Módulo 2 | Aula 2 Pessoas acometidas pela hanseníase e seus familiares e pessoas acometidas pelas micoses endêmicas

Tópico 2

Micoses endêmicas

Conhecendo as micoses endêmicas
Atenção

Relembrando:

As doenças endêmicas são aquelas que se encontram presentes em nosso cotidiano e acontecem com determinada frequência, permanecendo estáveis ao longo do tempo.

A grande maioria dos agentes causadores das micoses é encontrada no solo, vegetação e material em decomposição, em áreas tropicais e subtropicais e em ambientes úmidos. Por isso, a infecção ocorre mais comumente nas populações de áreas rurais ou envolvidas em atividades agropecuárias, ecoturismo, caça, e em grupos com baixas condições socioeconômicas.

Existem vários tipos de micoses que segundo o Ministério da Saúde, podem ser divididas em: superficiais, cutâneas, subcutâneas, sistêmicas e oportunistas.

Fotografia de pele com lesões de micose – pitiríase versicolor, conhecida também pelo nome pano branco. A lesão tem cor esbranquiçada, em formato irregular e bordas avermelhadas.
Pitiríase Versicolor - (Pano Branco)
Fonte: SBD

As micoses superficiais são as causadas por fungos que invadem apenas as camadas mais superficiais da pele ou pelo como, por exemplo, a pitiríase, que são manchas que surgem na pele e podem ser esbranquiçadas (pano branco) ou rosadas.

Micoses cutâneas são aquelas causadas pelos fungos na pele ou nos folículos dos pelos e na parte da unha que possui queratina. As mais comuns desta categoria são:

Fotografia com enfoque em uma boca infantil, com língua à mostra e lesões de candidíase em sua superfície. A língua tem uma cor esbranquiçada, com pequenos pontos avermelhados, e uma região mais amarelada ao centro.
Candidíase – sapinho
Fonte: Enfermagem Novidade

Na forma oral é popularmente chamada de “sapinho”. É comum nos bebês, especialmente na região das fraldas e, em adultos acomete mais as áreas de dobras, como a virilha, e está associada ao calor e umidade.

Fotografia de pele da sola do pé com lesão em região dos dedos. É uma lesão decorrente de micose, conhecida também pelo nome de pé de atleta.
Pé de atleta
Fonte: Médico Responde

É uma micose presente na extensão do corpo, geralmente na face e no couro cabeludo. É mais comum em crianças e apresenta manchas pelo corpo ou a descamação do couro cabeludo; pode até mesmo ocorrer a alopecia (queda dos pelos). O tipo mais comum é o pé de atleta ou a popular frieira, causada por não se enxugar os pés devidamente e por usar repetidas vezes o mesmo par de calçado, geralmente fechado e sem ventilação.

O uso de meias sintéticas pode favorecer o surgimento das frieiras entre os dedos e atingir as unhas. O calor, o suor e a falta de luminosidade podem influenciar na duração das micoses nos pés, que devem ser sempre lavados com sabão de coco, preferencialmente, água fria e enxugados com atenção. Este tipo de micose pode causar mau cheiro e coceiras na região atingida e provocar bastante incômodo.

Micoses subcutâneas atingem o corpo humano quando há um traumatismo (corte causado por planta, pela manipulação do solo, arranhadura de animal infectado) e se forma uma lesão da pele ou do tecido subcutâneo, que é a camada do tecido base da pele e o fungo se dissemina na região. Os mais conhecidos são a esporotricose, a cromoblastomicose e os micetomas. Hoje a esporotricose transmitida por arranhadura de gato constitui importante problema de saúde pública, pois o país vive uma verdadeira epidemia que já ultrapassou as fronteiras entre países.

Montagem com 3 imagens: Fotografia A – fotografia de região de antebraços e mãos de uma pessoa branca com lesões avermelhadas no dorso da mão direita e antebraço esquerdo. Fotografia B – fotografia de um gato de olhos verdes e pelos brancos e pretos com lesões avermelhadas na região da cabeça, entre as orelhas. Fotografia C – fotografia de região de tornozelo e pé de uma pessoa branca com lesão bolhosa e avermelhada ocupando parte do arco plantar, na região medial do pé.
(A) Esporotricose em humanos; (B) Esporotricose em animais – gato; (C) Micetomas
Fonte: (A) IFSC/USP; (B) Portal Correio; (C) Wikipédia
Fotografia da face de uma pessoa parda, com lesões esparsas em toda a região do rosto: nariz, queixo e bochechas. As lesões são acneiformes e pápulas eritematosas – avermelhadas.
Paracoccidioidomicose e transplante hepático. Lesões acneiformes e pápulas eritematosas, algumas com centro exulcerado, disseminadas na face.
Fonte: ABD

Micoses sistêmicas são aquelas causadas por fungos invasivos, cuja porta de entrada pode ser as vias respiratórias; esses fungos podem se expandir para todo o organismo. Vale ressaltar que a criptococose -- conhecida como a doença do pombo, ou mesmo a Histoplasmose, conhecida como a doença do morcego -- são, em conjunto com a paracoccidioidomicose, as micoses endêmicas sistêmicas mais prevalentes em nosso meio.

