Módulo 3

Preparação e resposta às Emergências em Saúde Pública no Contexto da COVID-19

Aula 3

Cenários de normalidade, contingenciamento e crise sanitária x dimensões de resposta logística

Um aspecto essencial para a compreensão da natureza da resposta logística é o cenário de “esforço” das instituições frente à demanda provocada por uma emergência em saúde, no caso a COVID-19.

Cenário convencional

Exige poucas modificações das estruturas existentes e dos processos adotados pela instituição/sistema de saúde.

Cenário de contingência

Trabalha nitidamente com alterações significativas de estruturas (equipamentos, espaços e força de trabalho), mas ainda com manutenção dos processos adotados com mínimos impactos.

Cenário de crise

Significa que as estruturas existentes e já adaptadas não dão conta da demanda, assim como a força de trabalho e insumos são totalmente insuficientes para o volume de demanda, já fora dos processos adotados institucionalmente.

O estabelecimento de dimensões, como espaços, força de trabalho, suprimentos, atendimentos, objetivo de expansão e abrangência do esforço institucional permite compreender para cada dimensão crítica para resposta à demanda qual o movimento necessário que a organização/sistema de saúde deve realizar.

A tabela abaixo apresenta uma matriz de cenários e dimensões onde é possível visualizar o grau de esforço a ser realizado em cada combinação específica de cenário e dimensão.

MATRIZ DE CENÁRIOS X DIMENSÕES EM EMERGÊNCIAS DE SAÚDE PÚBLICA
CENÁRIOS DIMENSÕES
Espaço Funcionários Suplementos Atendimentos Objetivo de expansão Abrangência
Convencional Espaços usuais Pessoa solicitado conforme necessidade Disponíveis Cuidados usuais x1.2 (20% da capacidade usual) Local
Contingência Áreas de atendimento relacionadas Expansão das equipes Conservação, adaptação e substituição de suprimentos quando seguros Impactos mínimos nas práticas usuais x2 (100% da capacidade usual) Regional / Estadual
Crise A expansão em cada hospital é superada pelo volume de casos, levando ao uso de áreas não tradicionais Quantidade de pessoal insuficiente Escassez Atendimentos intensivos em massa, incompatível com os padrões usuais x3 (200% da capacidade usual) Nacional

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Há um desafio muito significativo que é a construção de uma governança mais colaborativa, integrando governos dos diferentes níveis, hospitais e agencias/organizações não governamentais.

Dessa forma, há oportunidade para criar um espaço técnico-político de planejamento apoiado em importantes stakeholders e que possa beneficiar-se do uso de ferramentas de planejamento e previsão de necessidades em todas as seis dimensões.

Cada dimensão deve ser objeto de planejamento em seu escopo, mas também, como podemos ver nas tabelas abaixo, a adoção de medidas que articulam mais de uma dimensão ou que relacionam uma dimensão com aspectos de natureza epidemiológica.

RECOMENDAÇÕES NO ÂMBITO DAS DIMENSÕES ESPAÇO, FUNCIONÁRIOS E SUPRIMENTOS
DIMENSÕES RECOMENDAÇÕES
Espaço
  • Planejar a capacidade dos hospitais para receberem pacientes COVID-19 (Hich et al., 2014);
  • Identificar e planejar a transformação de ambientes de cirurgia e recuperação pós-anestésica em ambientes de terapia intensiva (Massuda et al., 2020);
  • Implementar medidas para reduzir efeitos que podem ser evitáveis a partir da redução ou falta de pessoal (Einav et al., 2014);
  • Implementar triagens externas às unidades de saúde fim de reduzir/evitar transmissão da COVID-19 (Associação Médica Brasileira, 2020);
  • Criar fluxos de circulação e ambientes de cuidados separados (coortes) para pacientes confirmados Covid-19 e pacientes suspeitos (Massuda et al., 2020).
Funcionários
  • Incluir comitês hospitalares com especialistas em cuidados intensivos no planejamento da capacidade da pandemia (Hick et al., 2014);
  • Disponibilizar equipes de resposta rápida em apoio a estados e municipios (Ministério da Saúde, 2020b);
  • Implementar medidas para reduzir efeitos que podem ser evitáveis a partir da redução ou falta de pessoal (Einav et al., 2014);
  • Treinar equipes hospitalares para que saibam atuar durante a crise (Einav et al., 2014);
  • Designar para o cuidado de pacientes graves e criticos apenas profissionais de saúde com treinamento prévio em cuidados intensivos (Geiling et al., 2014);
  • Utilizar medidas em colaboração com representantes das equipes para lidar com redução de pessoal (Einav et al., 2014);
  • Aplicar a Ferramenta de Suporte ao Planejamento de Crises e o Estimador da Força de Trabalho em Saúde (OMS, 2020a);
  • Realizar atividades de capacitação para os profissionais de saúde voltados ao uso adequado dos EPIs (Grabois, 2020);
  • Reduzir a exposição de pacientes da sindrome gripal após a triagem externa encaminhando-os para áreas especificas a fim de reduzir/evitar a transmissão entre pacientes e profissionais de saúde (Associação Médica Brasileira, 2020);
Suprimentos
  • Receber equipes de consultores especializadas para coordenar e auxiliar as autoridades estaduais e locais no reabastecimento, gerenciamento, distribuição e recuperação de suprimentos médicos de emergência (Wang et al., 2020);
  • Melhorar o sistema global de compras e distribuição de suprimentos de emergência (Wang et al., 2020);
  • Disponibilizar suprimentos necessários para os hospitais responderem a COVID-19 (Organização Mundial da Saúde, 2020c);
  • Monitorar os estoques de suprimentos e recursos para atendimento (Ministério da Saúde, 2020c);
  • Aplicar a Ferramenta de Previsão de Suprimentos Essenciais para cálculo dos suprimentos (OMS, 2020b).

