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Assistência
ao parto:

ênfase nas distocias e
principais causas de
morbimortalidade materna

Capa das páginas do curso Campus Virtual

Módulo 5 | Síndromes Hipertensivas na gestação

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Aula 5
Emergências hipertensivas

Crise hipertensiva

Crise hipertensiva é o reconhecimento do estado hipertensivo de 160 X 110 mmHg ou mais que persiste por pelo menos 15 minutos. É importante estar atento e agir com bom senso, pois o tratamento deve ocorrer, idealmente, em 30 a 60 minutos e as decisões não devem ser adiadas.

É importante que se realize aferição da pressão arterial (PA) seguindo a técnica correta, lembrando que uma das medidas terapêuticas é lateralizar a paciente. Isso servirá para a redução da PA como amplamente demonstrado na literatura. No entanto, essa posição não deve ser preferida para fazer diagnóstico de estado hipertensivo.

A diferenciação entre emergência e urgência hipertensiva utiliza a expressão clínica “de gravidade”. Entenda as diferenças a seguir.

Emergência hipertensiva
É caracterizada por hipertensão em nível de gravidade (PAD ≥ 110 mmHg) e/ou presença de sintomatologia e lesões em órgãos-alvo. O plano de ação, em casos de emergência, inclui hipotensores de ação rápida.

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Urgência hipertensiva
Admite-se o controle inicial com hipotensores de uso oral, sem expectativa de redução da PA em curto prazo. Entretanto, o uso de medicamentos por via oral precisa ser amplamente avaliado quando a opção não for a Nifedipina.

É fundamental a avaliação judiciosa dessas duas condições, pois o limite entre elas é impreciso e o quadro clínico possui caráter progressivo, exigindo anamnese atenciosa e exame físico acurado. É importante enfatizar que, em Obstetrícia, valores pressóricos elevados aumentam substancialmente os riscos de descolamento prematuro de placenta (DPP), situação que não ocorre no cenário da Clínica Médica. Em suma, a ausência de queixas que representem danos em órgãos-alvo não reduz a necessidade de redução em curto prazo da PA.

Incialmente, alertamos para alguns pontos:

  • É imprescindível adotar a técnica adequada para aferir a PA.
  • Se o diagnóstico ocorrer em unidade básica de saúde/consultório, deve-se encaminhar a paciente rapidamente para o hospital, e essa transferência deve ser realizada de modo responsável e seguro.
  • Valorize as queixas clínicas para dimensionar o problema, não se atenha apenas ao valor da PA.
  • O controle dos efeitos das drogas deve ser realizado, mas não exige outros monitoramentos especiais, tais como o cardíaco.

É importante reconhecermos o contexto clínico da emergência hipertensiva. Ações específicas deverão ser implementadas em casos de pré-eclâmpsia e de hipertensão crônica.

> Critérios de gravidade na pré-eclâmpsia e crise hipertensiva

Os critérios (isolados ou associados) de pré-eclâmpsia com sinais de gravidade são aqui rapidamente apresentados, no intuito de reforçar o seu reconhecimento e a possibilidade de associação com síndrome HELLP. É fundamental não tratar a pré-eclâmpsia que apresenta sinais de gravidade com o objetivo apenas de reduzir a PA, ou seja, “como hipertensão crônica”.

  • PAS ≥ 160 mmHg.
  • PAD ≥ 110 mmHg.
  • Cefaleia / distúrbios visuais.
  • Edema pulmonar.
  • Epigastralgia/dor hipocôndrio direito.
  • Diurese < 500 mL/24h.
  • Proteinúria > 2g/24h (isolada não indica parto).
  • Plaquetas < 100.000/mm³.
  • TGO > 70 U/L (alteração de enzimas hepáticas).
  • Creatinina > 1,1 mg/dl (ausente nefropatia prévia).
  • Convulsão / Coma.

A literatura documenta amplamente a existência de repercussões em órgãos-alvo nas situações em que a PA sistólica está maior ou igual a 160 mmHg na gestação, o que pode se associar a acidente vascular encefálico hemorrágico, assim como dissecção aórtica.

O risco de acidente vascular encefálico (AVE) é sete vezes maior quando a crise hipertensiva é motivada por pré-eclâmpsia, pois essa condição interrompe a autorregulação cerebral, ocasionando disfunção endotelial progressiva.

Outros desfechos associados a crise hipertensiva são DPP, insuficiência renal e parto prematuro, frequentemente mais comuns com valores de PA ≥ 160 x 110 mmHg.