Saiba mais...

Micoses oportunistas são causadas por fungos oportunistas que, na maioria das vezes, acarretam infecções invasivas, gravíssimas. E raros os que vivem saprofíticamente. Há fatores diferenciados que podem causar essas micoses, como: transplantes, ambiente hospitalar contaminado, síndrome da imunodeficiência adquirida (HIV), neoplasias, doenças que alteram a imunidade celular, gravidez ou prematuridade. Os sintomas vão depender do tipo de micose e do estado imunitário do sujeito, podendo ser umas simples lesões na pele ou quadros mais graves, capazes de comprometer todo o organismo e evoluir para óbito. Candidíase invasiva, criptococose e aspergilose são as mais comuns. A candidíase do tipo invasiva, que se manifesta com infecções na corrente sanguínea ou de tecidos profundos, assim como a mucormicose, são consideradas graves. A mucormicose é rara, comprometendo a mucosa nasal, os seios para-nasais e a faringe, causando sequelas como a desfiguração da face do sujeito, levando-o a uma situação de muito sofrimento e discriminação. A maioria dos casos de mucormicose com comprometimento de sistema nervoso central evolui para óbito.

Como evitar e tratar

Dentre as enfermidades apresentadas, podemos dizer que o Paracoco (Paracoccidioidomicose – PCM) é uma das micoses que mais preocupa as autoridades sanitárias por fazer parte das 10 principais causas de mortes no Brasil por doenças infecciosas e parasitárias -- tais como, Doença de Chagas, leishmaniose, malária ou tuberculose -- e que são normalmente associadas à pobreza e condições de vida desfavoráveis.

O método de controle possível para a PCM é evitar inalar a poeira que surge com o trabalho de revolver o solo. Nesse sentido, o trabalho de agricultura familiar e o trabalho de campo do arqueólogo igualmente pode apresentar perigo para o profissional, em função do contato com a poeira das escavações. O que pode ser evitado com o uso adequado de EPIs, como máscaras faciais.

Esta micose tem notificação compulsória em alguns estados do Brasil, tais como Paraná e Mato Grosso, mas não pelo Ministério da Saúde. A notificação obrigatória dos casos é muito importante para as autoridades sanitárias elaborarem políticas de saúde que possam controlar e cuidar dos atingidos e evitar sua propagação quando possível.

O melhor tratamento para essas doenças é aquele realizado com remédios antifúngicos, mas podem durar meses, sobretudo os das micoses cutâneas (unhas, especialmente). A duração prolongada dessas terapias medicamentosas pode levar ao abandono de tratamento devido à demora nos resultados. O problema da falta de adesão é a progressão da doença. A indução da resistência pode acontecer quando há interrupções no tratamento e reintrodução do antifúngico. Este problema também é encontrado no tratamento da hanseníase, uma vez que muitos interrompem o tratamento prematuramente; ao retomá-lo, o organismo pode encontrar resistência medicamentosa.

Para assistir...

Confira: O ataque silencioso dos fungos.

Sinopse: Considerados inofensivos até alguns anos atrás, os fungos estão se mostrando mais resistentes aos medicamentos usados para combatê-los. O infectologista Arnaldo Colombo, da Unifesp, fala sobre a importância de reconhecer com rapidez as infecções fúngicas, muitas vezes confundidas com as infecções causadas por bactérias.

Fonte: Youtube

Estigma e Discriminação

A grande maioria das micoses endêmicas, citadas nesta aula, produz sequelas funcionais e estéticas em diferentes etapas da infecção ou em função da ausência de tratamento. Os sinais que atingem os sujeitos são de diferentes formas. Com a pitiríase e tíneas, há manchas esbranquiçadas que respondem muito bem ao tratamento e que por isso mesmo não podem ser qualificadas como sequelas; até mesmo os nódulos causados sendo de origem inflamatória, também podem regredir com o tratamento, não gerando situações de discriminação com os indivíduos. Pano Branco também gera manchas esbranquiçadas sobre a pele; já a Esporotricose deixa manchas avermelhadas e às vezes deformações quando atingem camadas mais profundas, às vezes necessitando amputações.

As sequelas que podem gerar discriminação e sofrimento são as que se apresentam na superfície corporal e que resultam, na maioria das vezes, em diferentes lesões cicatriciais que podem desfigurar o indivíduo, com nódulos em diferentes partes do corpo (queixo, pescoço, axila, virilha). Já os micetomas podem ocasionar amputações de membros, levando o sujeito a uma sequela incapacitante. O Paracoco pode causar lesões nos lábios e face, acarretando sérios problemas na autoestima e igualmente discriminação e sofrimento.

