão equilibrada das dificuldades e potencialidades envolvidas.
Além de abordar o cenário nacional, iremos examinar as principais políticas e programas de saúde digital no mundo, oferecendo uma perspectiva comparativa e destacando boas práticas que podem ser adaptadas ao contexto brasileiro. Também veremos os marcos legais em saúde digital no Brasil e o Programa SUS Digital, que visa modernizar o sistema de saúde brasileiro por meio da integração de tecnologias digitais (BRASIL, 2024a).
Vamos começar trazendo os princípios fundamentais da transformação digital em saúde, partindo de sua definição e conceitos.
A transformação digital em saúde representa uma mudança na forma como os serviços de saúde são prestados e gerenciados.
As tecnologias digitais têm o potencial de ampliar o acesso aos sistemas de saúde, mas as populações mais vulneráveis em termos de saúde frequentemente apresentam os menores níveis de conectividade e inclusão digital. Assim, há uma necessidade urgente de transformação digital no setor da saúde e que seja orientada para garantir acesso equitativo a todas as populações, especialmente aquelas em situação de vulnerabilidade. Uma abordagem desigual à transformação digital pode ser contraproducente, agravando ainda mais as desvantagens enfrentadas por estas populações (OPAS, 2021b).
A transformação digital em saúde pode ser definida como o processo de integração de tecnologias digitais em todas as áreas da saúde, com o objetivo de melhorar a qualidade, a eficiência e a acessibilidade dos cuidados de saúde (WHO, 2021). Este processo envolve a digitalização de dados de saúde, a automação de processos administrativos e clínicos, e o uso de ferramentas analíticas avançadas para apoiar a tomada de decisões. A transformação digital vai além da simples adoção de novas tecnologias; ela requer mudanças estruturais e culturais dentro das organizações de saúde para maximizar o potencial dessas tecnologias (BRASIL, 2020).
Em 2021, a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) desenvolveu um conjunto de oito princípios orientadores para a transformação digital do setor da saúde, visando apoiar os países da Região das Américas no processo de digitalização dos serviços de saúde. Clique nos ícones da figura abaixo para conhecer esses princípios:
pan_tool_alt Clique nos botões para visualizar as informações.
Os oito princípios orientadores da transformação digital do setor da saúde
Assegurar conectividade universal no setor da saúde até 2030. Este princípio enfatiza a necessidade de garantir que todas as regiões, incluindo áreas remotas e vulneráveis, tenham acesso a uma infraestrutura digital robusta.
Cocriar produtos de saúde pública digitais para um mundo mais justo. Isso envolve o desenvolvimento de softwares, padrões, algoritmos, dados, aplicativos e conteúdos de código aberto que possam ser escalados e adaptados a diferentes contextos e populações.
Acelerar rumo à saúde digital inclusiva, com ênfase nos mais vulneráveis. Este princípio busca garantir que ninguém seja deixado para trás na era digital, abordando as barreiras de acesso e alfabetização digital.
Implementar sistemas de informação e saúde digitais interoperáveis, abertos e sustentáveis. A interoperabilidade permite a integração e o intercâmbio de dados entre diferentes sistemas de saúde, facilitando a identificação, notificação e análise eficaz de casos de saúde.
Transversalizar os direitos humanos em todas as áreas da transformação digital na saúde. Este princípio assegura que a dignidade humana e os direitos fundamentais sejam protegidos durante a transformação digital.
Participar da cooperação global em inteligência artificial e em qualquer tecnologia emergente. Este princípio promove a colaboração internacional para o desenvolvimento e a adoção de tecnologias de IA garantindo que estas sejam seguras, confiáveis e inclusivas.
Estabelecer mecanismos de confiança e segurança da informação para o ambiente digital de saúde pública. Este princípio enfatiza a importância de adotar normas e padrões internacionais de segurança para proteger os dados de saúde sensíveis, garantindo um equilíbrio entre o acesso à informação e a privacidade dos dados pessoais.
Projetar uma arquitetura de saúde pública para a era da interdependência digital. Este princípio defende a integração das tecnologias digitais nas políticas públicas de saúde de forma transversal, otimizando a governança, o planejamento estratégico e a gestão de recursos.
Estes princípios foram elaborados em resposta à necessidade crescente de incorporar tecnologias digitais na saúde pública de maneira inclusiva e sustentável. Assim, a OPAS enfatiza que os benefícios das tecnologias da informação são um direito de todos e garantem que transformação digital da saúde contribua para a equidade em saúde, abordando as necessidades específicas das populações mais vulneráveis e promovendo uma governança eficaz e sustentável dos sistemas de informação em saúde (OPAS, 2021a).
A transformação digital em saúde está sendo impulsionada por uma série de tecnologias emergentes que têm o potencial de revolucionar a prática clínica e a gestão de saúde. Estas tecnologias estão facilitando diagnósticos mais precisos, tratamentos personalizados, monitoramento contínuo de pacientes e gestão eficiente dos serviços de saúde.
Em 2023, a Organização Mundial da Saúde (OMS) apresentou um relatório intitulado “Tecnologias emergentes e inovações científicas de 2023: uma perspectiva global de saúde pública”. Este documento fornece uma visão abrangente das descobertas globais sobre as tecnologias emergentes e as inovações científicas que têm o potencial de transformar a saúde pública nos próximos anos (WHO, 2023).
No relatório, especialistas da OMS avaliaram mais de 100 projetos de inovações tecnológicas, selecionando aqueles com impacto considerável e potencial de adoção nos próximos cinco a dez anos, com a intenção de fornecer uma base para entender como essas inovações podem ajudar a solucionar os desafios globais de saúde.
