Módulo 1 | Aula 3 Implicações éticas em saúde

Tópico 5

Articulando Direitos Humanos, Ética e Saúde

Os direitos humanos constituem um conjunto de garantias e valores universais que procura garantir a dignidade, definida com um conjunto mínimo de condições de uma vida digna, consensuado pela comunidade internacional. Nesse sentido, um parâmetro ético universal de agir, que deve ser seguido por governos, instituições e indivíduos.

Os direitos humanos transcendem a ideia de direitos legais e decorrem de uma exigência moral, inscrita nas diferentes culturas e sociedades, expressa na máxima do respeito universal a todos os seres humanos, inspirado essencialmente na ética kantiana.

Os princípios e normas dos direitos humanos devem garantir a “satisfação das condições mínimas para a realização de uma vida digna” (Dias, 2016). A dignidade da pessoa humana é, portanto, o valor que fundamenta e orienta os direitos individuais e sociais estabelecidos.

A relação intrínseca entre saúde e direitos humanos sugere que suas violações têm impactos negativos na saúde das pessoas e que toda promoção e proteção desses direitos trazem respostas positivas para a saúde, sendo fundamentalmente conectadas ao bem-estar. Assim, as políticas, programas, ações e práticas de saúde devem estar em sintonia com as normas éticas dos direitos humanos (Gruskin & Tarantola, 2012).

Para refletir...

Adotar a perspectiva ética dos direitos humanos implica em reconhecer a saúde como um bem público universal, com dimensões individuais e coletivas intrinsecamente conectadas, cujos benefícios devem ser compartilhados por todos os membros de uma dada comunidade como um aspecto da dignidade humana. Implica em garantir direitos específicos, como desfrutar do progresso científico (ter acesso ao tratamento mais efetivo e seguro), ter direito de decidir sobre sua vida e saúde, com base em informações precisas e compreensíveis sobre as intervenções e ter direito à integridade corporal e ao acesso universal a serviços de saúde (Diniz, 2012).

A igualdade, enquanto valor ético-jurídico fundante dos direitos humanos, da organização política democrática e da concepção de cidadania, traz o substrato essencial para as discussões éticas relacionadas à produção e reprodução do estigma e da discriminação.

O principal desafio é justamente a construção dessa igualdade nos diferentes contextos social, político e cultural. Como aponta Hannah Arendt, não nascemos iguais; tornamo-nos iguais, enquanto membros de uma coletividade, em virtude da decisão conjunta que garante a todos direitos iguais.

A cidadania como o direito a ter direitos pode ser a chave para a compreensão da problemática para a “inclusão dos indivíduos em um sistema de valores comuns que lhes garanta, apesar de toda diferença entre eles, a igualdade básica de todos diante da lei, e, assim, um nível mínimo de consenso e legitimidade” (Dias, 2016).

Quando tratamos da aplicação da igualdade recorremos à equidade como critério ético para sua aplicação, visando alcançar uma igualdade material, efetiva nas relações sociais permeadas de diferenças e diversidade entre os indivíduos.

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“Temos o direito a ser iguais quando a nossa diferença nos inferioriza; e temos o direito a ser diferentes quando a nossa igualdade nos descaracteriza. Daí a necessidade de uma igualdade que reconheça as diferenças e de uma diferença que não produza, alimente ou reproduza as desigualdades”.

SANTOS (2003)

A equidade em saúde está relacionada às condições de saúde, ao consumo de serviços de saúde, à política e ao modelo de gestão. Há consenso de que este conceito deva orientar as políticas de saúde, visando sempre reduzir desigualdades e iniquidades.

Nesse sentido, a equidade pode ser entendida como o produto de uma intervenção sobre situações de conflito, funcionando como um instrumento de justiça – que deve estabelecer a possibilidade de todos terem acesso a bens e direitos considerados essenciais – e de igualdade formal como critério de distribuição, e, portanto, de resolução de conflitos nesse campo (Escorel, 2001).

Para refletir...

Segundo a Organização Pan-Americana de Saúde, a equidade em saúde implica em cada um receber atenção em saúde, segundo suas necessidades. Neste sentido, a definição de equidade em saúde depende do conceito de saúde e do conceito de necessidades de saúde (Escorel, 2001).

As iniquidades em saúde são expressões visíveis da violação à igualdade e constitui um dos principais desafios ético e social, que exige condutas voltadas à eliminação e prevenção das diferenças desnecessárias e evitáveis e da reprodução e produção de estigma e discriminação.

A discriminação, como tratamento injusto, expresso em condutas de exclusão, segregação e subtração de direitos, viola o dever ético-jurídico de compatibilizar a igualdade, enquanto valor universal, à diversidade, como aspectos da própria dignidade humana. Assim, o princípio da não discriminação afirma que, na perspectiva dos direitos humanos, há o dever ético e o direito moral de não discriminação das pessoas por sexo ou gênero, orientação ou condição sexual, cor, etnia ou origem, deficiência, condição econômica ou qualquer outra.

A caracterização estratégica da saúde na seara dos direitos humanos oferece argumentos fortes para a responsabilidade governamental e, nesse sentido, transformar as condições que produzem e reproduzem privações e discriminações.