Atenção

Segundo a SBMT, a Micetoma é uma doença com perfil de estigma social, pois o indivíduo acometido tende a ocultar a doença por longo período e quando procura atendimento médico a enfermidade já está em estágio avançado. As infecções são mais prevalentes em comunidades pobres, principalmente entre agricultores ou pessoas que não usam sapatos. As restrições financeiras também impedem as pessoas de procurar assistência médica e de saúde. Nas áreas endêmicas remotas de micetomas, as instalações médicas e de saúde são escassas e é difícil para o indivíduo chegar ao centro regional de saúde.

Fotografia da face de um homem pardo, que usa barba e bigode e apresenta sequela com restrição da abertura da boca/ lábios em decorrência de paracoccidioidomicose.
Micrognostia por Paracoccidioidomicose (sequela).
Fonte: Cedida pelo Dr. Silvio Marques. F.M. Botucatu- UNESP

Embora não tenham sido identificados estudos específicos sobre o estigma vinculado às micoses endêmicas, grande parte das marcas corporais provocadas por esses agravos são visíveis pelo fato de provocarem manchas e feridas em diferentes partes do corpo. Tais marcas podem gerar situações de discriminação, como repulsa, medo e preocupação por parte das demais pessoas, provocando distanciamento social.

Cromoblastomicose

Fotografia de região de antebraços de uma pessoa branca com lesões e nódulos arroxeados e avermelhados em toda a extensão do membro.
Cromoblastomicose
Fonte: J Clin Microbiol. 2015 Aug;53(8):2674-85

A cromoblastomicose é uma infecção da pele causada por diversos fungos, que afeta pessoas com imunidade normal e se caracteriza pela formação de nódulos (papilomas ou verrugas) que tendem a se tornar feridas. Na região atingida pelo fungo, a pele torna-se castanho escuro ou preto, mas inicia-se com tom vermelho-violáceo, com pouca sensibilidade e de base endurecida; ela pode começar no pé ou membros inferiores, mas também surgir em outras partes do corpo, sobretudo onde há lesão.

Lobomicose

Fotografia de região de mão de uma pessoa negra com lesões, verrugas e e nódulos arroxeados e avermelhados em toda a extensão do dorso do membro e dedos.
Lobomicose
Fonte: An. Bras. Dermatol. 82 (5) • Out. 2007

A lobomicose, também chamada de doença de Jorge Lobo, é rara no mundo e pode ser encontrada em florestas e selvas, com clima quente e úmido, de elevada pluviosidade, como é a região amazônica. Atinge trabalhadores braçais, sobretudo seringueiros, agricultores e garimpeiros; no contato com a pele, o fungo é inoculado e entra em um lento processo de proliferação. A doença traz lesões deformantes na pele e o tratamento cirúrgico pode minimizar bastante o trauma que a aparência física do atingido apresenta e que causa repulsa, gera desconforto, estigmatização e afastamento social.

Paracoccidioidomicose

Duas fotografias: em uma delas, a face em perfil de um homem branco com lesões e pápulas avermelhadas disseminadas pela região da testa, bochechas e maxilar; na outra foto, a face de um homem negro com lesões em verrugas e pústulas arroxeadas disseminadas por todo o rosto: testa, bochechas e nariz.
Paracoccidioidomicose disseminada em PVHA
Fonte: Cedida Prof. Silvio Marques. F.M.Botucatu- UNESP

A doença é causada por um fungo que se encontra normalmente no solo e é muito prevalente na região Centro-Oeste. Ao ser inalado pode causar as duas formas mais comuns da Paracoccidioidomicose, que são a pulmonar e a cutânea, atingindo pulmões, pele, boca e garganta. Tem alta incidência na América do Sul e por isso é chamada de Blastomicose Sul-americana; se apresenta na forma granulomatosa, pode acometer diversos órgãos, mas sobretudo as vias aéreas inferiores. Causa tosse, febre, falta de ar e dificuldade para respirar, mas também ulcerações, inchaço dos linfonodos e, às vezes, dor abdominal; normalmente afeta pessoas com sistema imunológico saudável, mas também nas que estão com sistema imunológico debilitado por outras doenças, e é bastante agressiva.

O receio de ser discriminado pode levar à demora em procurar orientação médica e ao desejo de ocultar as evidências da doença por meio do uso de roupas capazes de cobrir as marcas na pele. Neste sentido, é preciso que os profissionais responsáveis pelo cuidado em saúde, em particular os clínicos gerais e especialistas, estejam sensíveis e atentos a esses casos, visando reduzir os seus danos. Além disso, é preciso promover campanhas educativas regulares sobre o tema, incluindo cartazes que estimulem a busca pelo tratamento e a solução do problema.

Para refletir...
  • Em situações cotidianas você já se deparou com a hanseníase ou com alguma micose endêmica? Se sim, como reagiu?
  • Já parou para pensar que o sapinho, o pé de atleta e a ‘bicheira’ do gato podem fazer parte do nosso cotidiano sem que a gente perceba?
  • De que forma esta aula contribuiu para ampliar o seu conhecimento ou desfazer mitos e ideias errôneas sobre esses agravos?