A transformação digital na saúde é impulsionada por diversas tecnologias emergentes que estão redefinindo a forma como os cuidados de saúde são prestados, monitorados e gerenciados.
O quadro abaixo apresenta um resumo dos principais tópicos relacionados às inovações tecnológicas em saúde digital. Essas tecnologias não apenas melhoram a precisão e a eficiência dos diagnósticos e tratamentos, mas também promovem uma maior colaboração entre profissionais de saúde e pacientes, ampliando o acesso e a qualidade dos serviços de saúde em todo o mundo.
Quadro 1: Descrição das principais tecnologias emergentes em Saúde Digital. | ||
---|---|---|
Tópico | Descrição | |
Diagnóstico e Monitoramento | Uso de materiais inteligentes e dispositivos vestíveis para monitoramento contínuo e adaptativo de sinais vitais, permitindo intervenções em tempo real e cuidados de saúde personalizados. | |
Inteligência Artificial (IA) | Aplicações de IA em diagnósticos a partir de bancos de dados de imagens médicas, previsão de estruturas de proteínas para desenvolvimento de medicamentos, e sistemas de suporte à decisão para vigilância e promoção da saúde pública. | |
Internet das Coisas (IoT) | A IoT permite a criação de uma rede de dispositivos conectados que monitoram e transmitem dados de saúde em tempo real. Sensores vestíveis, monitores de glicose e dispositivos de rastreamento de atividade são exemplos de tecnologias IoT que melhoram o monitoramento contínuo e o gerenciamento de doenças crônicas. | |
Telessaúde | A telemedicina está ampliando o acesso aos cuidados de saúde, especialmente em áreas rurais e comunidades remotas. Consultas virtuais, monitoramento remoto de pacientes e telessaúde são componentes-chave que permitem aos profissionais de saúde prestar cuidados à distância, reduzindo a necessidade de visitas presenciais. | |
Materiais e Próteses | Desenvolvimento de próteses avançadas e materiais inovadores, como corações artificiais, exoesqueletos, e dispositivos de olfação eletrônica, que melhoram a funcionalidade e a qualidade de vida dos pacientes. | |
Colaboração e Compartilhamento de Dados | Ferramentas digitais de colaboração e compartilhamento de dados que facilitam a cooperação internacional e a troca de informações críticas, acelerando a inovação e a pesquisa em saúde. | |
Saúde Pública e Pesquisa | Utilização de ferramentas digitais para coleta, análise e compartilhamento de dados de saúde pública, bem como modelos inovadores para implementar e avaliar intervenções baseadas em evidências. | |
Inovações para países em desenvolvimento | Desenvolvimento de tecnologias acessíveis e adaptáveis para melhorar os cuidados de saúde em regiões com recursos limitados, assegurando que inovações sejam sustentáveis e equitativas. | |
Sistemas de Alerta e Monitoramento para Infecções Globais | Implementação de sistemas de alerta precoce e monitoramento em tempo real de patógenos usando análises de dados e machine learning, permitindo respostas rápidas e eficazes a surtos de doenças. |
Fonte: Adaptado do relatório da OMS sobre as Tecnologias emergentes e inovações científicas de 2023, (WHO, 2023).
Impacto dessas tecnologias na prática clínica e na gestão de saúde
A implementação de tecnologias emergentes na saúde está transformando profundamente a prática clínica e a gestão de saúde, melhorando diagnósticos, personalizando tratamentos e otimizando a eficiência operacional.

Na prática clínica, materiais inteligentes e dispositivos vestíveis permitem monitoramento contínuo dos sinais vitais, possibilitando intervenções em tempo real e prevenindo complicações. Dispositivos como smartwatches fornecem dados precisos, permitindo ajustes nos tratamentos conforme necessário. A inteligência artificial (IA) está revolucionando diagnósticos ao analisar grandes volumes de dados médicos, identificando padrões impossíveis de detectar manualmente. Ferramentas de IA auxiliam médicos a realizar diagnósticos mais rápidos e precisos e a desenvolver planos de tratamento personalizados (SCHWALBE; WAHL, 2020).
Inovações em materiais e próteses, como corações artificiais e exoesqueletos, oferecem novas possibilidades de reabilitação para pacientes com deficiências ou lesões graves, melhorando a mobilidade e a independência dos pacientes (WHO, 2023).
Na gestão de saúde, ferramentas digitais de colaboração e compartilhamento de dados facilitam a cooperação entre instituições de saúde e promovem inovação contínua. Sistemas de informação integrados melhoram a coordenação do cuidado e reduzem a duplicação de esforços. O uso de big data e machine learning na análise de grandes volumes de dados permite identificar tendências e formular políticas eficazes para enfrentar desafios sanitários (SHCOLNIK, 2023).
Em países de baixa e média renda, tecnologias acessíveis estão reduzindo disparidades em saúde. Plataformas de telemedicina aumentam o acesso a cuidados em regiões remotas, permitindo consultas médicas à distância e monitoramento contínuo promovendo a equidade em saúde (WHO, 2024).
Sistemas de alerta precoce e monitoramento de patógenos melhoram a resposta a surtos de doenças. Ferramentas de vigilância com machine learning detectam surtos precocemente, permitindo intervenções rápidas apoiando a saúde pública global (WHO, 2023).
Essas tecnologias emergentes estão transformando a prática clínica e a gestão de saúde ao promover cuidados mais precisos, personalizados e eficientes, garantindo que inovações tecnológicas sejam acessíveis a todos, independentemente do contexto socioeconômico.