Crise hipertensiva e DPP estão bastante interligados. Na associação entre DPP e crise hipertensiva aparentemente coexistem os mesmos mecanismos de dano endotelial que ocorrem em vários órgãos, levando a prejuízo de autorregulação, assim como ocorrência de hemólise e de ativação plaquetária. É importante que, durante a assistência, principalmente diante de hipertensão arterial crônica de difícil controle, se atente para a presença de hipertensão de etiologia secundária (síndrome da apneia e hipopneia obstrutiva do sono, doença renal parenquimatosa, doença renovascular, hiperaldosteronismo primário, coarctação da aorta, síndrome de Cushing, feocromocitoma, hipotireoidismo, hipertireoidismo, hiperparatireoidismo, acromegalia), para que o plano de ação seja estabelecido diante desse contexto.

Mãe e filha
Fonte: Freepik (2025)

Embora os protocolos comumente utilizem a PA diastólica como marcador de gravidade, é muito importante lembrar da importância da PA sistólica quando esta alcança valores iguais ou superiores a 160 mmHg. Alguns estudos demonstram que mulheres que alcançam esses valores, mesmo que seja uma PA sistólica isolada, apresentam risco substancial de evoluir com AVE.

Também é importante atentar que situações de elevação da PA podem ocorrer durante o trabalho de parto e no puerpério, inclusive com expressões clínicas graves.

O descontrole pressórico no pós-parto pode surgir e evoluir com descompensação clínica ainda na primeira semana, frequentemente entre o terceiro e sexto dia de puerpério. Tal contexto reforça a necessidade de monitoramento clínico contínuo do pós-parto diante de hipertensão.

> Tratamento da crise hipertensiva e da eclâmpsia

A meta terapêutica na crise hipertensiva é prevenir AVE e DPP. Para essa finalidade, as medidas terapêuticas devem ser iniciadas desde o reconhecimento da PA ≥ 160 X 110 mmHg.

Mulher sendo tratada
Fonte: Campus virtual Fiocruz, por meio da ferramenta Chatgpt (2025).

Embora o sulfato de magnésio não seja um agente hipotensor preferencial, ele possui alguma ação hemodinâmica que pode otimizar o tratamento. O rubor e a sensação de mal-estar que ocorrem com frequência em algumas mulheres traduzem a vasodilatação transitória após sua infusão.

Alguns estudos demonstraram elevação da frequência cardíaca materna e redução das PA sistólica, diastólica e média após a administração de sulfato de magnésio.

O sulfato de magnésio pode ser considerado um agente adjuvante no plano terapêutico da crise hipertensiva.

O sulfato de magnésio apresenta diversas vantagens documentadas, com destaque para:

  • Redução da pressão intracerebral.
  • Manutenção do fluxo sanguíneo cerebral.
  • Prevenção de encefalopatia hipertensiva e de barotrauma.

Comparado ao Diazepam e à Fenitoína, o sulfato de magnésio é mais eficaz na prevenção de convulsões. Sendo melhor do que a Fenitoína como agente anticonvulsivante, o sulfato de magnésio reduz a necessidade de ventilação mecânica, complicações com pneumonia e necessidade de terapia intensiva. Portanto, o sulfato de magnésio é o medicamento de escolha para prevenção e tratamento de eclâmpsia e sua prescrição deve seguir um dos esquemas adiante.

Esquema do MgSO₄ Dose inicial Dose de manutenção
Zuspan (IV exclusivo) a 4g – IV (bolus) administrado lentamente b 1g por hora - IV em bomba de infusão continua (BIC) (diluição em SF 0,9%)
Pritchard (IV/IM) a 4g – IV (bolus) administrado lentamente
+ 10g – IM profunda (5g em cada nádega)
c 5g a cada 4 horas – IM (aplicação IM profunda)
a- Preparação da dose inicial (IV) nos dois esquemas: MgSO4 a 50% (1 ampola contém 10 mL com 5 g de MgSO4). Diluir 8 mL de MgSO4 a 50% (4 g) em 12 mL de água destilada ou soro fisiológico. A concentração final terá 4 g/20 mL. Infundir a solução IV lentamente (15 a 20 minutos). Outra possibilidade seria diluir 8 mL em 92 mL de soro fisiológico a 0,9%. Infundir em BIC a 300 mL/h. Assim, o volume total será infundido em torno de 20 minutos.
b- Preparação da dose de manutenção no esquema de Zuspan: Diluir 1 ampola de MgSO4 a 50% (10 mL) em 490 mL de soro fisiológico a 0,9%. A concentração final terá 1 g/100 mL. Infundir a solução IV na velocidade de 100 mL/h. *Alguns serviços preconizam a dose de manutenção de 2g/h IV em BIC.
c- Preparação da dose de manutenção no esquema de Pritchard: Utilizar 10 mL da ampola de MgSO4 a 50% (solução com 5g de MgSO4). Outras apresentações não devem ser utilizadas para esse esquema pelo volume excessivo delas.

