Módulo 1 | Aula 3 Implicações éticas em saúde
Abordagens éticas aplicadas à saúde
Quando modelos e normas éticas são estabelecidos é esperado que:
- os valores compartilhados por diferentes grupos e pessoas sejam respeitados.
- os conflitos éticos decorrentes do pluralismo moral nas sociedades contemporâneas sejam manejados, de forma razoável e prudente.
O princípio da não discriminação é central na orientação das condutas e no manejo dos conflitos.
A essência da resolução de um conflito é identificá-lo e ponderar crenças e valores implicados em determinado caso, para chegar a uma conclusão equilibrada, satisfatória e considerada justa para todos os envolvidos (Nora et al., 2015).
De acordo Cook et al. (2004) as reflexões éticas têm diferentes níveis de análise que se articulam de forma intensa, conformando e desafiando o potencial da ação humana na transformação da realidade, no processo de cuidado e na atenção à saúde da população na prática. Veja:
Há diferentes teorias e correntes éticas que oferecem uma estrutura conceitual e metodológica para analisar a aceitabilidade das ações, avaliar os juízos e o caráter ético das condutas e propor diferentes soluções para os conflitos. Vamos destacar três correntes éticas, que baseiam diferentes teorias e análises bioéticas:
Consequencialistas
Consideram que “as ações são certas ou erradas de acordo com a ponderação de suas consequências boas e más. O ato correto em cada circunstância é aquele que produz o melhor resultado global conforme determinado por uma perspectiva impessoal que confere pesos iguais aos interesses de cada uma das partes afetadas” (Beauchamp & Childress, 2002).
A principal teoria desta abordagem é a utilitarista que considera que a melhor conduta é a que produz o máximo de bem-estar. Em outras palavras, para a teoria utilitarista “a consequência mais importante é o aumento ou diminuição da quantidade de bem-estar de todos os afetados pela ação (Beauchamp & Childress, 2002).
Deontológica
Corrente baseada nos deveres, considera que o ato correto é aquele cuja moralidade se funda na racionalidade e não na experiência, emoção, costumes, tradições ou nas consequências dos atos humanos. Não importa o quanto as consequências sejam boas, algumas escolhas são proibidas, contrárias às normas morais.
O pressuposto é que os seres humanos são racionais e devem manifestar decisões e produzir regras universais que descrevam como as coisas devem ser e não como as coisas são. O teste da moralidade é realizado por meio da aplicação de um imperativo categórico proposto por Kant de agir somente de acordo com a máxima que possa ao mesmo tempo querer que se transforme em lei universal. Tal equação exige conformar todas as condutas particulares humanas às normas e regras morais universais extraídas deste raciocínio. Outra máxima kantiana levada em conta é a de que se deve agir de maneira que se trate a humanidade sempre como um fim e não somente como um mero meio (Beauchamp & Childress, 2002). Nesse sentido, a vida humana tem um valor em si que não comporta cálculos ou seu uso como meio para o alcance de uma finalidade. Qualquer violação implica em violar a própria humanidade.
Moralidade comum
Extrai suas premissas básicas da moralidade partilhada pelos membros de uma sociedade e adota diferentes normas e princípios de outras correntes (Beauchamp & Childress, 2002). A teoria biomédica ou principialista, criada nos anos 1970, é um exemplo deste grupo que busca responder a complexidade dos conflitos éticos contemporâneos, orientando-se por quatro princípios universalmente aceitos e considerados fundamentais na saúde, são eles: o respeito à autonomia, beneficência, não maleficência e justiça. Ela é amplamente conhecida e difundida na formação dos profissionais de saúde, nas leis, regulamentações e códigos éticos na saúde.
Desses princípios centrais podem ser derivadas regras específicas que validam como correta e justa determinada conduta, elas fazem parte da Teoria Principialista, que é amplamente incorporada nos códigos de ética profissionais, veja os quatro princípios desta teoria:
- Garantir a privacidade do usuário na assistência à saúde e obter sempre seu consentimento.
- Socorrer pessoas que estão em perigo e proteger aquelas inaptas a decidir e/ou vulneráveis.
- Não produzir dano ou causar prejuízo intencional a alguém.
- Garantir igual tratamento para necessidades iguais de saúde no acesso e na utilização de serviços.
O ponto de partida para análise ética baseada nessa teoria é considerar os princípios morais identificado como prima facie. Significa dizer que há uma obrigação moral de considerar a aplicação de cada um deles diante do caso concreto, devendo-se verificar na situação específica se há conflito entre um ou mais princípios. Verificando-se o conflito entre eles, deve-se atribuir prioridade àquele que levará a uma conduta eticamente mais adequada, demonstrando por argumentos válidos a infração de um deles ou a aplicação restrita, com justificativas para a decisão adotada (Beauchamp & Childress, 2002).
No cuidado da saúde, a análise adequada de um problema ético é essencial para todos os envolvidos. Veja o passo a passo da análise no infográfico:
Compreender e descrever com precisão a questão e os possíveis conflitos.
Realizar uma abordagem dedutiva e indutiva do raciocínio, considerando os meios, fins e os interesses de cada um dos envolvidos, bem como os efeitos de cada alternativa e sua aplicabilidade.
Conversar sobre qual conduta deve ser adotada. A decisão deve sempre ser aceitável pelos envolvidos, coerente, razoável e não conter contradições.
Fonte: Rego et al., 2009; Beauchamp & Childress, 2002.