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Dimensão espaço

Na dimensão espaço podemos identificar recomendações relativas ao planejamento dos espaços hospitalares, considerando sua expansão ou redução, assim como o estabelecimento de fluxos e protocolos de utilização destes espaços.

Dimensão força de trabalho

Na dimensão força de trabalho, ou simplesmente “funcionários”, pode-se identificar recomendações voltadas a:

  1. planejamento e estimativas de pessoal;
  2. atividades de capacitação voltadas ao cuidado;
  3. Conhecer o organização de equipes com finalidades específicas, como times de resposta rápida ou de organização das atividades de terapia intensiva;
  4. atividades de capacitação voltadas à biossegurança;
  5. aplicação de ferramentas de planejamento e gestão, entre outras.

Dimensão suprimentos

Na dimensão suprimentos, as recomendações consideram os aspectos relacionados a planejamento de aquisições e controle de estoques; utilização de ferramentas de planejamento e gestão de suprimentos; entre outras.

Na tabela abaixo pode-se identificar, que em relação à dimensão “Atendimentos”, as recomendações orientam os seguintes aspectos:

  1. diagnóstico precoce de quadros clínicos-epidemiológicos compatíveis com a emergência em saúde pública em tela;
  2. planejamento para ampliação ou redução de atendimentos;
  3. Atividades de capacitação para o manejo clínico adequado e para avaliação/identificação de casos clínicos mais graves, entre outras.

Também na mesma Tabela, em relação à dimensão “Objetivos de Expansão” as recomendações dizem respeito ao planejamento da capacidade dos hospitais, assim como de novos espaços assistenciais em locais não originalmente voltados a isso, entre outras.

Já em relação à dimensão “Abrangência” as recomendações estão voltadas à organização de espaços de colaboração e articulação entre diferentes instâncias governamentais, considerando que mais complexo o cenário, maior a necessidade de cooperação e direcionamento por parte de estruturas nacionais e estaduais em relação aos municípios, principalmente os de pequeno e médio porte.

RECOMENDAÇÕES VOLTADAS A ATENDIMENTOS; OBJETIVOS DE EXPANSÃO E ABRANGÊNCIA
DIMENSÕES RECOMENDAÇÕES
Atendimentos
  • Permitir que os pacientes demandando cuidados intensivos por outros diagnósticos que não a COVID-19 recebam igual consideração pelo acesso aos recursos da UTI (Hick et al., 2014);
  • Tomar decisões em conjunto para a expansão e restrição da prestação de serviços (Hick et al., 2014);
  • Estimar as necessidades para que profissionais sejam orientados quanto à reabilitação e cuidados prolongados (Geiling et al., 2014);
  • Utilizar tecnologia como complemento importante para a prestação de serviços (Einav et al., 2014);
  • Organizar respostas assistenciais (Secretária do Estado do Rio de Janeiro, 2020b);
  • Tomar precocemente medidas de identificação, acolhimento e cuidado aos pacientes com sindrome gripal (Secretaria do Estado do Rio de Janeiro, 2020b);
  • Supervisionar e orient médicos com a inclusão de avaliação continua do plano de tratamento (Einav et al., 2014);
  • Reduzir a exposição de pacientes da sindrome gripal após a triagem externa encaminhando-os para áreas específicas a fim de reduzir/evitar a transmissão entre pacientes e profissionais de saúde (Zangrillo et al., 2020; Secretaria do Estado de São Paulo, 2020);
  • Alocar pacientes de acordo com a gravidade clínica, após a triagem e baseados em sinais vitais, exames laboratoriais e fisicos (Zangrillo et al., 2020).
Objetivos de expansão
  • Identificar cenários com diferentes percentuais dentro da sua capacidade sem comprometer sua(s) especialidade(s). (Hick et al., 2014);
  • Estudar como as informações são e devem ser compartilhadas rotineiramente para seu melhor uso (Hick et al., 2014);
  • Planejar a capacidade dos hospitais para receberem pacientes Covid19 (Hich et al., 2014);
  • Planejar a capacidade de criação de novos hospitais em espaços originalmente previstos para essa atividade (estádios, centros de convenção) (Pires, 2020, Zangrillo et al., 2020);
  • Manter comunicação com as organizações internacionais e autoridade de saúde (Ministério da Saúde, 2020b);
  • Estabelecer sistema de cooperação internacional para lidar conjuntamente com as principais emergências (Wang et al., 2020).
Abrangência
  • Estabelecer sistema de cooperação internacional para lidar conjuntamente com as principais emergências (Wang et al., 2020);
  • Utilizar o transporte de remoção de pacientes para transportar ativos como fornecedores e equipamentos especializados (Einav et al., 2014);
  • Empregar ferramentas simples e padronizadas de coleta de dados para atender as necessidades das autoridades locais e facilitar o acompanhamento do atendimento durante o evento (Geiling et al., 2014);
  • Estimar as necessidades para que profissionais sejam orientados quanto à reabilitação e cuidados prolongados (Geiling et al., 2014);
  • Monitorar os estoques de suprimentos e recursos para atendimento (Ministério da Saúde, 2020b).

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