* Uma estratégia que poderá ser adotada para reduzirem-se os riscos de necrose muscular na administração IM na dose inicial no esquema de Pritchard (10g de MgSO4 a 50% - 20 ml) é a realização em 4 grupamentos musculares distintos, sendo 2,5 g em cada (equivalente em volume a 5 ml em cada músculo).

O sulfato de magnésio é uma droga segura, mas exige monitoramento. Por isso, não deve ser confundida a necessidade de monitoramento intensivo com a de internação para tratamento intensivo em unidade de terapia intensiva (UTI), o que favorece sua administração precoce em qualquer unidade inicial de atendimento, mesmo na Unidade Básica de Saúde.

Nesse contexto, é importante verificar se a dose terapêutica está aquém da dose tóxica que se associa a parada cardiorrespiratória.

A dose terapêutica do sulfato de magnésio é considerada a de 4 a 8 mg/dL.

Sequencialmente, quando sua distribuição sérica aumenta, pode haver redução do reflexo patelar. A perda do reflexo patelar habitualmente ocorre com níveis entre 8 e 10 mg/dL. Ressalta-se que, passando por sonolência e outras complicações advindas de sua toxicidade, a parada cardiorrespiratória só vai acontecer diante de infusões capazes de alcançar níveis de magnésio iguais ou superiores a 30 mg/dL. Nesse sentido, se o sulfato de magnésio for administrado continuamente em bomba de infusão e a paciente for monitorizada e avaliada regularmente pelo menos a cada hora, uma eventual complicação por toxicidade pode ser antecipada. Em casos raros de intoxicação, deve-se administrar gluconato de cálcio a 10%, na dose de 01 grama por via intravenosa, em até dois minutos. Ressalta-se que a equipe multiprofissional deve utilizar um checklist específico para esse monitoramento.

Com relação aos hipotensores, a literatura não demonstra superioridade entre os agentes. As principais opções são:

  • Nifedipina.
  • Hidralazina.
  • Labetalol.
  • Nitroprussiato de sódio.

Agente Dose de inicial Repetir, se necessário Dose de máxima

Nifedipino Comprimido
de 10 mg

10 mg – VO

10 mg – VO a cada 20 a 30 min

30 mg

Hidralazina* Ampola de
20 mg/ml.

5 mg – IV

5 mg – IV a cada 20 min

30 mg

Nitroprussiato de sódio**
Ampola 50 mg/2 ml

0,5 a 10 µg/kg/min
Infusão intravenosa contínua

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*A ampola de hidratazina contém 1 mL, na concentração do 20 mg/mL. Diluir uma ampola (1 mL) em 19 mL de água destilada, assim se obtém a concentração de 1 mg/mL. **ampola de nitroprussiato de sódio contém 2 mL, na concentração de 50 mg/2 mL. Diluir uma ampola (2 mL) em 248 mL de soro glicosado a 5%, pois, assim teremos a concentração de 200 µg /mL.

Fonte: KORKES et al., 2025
Dose desejada (µg/kg/min) 0,5 1,0 2,0 3,0 4,0 5,0
Peso da paciente 50kg 7,5 15,0 30,0 60,0 90,0 120,0 Velocidade de infusão (mL/h)
60kg 9,0 18,0 36,0 72,0 108,0 144,0
70kg 10,0 21,0 42,0 84,0 126,0 168,0
80kg 12,0 24,0 48,0 96,0 144,0 192,0
90kg 14,0 27,0 54,0 108,0 162,0 216,0
100kg 15,0 30,0 60,0 120,0 180,0 240,0

*Do ponto de vista prático, recomenda-se iniciar com a dose mínima e aumentar 1 mL/h a cada dez minutos. A dose máxima, quando necessária, não deve ser utilizada por mais de dez minutos, devendo-se reduzi-la, então, pela metade. O nitroprussiato deixa de agir três minutos após a interrupção da infusão. Fonte: KORKES et al., 2025

Fonte: KORKES et al., 2025

A revisão da literatura aponta que o nitroprussiato de sódio não é droga de escolha, pois existem relatos de óbito fetal. Porém, seu uso não deve ser contraindicado, devendo ser considerado droga de segunda linha, pois a prioridade das ações refere-se ao interesse materno.

Tão importante como saber o que usar é compreender como usar. A redução acentuada da PA, excedendo as metas de 15-25% (PAD em 100-110 mmHg), pode culminar em diversas complicações, tais como:

  • AVE.
  • Coma.
  • Infarto agudo do miocárdio.
  • Insuficiência renal aguda.
  • Hipóxia fetal.
  • Morte materna e/ou fetal.

Particularmente na hipertensão arterial crônica esse efeito pode ser nocivo, pois a potencial rigidez dos vasos atrasa a autorregulação do fluxo cerebral, favorecendo a evolução para AVE.

Recomenda-se atuar de forma sistematizada, verbalizando claramente o diagnóstico e acionando apoio da equipe multiprofissional. Se a situação clínica inclui convulsão, a prioridade é o manejo da eclâmpsia, seguindo o roteiro padrão. O plano de ação geral inclui as ações a seguir:

  1. Chamar ajuda e posicionar a gestante em decúbito, preferencialmente lateral esquerdo (decúbito lateral direito também é aceitável).
  2. Instalação de oxigênio, preferencialmente por meio de máscara, com pelo menos 5 a 8 litros por minuto.
  3. A PA deve ser novamente avaliada até 15 minutos após a primeira aferição.
  4. Venóclise com soro glicosado a 5% deve ser instalada.
  5. Punção venosa deve ser realizada para obtenção de amostra sanguínea e investigação de síndrome HELLP e hipertensão arterial crônica secundária.
  6. Infusão de sulfato de magnésio em casos de pré-eclâmpsia com deterioração clínica e, simultaneamente, administrar drogas hipotensoras de primeira linha (hidralazina, nifedipina).
  7. Monitorar a PA a cada cinco minutos.
  8. Avaliar o efeito das drogas hipotensoras pelo menos a cada vinte minutos.
  9. Em caso de insucesso no tratamento com drogas de primeira linha, iniciar as drogas de segunda linha, principalmente representadas pelo nitroprussiato de sódio.
  10. Monitorar a atividade e o tônus uterino, cuidado importante devido a associação com o DPP.
  11. Sempre lembrar-se de que, na idade gestacional com viabilidade fetal, a vitalidade fetal também deve ser avaliada, mas após a compensação materna. Essa avaliação pode ser por meio de aferição de batimentos cardíacos fetais e/ou de cardiotocografia.
  12. Os resultados dos exames solicitados devem ser disponibilizados o mais rápido possível, idealmente não excedendo uma hora.
  13. É imprescindível investigar a coexistência de complicações, tais como insuficiência renal e Síndrome HELLP.
  14. Definida a vitalidade fetal e todo o cenário clínico e laboratorial, individualizam-se as condutas clínica e obstétrica.

Nesse contexto, se uma cesariana estiver indicada, é muito importante que a anestesia seja realizada somente após a compensação da paciente, pois são necessários boa oxigenação, volemia, coagulação, equilíbrio ácido básico e redução da PA, o que pode exigir ventilação. Medidas intempestivas podem complicar. A intubação orotraqueal é potencialmente difícil em gestantes e aumenta a PA. Além disso, os curares utilizados na anestesia geral potencializam a ação do sulfato de magnésio. Portanto, os procedimentos cirúrgicos devem ser realizados mediante compensação clínica da parturiente.

Em gestações prematuras, quando o tratamento bem-sucedido da crise hipertensiva permite a não interrupção imediata da gestação, a corticoterapia antenatal (betametasona, dexametasona) se encontra formalmente indicada, melhorando o prognóstico neonatal.

As complicações no sistema nervoso central são as mais associadas a sequelas. Portanto, também é imprescindível estar alerta a sinais clássicos e não clássicos de AVE. “Fraqueza” muscular facial ou nos braços e déficit facial com ou sem convulsões são sinais não clássicos de AVE.

Sintetizando, enumeram-se as principais mensagens no cenário das emergências hipertensivas:

  1. É necessário identificar se é um caso de pré-eclâmpsia para que o sulfato de magnésio possa ser incluído no roteiro de cuidados.
  2. Devemos sempre lembrar da importância do tratamento da emergência hipertensiva com hipotensores de ação rápida.
  3. Não devemos retardar as ações, para evitar sequelas definitivas e morte.
  4. É importante ter cautela na redução da PA e administrar hipotensores de ação rápida sob monitoramento, no intuito de evitar complicações advindas de sua redução excessiva.
  5. É necessário ter atenção a lesões em órgãos-alvo.

Por fim, o sucesso no atendimento às emergências hipertensivas na gestação está diretamente relacionado com a implementação de protocolos gerenciados nas instituições e qualificação contínua das equipes.

Você concluiu esta aula, continue se empenhando nos seus estudos. Siga para a próxima aula!

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